Questão cc94b211-9c
Prova:UECE 2019
Disciplina:Filosofia
Assunto:Filosofia e a Grécia Antiga

“Somos amantes da beleza sem extravagâncias e amantes da filosofia sem indolência. Usamos a riqueza mais como uma oportunidade para agir que como um motivo de vanglória; entre nós não há vergonha na pobreza, mas a maior vergonha é não fazer o possível para evitá-la. Ver-se-á em uma mesma pessoa ao mesmo tempo o interesse em atividades privadas e públicas, e em outros entre nós que dão atenção principalmente aos negócios não se verá falta de discernimento em assuntos políticos, pois olhamos o homem alheio às atividades públicas não como alguém que cuida apenas de seus próprios interesses, mas como um inútil; nós, cidadãos atenienses, decidimos as questões públicas por nós mesmos, ou pelo menos nos esforçamos por compreendê-las claramente, na crença de que não é o debate que é empecilho à ação, e sim o fato de não se estar esclarecido pelo debate antes de chegar a hora da ação”.

TUCÍDIDES. História da Guerra do Peloponeso, Livro II, 40. Trad. de Mario da Gama Kury. Brasília, DF: Editora da Universidade de Brasília, 2001.

Considerando as teses sobre o surgimento da filosofia na Grécia, essa passagem do famoso discurso do legislador ateniense Péricles, no segundo ano da Guerra do Peloponeso, apresenta elementos que nos remetem à tese de

A
John Burnet (1863-1928), para quem a filosofia nasce em completa ruptura com o pensamento tradicional grego, pois teria surgido nas novas cidades gregas na Costa da Ásia Menor – a Jônia.
B
Jean-Pierre Vernant (1914-2007), que defende a relação entre o debate público, os discursos argumentativos na pólis grega e a elaboração da linguagem argumentativa na filosofia.
C
Francis Cornford (1874-1943), de que há uma continuidade entre as representações religiosas tradicionais, transmitidas pela poesia grega e pelos rituais, e a primeira filosofia grega, na Jônia.
D
Rodolfo Mondolfo (1877-1976), que situa exclusivamente no ato psíquico-intelectual da maravilha, no sentido do espanto, a causa e o início da filosofia como investigação sobre os fenômenos da natureza.

Gabarito comentado

Athos VieiraHistoriador, Mestre em Ciência Política pelo IESP/UERJ e Doutorando em Ciência Política pelo IESP/UERJ
O que Péricles está louvando é a capacidade do povo ateniense em se esclarecer sobre os assuntos que devem ser decididos. Ainda que possa levar um pouco mais de tempo, os atenienses, reunidos em público e exercitando suas capacidades racionais de encontrimento e compreensão, se esclarecem antes da ação. Essa atitude remete à importância do debate público para o desenvolvimento argumentativo e das ideias, como defendia Jean Pierre Vernant. Vernant se opunha à escola explicativa que seguia os passos de John Burnet, pois este considerava a ruptura com o pensamento religioso o marco de nascimento da filosofia. Cornford já havia criticado tal premissa considerando que a sobrevivênvia de mitos e outras estruturas de pensamento do mundo religioso se mantiveram através da arte e da própria filosofia. A proposta de Rodolfo Mondolfo nada tem a ver com o trecho citado.
A resposta é letra B.

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