Questão f98b2b08-e7
Prova:CÁSPER LÍBERO 2016
Disciplina:Português
Assunto:Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

Segundo o texto, o problema do ensino de filosofia baseado na adoção de manuais de história da filosofia reside no fato de que:

Leia o texto a seguir e responda à questao:


Os adolescentes e a filosofia

Vladimir Safatle


    Há poucos anos, o ensino de filosofia tornou-se matéria obrigatória para os alunos de ensino médio. Uma decisão acertada que leva em conta a necessidade de estudantes adolescentes desenvolverem habilidades críticas, além de compreenderem a complexidade da gênese de conceitos fundamentais para nossas formas de vida.

    De fato, a filosofia, tal como a conhecemos hoje, é o discurso que permite à chamada “experiência do pensamento ocidental” criticar seus próprios valores morais, estéticos, normas sociais e evidências cognitivas. A cláusula restritiva relativa ao “ocidente” justifica-se pelo fato de conhecermos muito pouco a respeito dos sistemas não ocidentais de pensamento. Temos, em larga medida, uma visão estereotipada de que eles ainda seriam fortemente vinculados ao pensamento mítico e, por isso, não teriam algo parecido à nossa razão desencantada, que baseia seus princípios na confrontação das argumentações a partir da procura do melhor argumento. É provável que em alguns anos tenhamos de rever tal análise.

    De toda forma, que adolescentes sejam apresentados à filosofia, eis algo que vale a pena conservar. A adolescência transformou-se entre nós em um momento de revisão profunda do sistema de valores e crenças, de abertura e de profunda insegurança. Em sociedades com tendências a criticar modelos de autoridade baseados no legado da tradição e na repetição de experiências passadas, sociedades que incitam os indivíduos a tomar em seus ombros a responsabilidade pela construção de seus estilos de vida, inclusive como estratégia para apagar os impasses propriamente sociais de nossos modelos de conduta e julgamento, a adolescência será necessariamente vivenciada de forma mais angustiante. Nesse sentido, o contato com a filosofia encontra um terreno fértil de questionamento.

    A avaliação dos livros e projetos pedagógicos normalmente direcionados a nossos alunos revela, no entanto, que deveríamos procurar outras estratégias de ensino. Nossos livros didáticos e paradidáticos são, na sua grande maioria, manuais de exposição da história da filosofia a partir de seus personagens principais. Os melhores se organizam a partir de temas específicos e do seu desdobramento nos últimos dois mil anos (o que, convenhamos, não é pouco tempo). Nos dois casos, alcança-se, no máximo, uma visão geral da história das ideias. Normalmente muito bem ilustrada.

    Melhor seria focar o ensino na leitura dirigida de textos maiores da tradição filosófica. Um adolescente tem todas as condições de ter uma primeira leitura produtiva de textos como O banquete ou A república, de Platão, Discurso sobre a origem da desigualdade, de Rousseau, Meditações, de Descartes, Além do bem e do mal, de Nietzsche, ou mesmo um texto como O que é o esclarecimento?, de Kant, entre tantos outros. São obras que abrem parte de suas questões diante de uma primeira leitura dirigida. Eles permitem ainda uma problematização sobre questões maiores como o amor, a política, a autoidentidade, a injustiça social e as aspirações da razão.

    Nesse sentido, ganharíamos mais se os cursos fossem direcionados, por um lado, ao aprendizado sistemático da leitura e da interpretação. Nossos alunos chegam à universidade sem uma real capacidade de compreensão e problematização de textos. Os cursos de Filosofia poderiam colaborar em muito para mudar tal realidade.

    Por outro lado, e sei que isso pode estranhar alguns, ganharíamos muito se uma parte dos cursos de Filosofia para os adolescentes fosse dedicada ao ensino da lógica. Nossos alunos chegam às universidades com dificuldades de escrita e raciocínio que poderiam ser minoradas se eles tivessem cursos de lógica. Sei que esta é uma das disciplinas de que nossos alunos de filosofia menos gostam, mas eles ganhariam muito, em todas as áreas, se tivessem uma formação mais sistemática no campo da lógica e da teoria do conhecimento.

    Neste momento em que a sociedade brasileira se dá conta da importância da luta pela qualidade do ensino, deveríamos parar de desqualificar a capacidade de raciocínio de nossos adolescentes. Eles merecem conhecer diretamente os textos e ideias que constituíram nossa experiência social. Esta seria uma estratégia melhor do que lhes apresentar manuais.

Fonte: http://www.cartacapital.com.br/revista/760/os-adolescentes-e-a-filosofia-9201.html

A
Esses manuais abrem parte de suas questões diante de uma primeira leitura dirigida, permitindo somente uma problematização de questões secundárias da Filosofia.
B
A visão geral da história das ideias transmitida por tais manuais impede o adolescente de descobrir os textos filosóficos originais.
C
O contato direto com os textos dos filósofos propicia aos adolescentes um desafio maior que a mera cronologia das ideias filosóficas.
D
Eles somente direcionam o estudo da Filosofia ao aprendizado sistemático da leitura e da interpretação de textos clássicos.
E
As dificuldades de escrita e raciocínio dos adolescentes não podem ser resolvidas por meio da leitura desses manuais.

Gabarito comentado

T
Thiago Oliveira Monitor do Qconcursos

Tema central: Interpretação de Texto – análise crítica de ideias principais e secundárias.

A questão exige que o candidato compreenda a crítica do autor ao ensino de filosofia baseado em manuais e identifique, a partir da leitura atenta, a alternativa que expressa de forma fiel o problema apontado no texto.

Segundo a norma-padrão da Língua Portuguesa (Cunha & Cintra; Bechara), compreender um texto implica captar ideias centrais, distinções entre argumentos principais e secundários e reconhecer relações entre eles (coesão e coerência textual). Isso envolve ler além do superficial, destacando as nuances do discurso.

Justificativa da alternativa correta (C):

O autor afirma que os manuais, ao oferecerem apenas uma “visão geral da história das ideias”, limitam a experiência filosófica do estudante, pois não propiciam o desafio intelectual que o contato direto com textos fundamentais proporciona. Está escrito: “Melhor seria focar o ensino na leitura dirigida de textos maiores da tradição filosófica. Um adolescente tem todas as condições de ter uma primeira leitura produtiva (...)”. Portanto, a alternativa C, ao afirmar que o contato direto com textos originais proporciona “um desafio maior que a mera cronologia das ideias filosóficas”, traduz exatamente a crítica central do autor.

Análise das alternativas incorretas:

A) Equívoco: Não se encontra no texto que apenas questões secundárias podem ser problematizadas com os manuais. O termo “questões maiores” usado no texto é associado aos textos originais, não aos manuais.

B) Generalização: O texto não afirma que os manuais impedem o acesso aos originais, apenas que dão uma visão geral, o que limita, mas não inviabiliza, o contato direto.

D) Incorreto: O texto não diz que os manuais direcionam sistematicamente à leitura de clássicos, mas aponta sua limitação ao resumo da história das ideias.

E) Conclusão forçada: Embora o texto aponte as dificuldades de raciocínio dos alunos, não há afirmação de que essas não podem ser resolvidas pelos manuais, mas sim que o ensino deveria ser diferente.

Estratégia: Sempre destaque termos-chave como “melhor seria”, “visão geral”, “desafio maior”, que indicam soluções defendidas pelo autor. Isso evita confusões e pegadinhas de alternativas muito próximas.

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