Questão d3f7d9eb-3f
Prova:UEL 2018
Disciplina:Filosofia
Assunto:Teorias do Sujeito na Filosofia Moderna, O Sujeito Moderno

Leia o texto a seguir.


E se escrevo em francês, que é a língua de meu país, e não em latim, que é a de meus preceptores, é porque espero que aqueles que se servem apenas de sua razão natural inteiramente pura julgarão melhor minhas opiniões do que aqueles que não acreditam senão nos livros dos antigos. E quanto aos que unem o bom senso ao estudo, os únicos que desejo para meus juízes, não serão de modo algum, tenho certeza, tão parciais a favor do latim que recusem ouvir minhas razões, porque as explico em língua vulgar.

DESCARTES, R. Discurso do Método. Trad. J. Guinsburg e Bento Prado Jr. São Paulo: Abril Cultural, 1973. Coleção “Os pensadores”. p. 79.


Com base nos conhecimentos sobre Descartes e o surgimento da filosofia moderna, assinale a alternativa correta.

A
A língua vulgar, o francês, expressa de modo mais adequado o espírito da modernidade por estar livre dos preconceitos da língua dos doutos, o latim.
B
Redigir o Discurso do Método em francês teve propósito similar à tradução da bíblia para o alemão feita por Lutero: facilitar o acesso à sacralidade do texto em língua vulgar.
C
O desencantamento do mundo, resultante da radical crítica cartesiana à tradição, teve como consequência o abandono da referência à divindade.
D
As ideias expressas por Descartes em seu Discurso do Método refletem a postura tipicamente moderna de ruptura total com o passado.
E
A razão natural inteiramente pura é um atributo inerente à natureza humana, independentemente da tradição ou da cultura à qual o humano se vincula.

Gabarito comentado

M
Manuela Cardoso Monitor do Qconcursos

Alternativa correta: E

Tema central: A questão trata do sujeito moderno em Descartes — a aposta na razão natural como fundamento do conhecimento e da autoridade intelectual, e da escolha do vernáculo (francês) para comunicar ideias.

Resumo teórico (síntese didática): Em Descartes o sujeito moderno é o sujeito pensante — o “cogito” — que fundamenta o saber pela razão e pelo método (dúvida metódica). Ao escrever em língua vulgar, Descartes quer alcançar leitores que julguem pelas suas próprias faculdades racionais, não pela autoridade dos antigos ou do latim acadêmico. Importante: Descartes não renega Deus; pelo contrário, a existência divina garante a verdade das ideias claras e distintas (Discurso do Método; Meditações).

Justificação da alternativa E: Ao afirmar que “a razão natural inteiramente pura” é atributo inerente à natureza humana, a alternativa capta a intenção cartesiana: Descartes confia numa faculdade racional comum a todos os homens, passível de uso independente da aceitação acrítica da tradição ou dos livros antigos. Ele dirige-se aos que usam “somente a sua razão natural inteiramente pura” — isto é, à capacidade racional que todos possuem. Assim, E expressa corretamente a ênfase cartesiana na universalidade da razão como base do julgamento.

Análise das alternativas incorretas:

A — Imprópria: a escolha do francês teve finalidade pragmática (alcance e persuasão) e não uma afirmação teórica de que o vernáculo “expressa melhor o espírito da modernidade”. Modernidade não se reduz à língua.

B — Incorreta: comparar Descartes a Lutero é enganoso. Lutero democratizou um texto sacro; Descartes usa o vernáculo para tornar acessível um método filosófico. Além disso, Descartes não pretende tal sacralização nem promove uma reforma religiosa equivalente.

C — Errada: a crítica cartesiana à tradição intelectual não conduz ao abandono de Deus. Pelo contrário, para Descartes a prova da existência divina é central para garantir a verdade e evitar o ceticismo radical.

D — Falaciosa: Descartes quebra com certos métodos escolásticos, mas não faz uma ruptura total com o passado; ele seleciona, critica e reconstrói o saber (reforma metodológica, não destruição absoluta).

Dica de prova: Procure termos absolutos (total, sempre, independentemente). Leia o enunciado à luz do que o autor enfatiza — aqui, “razão natural” e a intenção pedagógica de Descartes — e confronte com passagens-chave do Discurso do Método.

Fonte principal: René Descartes, Discurso do Método / Meditações. Para contextualização acadêmica: Stanford Encyclopedia of Philosophy (entrada “René Descartes”).

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