“Quincas Borba”, considerada uma das grandes obras da fase áurea do escritor Machado
de Assis, põe em cena a história de Rubião, um modesto professor de Barbacena, cidade no
interior de Minas Gerais, que, ao receber uma herança inesperada do amigo Quincas Borba,
resolve mudar para o Rio de Janeiro – na época, centro da vida política e econômica brasileira.
Ali, encontra dificuldades para adaptar-se ao modo de ser dos que convivem com o poder,
tornando-se uma vítima de aproveitadores que se fazem passar por amigos, caso, sobretudo, do
casal Cristiano e Sofia Palha. O capítulo transcrito a seguir é o último do livro. Nele se encontra uma espécie de síntese da
narrativa, ao se elencarem personagens centrais da trama a partir da notícia da morte do cão
Quincas Borba, cujo nome é o mesmo de seu primeiro dono, que foi herdado por Rubião. “Queria dizer aqui o fim do Quincas Borba, que adoeceu também, ganiu infinitamente, fugiu
desvairado em busca do dono, e amanheceu morto na rua, três dias depois. Mas, vendo a morte
do cão narrada em capítulo especial, é provável que me perguntes se ele, se o seu defunto
homônimo é que dá título ao livro, e por que antes um que outro, - questão prenhe de questões,
que nos levariam longe... Eia! chora os dois recentes mortos, se tens lágrimas. Se só tens riso, rite. É a mesma coisa. O Cruzeiro, que a linda Sofia não quis fitar, como lhe pedia Rubião, está
assaz alto para não discernir os risos e as lágrimas dos homens.” (MACHADO DE ASSIS. Quincas Borba. São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras, 2012. p.
344).
Apesar de Machado de Assis construir parte significativa de sua obra ainda em fins do século XIX,
é possível já verificar, em seus textos, o emprego de recursos próprios da literatura moderna. A
esse propósito, sobre o trecho em questão, pode-se afirmar que:
Gabarito comentado
Tema central: Esta questão aborda interpretação de texto, com enfoque em funções da linguagem, especialmente a metalinguagem. A habilidade fundamental aqui é identificar como o narrador dialoga com o próprio texto ou com o leitor, recurso típico da literatura moderna.
No trecho analisado, o narrador expõe dúvidas possíveis do leitor (“é provável que me perguntes...”), comenta sobre o enredo e até sobre o título do livro, questionando a razão do título “Quincas Borba” preferir o cão ou o homem que lhe deu nome. Essa reflexão sobre o próprio texto é a essência da metalinguagem.
Justificativa da alternativa correta:
B) o exercício de reflexão em torno da metalinguagem, convida o leitor a refletir sobre esse ponto.
O trecho explicita a metalinguagem ao trazer o texto para o centro da discussão. O narrador, ao antever questionamentos do leitor e discutir o próprio título da obra, está praticando a função metalinguística, conforme definido por autores como Bechara (“A metalinguagem ocorre quando a linguagem referenda e analisa a si mesma.”).
Análise das alternativas incorretas:
A: Embora haja interlocução com o leitor, o foco não está em deixar o enredo aberto, mas sim em refletir sobre o texto.
C: Não há um tom de “ternura” destacado nem apelo à necessidade de humanização; a passagem é analítica e distanciada.
D: Apesar de mencionar as reações “chorar/rir”, o objetivo central não é criar uma imagem complexa do ser humano, mas sim analisar a obra em si.
E: O texto não oferece uma mensagem moral universal, e sim provoca a reflexão sobre o enredo e o título do livro.
Estratégia para questões similares: Sempre que o texto discutir seu próprio enredo, estrutura ou elementos (como título, personagens, leitor), desconfie da presença de metalinguagem. Identifique marcas textuais, como perguntas sobre o próprio texto ou comentários sobre sua composição.
Conclusão: A alternativa B é correta por identificar a metalinguagem, recurso moderno que convida o leitor a pensar sobre o próprio texto, corroborando a influência de Machado de Assis na transição para a literatura moderna.
Gostou do comentário? Deixe sua avaliação aqui embaixo!






