Questão 7b1edaf6-b0
Prova:UNICENTRO 2010
Disciplina:Filosofia
Assunto:Filosofia e a Grécia Antiga, Sócrates e a Maiêutica

“Difícil caracterizar o estilo de Sócrates. Os próprios antigos lhe forjaram uma palavra sob medida, eirôn (de onde vem a palavra ironia), que deixa o tradutor moderno tão perplexo quanto o etimologista antigo. Traduzamos, para simplificar, por ‘aquele que se pretende ignorante’, que ‘diz menos do que parece pensar’; portanto, ‘finório’, se tomarmos pelo lado pior, como Aristófanes, ou ‘reservado’, se seguirmos Platão e Aristóteles. Mas também ‘ingênuo’, se admitirmos sem discussão o que ele diz de si mesmo, ou ‘dissimulado’, se não acreditarmos nisso” (WOLF, F. SócratesO sorriso da razão. São Paulo: Editora Brasiliense, 1987).


Analise as alternativas e assinale a INCORRETA.

A
A ironia é escárnio e sarcasmo. Marcas de um método destrutivo, a ironia socrática é conhecida pelo nome de maiêutica: “dar à luz” novas ideias. Verdadeiramente vaidosa, essa atitude filosófica em Sócrates não pode ser separada da franca hipocrisia, como atesta, seu emblemático “só sei que nada sei”.
B
A ironia é distanciamento. Para poder filosofar, para colocar entre si e o mundo a barreira profilática do questionamento e da reflexão, é preciso reconhecer que a cada conhecimento obtido, uma nova ignorância se abre diante de nós. O conhecimento não é um estado, mas um processo, uma busca, uma procura pela verdade.
C
Ironia: verdade e fingimento, ao mesmo tempo. Nem hipócrita, nem verdadeiramente franca, diz a verdade parecendo dizer o seu contrário. Realmente Sócrates diz a verdade: ele nada sabe, pois só ele sabe que, às questões que ele põe, não há nenhum saber constituído que possa responder. A ironia é refutação, com a finalidade de romper a solidez aparente dos preconceitos.
D
Ironia é zombaria: o diálogo socrático vai justamente dissolver o saber irrefletido de seu interlocutor e reduzir a nada suas pretensões normativas. Curiosa inversão irônica: o “eu nada sei” (daquilo que acreditas que sei), mas tu sabes (o que tu não pensas que sabes)” se duplica num “tu nada sabes” (daquilo que acreditas saber).
E
Ironia é espantar-se com o que já não espanta. Os momentos fugidios, roubados pela ironia à seriedade das coisas e à aderência da existência, são momentos preciosos: são momentos de consciência.

Gabarito comentado

M
Manuela Cardoso Monitor do Qconcursos

Resposta correta (INCORRETA na prova): Alternativa B

Tema central: trata-se da ironía socrática — o comportamento de Sócrates que finge ignorância para provocar exame crítico nas opiniões dos interlocutores. Conhecimentos úteis: Platão (Apologia, Meno, diálogos socráticos), Xenofonte, Aristófanes (As Nuvens) e noções de elenchus (refutação) e maiêutica (metáfora da parteira).

Resumo teórico: Ironia (eirôn): atitude de fingida ignorância que revela contradições no saber alheio. Elenchus: método de refutação socrática — mostrar que uma opinião é inconsistente. Maiêutica: metáfora de Sócrates (“ajudar a dar à luz” ideias), complementa o elenchus quando permite que o interlocutor descubra a verdade por si.

Por que a alternativa B é INCORRETA?

A B apresenta a ironia como um simples distanciamento profilático e enfatiza que a cada conhecimento surge nova ignorância — ideia mais próxima do espírito crítico ou da busca contínua pelo saber, mas ela confunde finalidade e modo. A ironia socrática não é primariamente um gesto existencial de distanciamento epistemológico: é uma tática retórica/metodológica (fingir ignorância) usada para provocar o interlocutor e testar suas afirmações. Ou seja, ironia = postura estratégica; o reconhecimento da limitação do saber e o processo contínuo do conhecimento pertencem ao horizonte mais amplo da maiêutica e da humildade socrática, não definem a ironia tal como usada por Sócrates. Por isso a alternativa B generaliza e desloca o sentido.

Comentários sobre as demais alternativas (por que foram aceitas):

A: exagera ao igualar ironia com escárnio e a confundir maiêutica com ironia — mas aponta corretamente a crítica de Aristófanes e a leitura ambivalente (vaidade vs. humilhação).

C: descreve bem a dupla face da ironia — fingimento que expõe a verdade via refutação — alinhada com o elenchus platônico.

D: capta a função desestabilizadora do diálogo socrático (dissolver saberes pretensiosos); o tom “zombaria” remete à caricatura aristofânica, plausível como leitura.

E: mais literária e menos técnica, mas sugere que a ironia cria momentos de consciência — interpretação aceitável desde que entendida como efeito provocado pelo exame crítico.

Dica de prova: procure na alternativa a confusão entre termos técnicos (ironía, elenchus, maiêutica). Palavras‑armadilha: “é”, “sempre”, “primariamente”. Relacione cada termo a sua função histórica nos textos (Platão, Xenofonte, Aristófanes).

Fontes sugeridas: Platão (Apologia, Meno), Xenofonte (Memoráveis), Aristófanes (As Nuvens).

Gostou do comentário? Deixe sua avaliação aqui embaixo!

Estatísticas

Aulas sobre o assunto

Questões para exercitar

Artigos relacionados

Dicas de estudo