Considere o seguinte enunciado:
“A curiosidade como inquietação indagadora, como inclinação ao desvelamento de algo, como pergunta,
como procura de esclarecimento, faz parte da vida”.
As expressões destacadas, colocadas entre o sujeito e o verbo, têm como função argumentativa
Leia o texto a seguir para responder à questão.
Não há para mim uma ruptura entre o saber empírico e o saber científico, mas uma superação. Essa superação
se dá na medida em que a curiosidade ingênua, sem deixar de ser curiosidade, se torna crítica. Ao se fazer
crítica, tornando-se então curiosidade epistemológica, metodicamente rigorosa na sua aproximação com o
objeto, promove achados de maior exatidão.
Na verdade, a curiosidade ingênua está associada ao saber do senso comum. É a mesma curiosidade que, se
tornando crítica, passa a ser curiosidade epistemológica. Muda de qualidade, mas não de essência. A
curiosidade de camponeses com quem tenho dialogado ao longo de minha experiência político-pedagógica é a
mesma curiosidade com que cientistas ou filósofos acadêmicos admiram o mundo. Porém, os cientistas e os
filósofos superam a ingenuidade da curiosidade do camponês ao aplicarem rigor metódico à sua curiosidade.
A curiosidade como inquietação indagadora, como inclinação ao desvelamento de algo, como pergunta, como
procura de esclarecimento, faz parte da vida. Não haveria criatividade sem a curiosidade que nos move e que
nos põe pacientemente impacientes diante do mundo que não fizemos, acrescentando a ele algo que fazemos.
Como manifestação da vida, a curiosidade humana vem sendo histórica e socialmente construída e reconstruída,
precisamente porque a passagem da ingenuidade para a criticidade não se dá automaticamente. Uma das
tarefas precípuas da prática educativa-progressista é exatamente o desenvolvimento da curiosidade crítica,
insatisfeita, indócil. Curiosidade com que podemos nos defender dos "irracionalismos" decorrentes do ou
produzidos pelo excesso de "racionalidade" de nosso tempo altamente tecnologizado.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 55. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2017. p. 32-33. (Adaptado).
Gabarito comentado
Gabarito comentado — Interpretação de Texto / Função Argumentativa
Tema central da questão: O ponto chave aqui envolve a identificação do aposto explicativo e sua função argumentativa, bem como o reconhecimento dos papéis de expressões introduzidas por “como” no contexto sintático e semântico do trecho analisado. Trata-se de um exercício típico de interpretação de texto aliado à análise da função sintática e semântica de segmentos inseridos no sujeito da oração.
Justificativa da alternativa correta (A): As expressões destacadas — “como inquietação indagadora, como inclinação ao desvelamento de algo, como pergunta, como procura de esclarecimento” — funcionam como uma enumeração de traços que definem o termo “curiosidade” no contexto. São, conforme a norma-padrão, apostos explicativos. De acordo com Cunha & Cintra, o aposto esclarece, especifica ou detalha o termo ao qual se liga. Ao enumerar diferentes manifestações da curiosidade, o autor atribui à palavra curiosidade um significado amplo, apresentando suas múltiplas facetas e esclarecendo sua natureza.
Logo, a alternativa A está correta ao afirmar que as expressões apresentam “uma série de traços definidores” do termo curiosidade.
Análise das alternativas incorretas:
B) Incorreta. As expressões destacadas não apresentam metáforas nem fazem referência à palavra “vida”. Elas explicam apenas o termo “curiosidade”.
C) Incorreta. O trecho não apresenta qualquer intenção de ironia. A caracterização é literal e explicativa.
D) Incorreta. Não existe oposição em relação ao sujeito. Ao contrário, existe detalhamento e ampliação do conceito de “curiosidade”.
E) Incorreta. Não há estrutura comparativa entre “inquietação” e “pergunta”; todas são exemplos que elucidam o que é a curiosidade.
Estratégia para provas futuras: Sempre que encontrar enumeração de características entre vírgulas — especialmente iniciadas por “como” —, avalie se desempenham função explicativa, típica de apostos. Observe, ainda, se há sentido literal ou figurado, evitando interpretações precipitadas.
Referência normativa: Cunha, Celso & Cintra, Lindley. Nova Gramática do Português Contemporâneo: aposto explicativo é termo que esclarece o substantivo, sem modificar seu sentido essencial.
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