As gravações de “Cuitelinho” (Sírio Possenti)
“Cuitelinho” é o título de belíssima canção “folclórica”, já gravada por dezenas de cantores.
Sua letra é corpus muito interessante para quem quiser saber como é o português falado no
Brasil. Sendo música do folclore, tem evidentemente muitas características da gramática do
português popular. Ouvindo as diversas gravações, descobrem-se pelo menos duas coisas:
a primeira é que há muita variação, especialmente de pronúncia ou sotaque; a segunda,
bem mais curiosa, deixando os detalhes de lado, refere-se ao fato de que, quanto menos
“letrados” são os cantores, mais eles corrigem a letra, confirmando a tese de que a ideologia
dominante é a ideologia da classe dominante.
(http://goo.gl/QTUzd. Acesso: 28/03/2013. Adaptado.)
O que as correções feitas pelos intérpretes na pronúncia da letra “Cuitelinho” revelam
acerca da relação entre ideologia e variação linguística?
Gabarito comentado
Tema central: Variação linguística e interferência da ideologia dominante. Trata-se de uma questão de interpretação de texto e análise sociolinguística, exigindo do candidato reconhecer a relação entre uso da língua e poder social.
No texto, o autor aponta que canteores menos “letrados” tendem a modificar a letra da canção em direção à norma padrão, o que confirma a tese da imposição da ideologia da classe dominante – ou seja, a variante da elite é percebida como superior, e mesmo aqueles de fora desse grupo acabam reproduzindo essa visão.
Regra/conceito fundamental: Segundo a sociolinguística (cf. Marcos Bagno, Celso Cunha & Lindley Cintra), a norma-padrão não é a única forma legítima da língua; há uma pluralidade legítima de usos. A “imposição” do padrão, entretanto, é uma forma de reafirmar o poder social de uma classe.
Justificativa da alternativa CORRETA (B):
A alternativa B diz: “A imposição da variante padrão da língua como estratégia de dominação de uma classe sobre as demais.” O enunciado afirma, com todas as letras, que quanto menos “letrados” são os cantores, mais corrigem a letra, confirmando a tese de que a ideologia dominante é a da classe dominante. Aqui, o padrão é visto como instrumento de poder e dominação – ou, nas palavras de Karl Marx, como expressão da ideologia da classe dominante (cf. A Ideologia Alemã), reforçando o papel social da linguagem.
Análise das alternativas INCORRETAS:
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A: Fala em “ignorância” dos cantores; o texto, porém, não julga os cantores, mas discute como todos acabam reproduzindo o padrão, muitas vezes inconscientemente.
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C: Diz que cantores “mais letrados” conhecem melhor a variante não padrão. O texto aponta o oposto: quanto menos letrado, maior a tendência a buscar o padrão.
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D: Fala em orgulho dos menos letrados ao afirmar identidade popular. O texto revela o contrário: a tendência é corrigir a letra, não valorizá-la em sua forma popular.
Estratégias para futuras provas: Atente-se a palavras-chave como “ideologia dominante”, “corrigem a letra” e “classe dominante”, que direcionam a leitura para a sociolinguística e relações de poder. Cuidado com alternativas que deslocam o sentido social do texto ou introduzem julgamentos não presentes no enunciado.
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