Leia o trecho abaixo para a questão:
“Fabiano recebia na partilha a quarta parte dos bezerros e a terça dos
cabritos. Mas como não tinha roça e apenas se limitava a semear na vazante
uns punhados de feijão e milho, comia da feira, desfazia-se dos animais, não
chegava a ferrar um bezerro ou assinar a orelha de um cabrito.
[…]
Ora, daquela vez, como das outras, Fabiano ajustou o gado, arrependeu-se, enfim deixou a transação meio apalavrada e foi consultar a mulher. Sinhá Vitória mandou os meninos para o barreiro, sentou-se na cozinha, concentrou-se, distribuiu no chão sementes de várias espécies, realizou somas e diminuições. No dia seguinte Fabiano voltou à cidade, mas
ao fechar o negócio notou que as operações de Sinhá Vitória, como de costume, diferiam das do patrão. Reclamou e obteve a explicação habitual: a
diferença era proveniente de juros.
Não se conformou: devia haver engano. Ele era bruto, sim senhor, viase perfeitamente que era bruto, mas a mulher tinha miolo. Com certeza
havia um erro no papel do branco.
Não se descobriu o erro, e Fabiano
perdeu os estribos. Passar a vida inteira assim no toco, entregando o que
era dele de mão beijada! Estava direito aquilo? Trabalhar como negro e
nunca arranjar carta de alforria!
O patrão zangou-se, repeliu a insolência, achou bom que o vaqueiro
fosse procurar serviço noutra fazenda.
Aí Fabiano baixou a pancada e amunhecou. Bem, bem. Não era preciso
barulho não. Se havia dito palavra à-toa, pedia desculpa. […].”
(RAMOS, Graciliano. Vidas Secas. Rio de Janeiro: Record, 2013. p.93-94.)
Vidas Secas (1938), um clássico de Graciliano Ramos, narra as dificuldades de sobrevivência de uma família de retirantes, encabeçada por Fabiano e Sinhá Vitória, no sertão nordestino. Fabiano, na cena apresentada, é injustiçado por:
Gabarito comentado
Comentário sobre a questão:
Tema central: A questão aborda principalmente interpretação de texto, exigindo que o candidato compreenda as informações explícitas e implícitas presentes em um trecho de obra literária.
Para resolver esse tipo de questão, é fundamental ler atentamente o texto, identificar o contexto e o conflito apresentado, assim como os indícios de injustiça relatados. O domínio de coerência e semântica textual também é essencial, conforme orientam autores como Ingedore Koch e Evanildo Bechara.
Justificativa da alternativa correta (B):
A alternativa B) não receber seu salário como deveria é a correta, pois o texto deixa claro que Fabiano, ao tentar negociar o pagamento pelo seu trabalho, sempre recebe explicações evasivas do patrão sobre diferenças nos valores pagos, atribuídas aos “juros”. A esposa, Sinhá Vitória, faz cálculos e também percebe que há um erro, o que demonstra que Fabiano é lesado financeiramente e não recebe o que lhe é de direito. Isso caracteriza a injustiça citada no enunciado. Essa avaliação se baseia na compreensão do sentido geral do texto e da estrutura narrativa que expõe a relação desigual e opressora entre patrão e empregado.
Análise das alternativas incorretas:
A) Não há dificuldades comunicativas com Sinhá Vitória. Fabiano confia na esposa para realizar contas e eles se ajudam mutuamente.
C) Não há menção a problemas na realização do trabalho. Fabiano cumpre suas funções, mas é injustiçado no pagamento.
D) O texto não aborda dificuldade em vender animais. Não há citação de intenção de venda frustrada.
E) Não é discutida a falta de local para criar animais no trecho em análise, o que foge ao tema da injustiça sofrida.
Estratégia de prova: Para resolver questões de interpretação, busque pistas explícitas e inferências lógicas. Atenção a expressões como “engano”, “erro”, “diferença de juros” e à reação indignada do personagem, que revelam o sentido subentendido.
Segundo Bechara e Koch, a coerência textual guia a relação entre causa e consequência e deve ser observada para identificar a alternativa correta. Aqui, a injustiça está diretamente ligada à questão do salário incorreto.
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