No trecho a seguir, o autor optou por usar um discurso
na primeira pessoal do plural. “No momento em que
damos nome a qualquer objeto da natureza, nós o
individualizamos, o diferenciamos do resto que o
cerca; ele passa a existir para a nossa consciência.”
Com essa opção, o autor pretendeu:
TEXTO 2
A linguagemA linguagem é um dos principais instrumentos na formação
do mundo cultural porque nos permite transcender a nossa
experiência palpável.No momento em que damos nome a qualquer objeto da
natureza, nós o individualizamos, o diferenciamos do resto
que o cerca; ele passa a existir para a nossa consciência.
Com esse simples ato de nomear, distanciamo-nos da
inteligência concreta animal, limitada ao ‘aqui’ e ao ‘agora’,
e entramos no mundo do simbólico. O nome é símbolo, é
representação dos objetos que existem no mundo natural e
das entidades abstratas, que só têm existência no mundo
imaterial ou no mundo dos sentimentos (por exemplo,
ações, estados ou qualidades, como saudade, tristeza,
beleza, liberdade). O nome tem a capacidade de tornar
presente para a nossa consciência o objeto que pode estar
até mesmo longe de nós.O nome, ou a palavra, retém na nossa memória, enquanto
ideia aquilo que já não está ao alcance de nossos sentidos:
o cheiro do mar, o perfume do jasmim numa noite de verão,
o toque da mão da pessoa amada, o som da voz do pai, o
rosto de um amigo querido.O simples pronunciar de uma palavra representa, isto é,
torna presente à nossa consciência o objeto a que ela se
refere. Não precisamos mais da existência física das coisas
para nos referirmos a elas: criamos, por meio da linguagem,
um mundo (mais ou menos) estável de ideias que nos
permite lembrar o que já foi e projetar o que será. Assim, é
instaurada a temporalidade no existir humano. Pela
linguagem, o ser humano deixa de reagir somente ao
presente, ao imediato; passa a poder pensar o passado e o
futuro e, com isso, a construir os seus projetos de vida.Por transcender a situação concreta, o fluir contínuo da
vida, o mundo criado pela linguagem se apresenta mais
estável e sofre mudanças mais lentas do que o mundo
natural. Pelas palavras, podemos transmitir o conhecimento
acumulado por uma pessoa ou sociedade. Podemos passar
adiante esta construção da espécie humana que se chama
cultura.
(Maria Lúcia de A. Aranha; Maria Helena P. Martins. Filosofando.
São Paulo: Editora Moderna, 2003, p.33. Adaptado).
Gabarito comentado
Tema central da questão: Interpretação de texto, especificamente o uso do pronome pessoal “nós” e seus impactos no discurso. Trata-se de reconhecer estratégias de aproximação e interação entre autor e leitor.
O pronome de 1ª pessoa do plural (“nós”) é uma escolha significativa no texto. Segundo Bechara (Moderna Gramática Portuguesa), o uso de “nós” inclui o próprio autor e seu interlocutor, promovendo engajamento coletivo. A partir do momento em que o autor escreve “damos nome... nós o individualizamos...”, ele se insere no grupo ao qual se refere, convidando o leitor a compartilhar a experiência e o raciocínio. Esse recurso torna o discurso mais interativo e inclusivo, trazendo o público para dentro da argumentação do texto.
Justificativa da alternativa correta - Letra D:
D) considerar-se como participante efetivo do grupo em comunicação; o discurso ficou mais interativo.
Essa é a única opção que capta o motivo da escolha pelo “nós”: o autor deseja ser parte do grupo que compartilha a experiência e a reflexão, fazendo do texto um espaço de diálogo sutil. O leitor não é um observador distante, mas alguém incluso na construção do sentido; há, portanto, maior interatividade no discurso.
Análise das alternativas incorretas:
A) “Sinalizar temas científicos; discurso mais persuasivo”: o uso de “nós” não indica obrigatoriamente ciência; busca inclusão, não persuasão técnica.
B) “Marcar submissão à norma padrão; discurso mais correto”: A escolha pelo “nós” está ligada à estratégia de interlocução, não a demonstrar obediência gramatical ou “correção”.
C) “Aproximar do jornalismo; discurso mais coloquial”: Embora os jornais usem o “nós” em editoriais, nesse contexto não há registro de coloquialidade, mas de interação argumentativa.
E) “Distinguir linguagem pública; discurso mais dialógico”: Não se trata de “distinção de linguagem pública”, mas sim de promover pertencimento e diálogo conceitual.
Estratégia para provas: sempre observe o pronome e seus efeitos discursivos. Se o autor opta por “nós”, atente-se à ideia de coletividade e inclusão. Não confunda norma-padrão, formalidade ou cientificidade com estratégias de interlocução.
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