Questão 6ca86cc1-b1
Prova:UNIFESP 2014
Disciplina:Português
Assunto:Interpretação de Textos, Figuras de Linguagem, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

“Os jornalistas esporeavam a imaginação para achar adjetivos dignos da minha grandeza; fui o sublime Sr. Teodoro, cheguei a ser o celeste Sr. Teodoro; então, desvairada, a Gazeta das Locais chamou-me o extraceleste Sr. Teodoro!”


Nesta passagem do último parágrafo, identifica-se uma

Leia o trecho do conto “O mandarim”, de Eça de Queirós, para responder a questão.


    Então começou a minha vida de milionário. Deixei bem depressa a casa de Madame Marques – que, desde que me sabia rico, me tratava todos os dias a arroz- -doce, e ela mesma me servia, com o seu vestido de seda dos domingos. Comprei, habitei o palacete amarelo, ao Loreto: as magnificências da minha instalação são bem conhecidas pelas gravuras indiscretas da Ilustração Francesa. Tornou-se famoso na Europa o meu leito, de um gosto exuberante e bárbaro, com a barra recoberta de lâminas de ouro lavrado e cortinados de um raro brocado negro onde ondeiam, bordados a pérolas, versos eróticos de Catulo; uma lâmpada, suspensa no interior, derrama ali a claridade láctea e amorosa de um luar de Verão.

    [...]

   Entretanto Lisboa rojava-se aos meus pés. O pátio do palacete estava constantemente invadido por uma turba: olhando-a enfastiado das janelas da galeria, eu via lá branquejar os peitilhos da Aristocracia, negrejar a sotaina do Clero, e luzir o suor da Plebe: todos vinham suplicar, de lábio abjeto, a honra do meu sorriso e uma participação no meu ouro. Às vezes consentia em receber algum velho de título histórico: – ele adiantava-se pela sala, quase roçando o tapete com os cabelos brancos, tartamudeando adulações; e imediatamente, espalmando sobre o peito a mão de fortes veias onde corria um sangue de três séculos, oferecia-me uma filha bem-amada para esposa ou para concubina.

    Todos os cidadãos me traziam presentes como a um ídolo sobre o altar – uns odes votivas, outros o meu monograma bordado a cabelo, alguns chinelas ou boquilhas, cada um a sua consciência. Se o meu olhar amortecido fixava, por acaso, na rua, uma mulher – era logo ao outro dia uma carta em que a criatura, esposa ou prostituta, me ofertava a sua nudez, o seu amor, e todas as complacências da lascívia.

    Os jornalistas esporeavam a imaginação para achar adjetivos dignos da minha grandeza; fui o sublime Sr. Teodoro, cheguei a ser o celeste Sr. Teodoro; então, desvairada, a Gazeta das Locais chamou-me o extraceleste Sr. Teodoro! Diante de mim nenhuma cabeça ficou jamais coberta – ou usasse a coroa ou o coco. Todos os dias me era oferecida uma presidência de Ministério ou uma direção de confraria. Recusei sempre, com nojo.

(Eça de Queirós. O mandarim, s/d.)

A
hipérbole, por meio da qual o narrador enfatiza a intensidade de atenção recebida da imprensa portuguesa.
B
gradação, por meio da qual o narrador reforça a ideia de bajulação posta em prática pelos jornais portugueses.
C
ironia, por meio da qual o narrador refuta o tratamento que lhe dispensavam os jornalistas portugueses.
D
redundância, por meio da qual o narrador deixa entrever o modo como as pessoas lhe especulavam a vida.
E
antítese, por meio da qual o narrador explica as contradições dos jornais portugueses ao tomarem-no como assunto.

Gabarito comentado

O
Olivia Rocha Monitor do Qconcursos

Tema central: A questão aborda interpretação de texto com foco em figuras de linguagem, mais especificamente na gradação. Essa figura consiste na organização de palavras ou expressões em uma sequência que pode ser ascendente (intensificação) ou descendente (suavização), como definido por Evanildo Bechara e Celso Cunha & Lindley Cintra, gramáticos de referência.

Justificativa da alternativa correta – B) Gradação:
No trecho analisado, nota-se uma progressão crescente nos adjetivos atribuídos ao narrador: “sublime Sr. Teodoro”, depois “celeste Sr. Teodoro” e, finalmente, “extraceleste Sr. Teodoro”. O autor cria uma escada de enaltecimento, intensificando a bajulação dos jornalistas. Essa ordenação de termos caracteriza, com clareza, a gradação ascendente.

Análise das alternativas incorretas:

A) HipérboleNão é correta, pois, apesar do exagero embutido nos adjetivos, o destaque está na sequência progressiva, e não apenas na intensidade (como ocorre na hipérbole).

C) IroniaIncorreta, pois ironia é a expressão de uma ideia oposta ao que se quer dizer, muitas vezes com tom sarcástico. No trecho, o narrador apenas relata o exagero dos adjetivos, sem negar explicitamente aquilo que é dito sobre ele.

D) RedundânciaErrada, pois não há repetição vazia de sentido, mas sim uma progressão intencional e ordenada dos elogios.

E) AntíteseIncorreta, visto que antítese requer oposição de ideias (contraste), o que não ocorre nesses adjetivos, que seguem todos na mesma direção de intensificação.

Estratégias para provas:
Ao identificar sequências de termos que aumentam ou diminuem em intensidade, pense em gradação. Atente-se à intenção do texto: se há lógica de intensificação, não caia na armadilha da hipérbole ou redundância. Lembre: Gradação é ordem, não simples exagero.

Resumo: A alternativa B) Gradação está correta porque há uma evolução clara nos adjetivos, evidenciando uma progressão ascendente de significado — característica fundamental da figura de linguagem chamada gradação.

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