Questão f7d4124b-fc
Prova:FUVEST 2019
Disciplina:Português
Assunto:Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

No excerto, o autor recorre à intertextualidade, dialogando com a comédia de Molière, Tartufo (1664), cuja personagem central é um impostor da fé. Tal é a fama da peça que o nome próprio se incorporou ao vocabulário, inclusive em português, como substantivo comum, para designar o “indivíduo hipócrita” ou o “falso devoto”. No contexto maior do romance, sugere‐se que a tartufice

    E Sofia? interroga impaciente a leitora, tal qual Orgon: Et Tartufe? Ai, amiga minha, a resposta é naturalmente a mesma, – também ela comia bem, dormia largo e fofo, – coisas que, aliás, não impedem que uma pessoa ame, quando quer amar. Se esta última reflexão é o motivo secreto da vossa pergunta, deixai que vos diga que sois muito indiscreta, e que eu não me quero senão com dissimulados.

    Repito, comia bem, dormia largo e fofo. Chegara ao fim da comissão das Alagoas, com elogios da imprensa; a Atalaia chamou‐lhe “o anjo da consolação”. E não se pense que este nome a alegrou, posto que a lisonjeasse; ao contrário, resumindo em Sofia toda a ação da caridade, podia mortificar as novas amigas, e fazer‐lhe perder em um dia o trabalho de longos meses. Assim se explica o artigo que a mesma folha trouxe no número seguinte, nomeando, particularizando e glorificando as outras comissárias – “estrelas de primeira grandeza”.

Machado de Assis, Quincas Borba.

A
se cola à imagem da leitora, indiscreta quanto aos amores alheios.
B
é ação isolada de Sofia, arrivista social e benemérita fingida.
C
diz respeito ao filósofo Quincas Borba, o que explica o título do livro.
D
se produz na imprensa, apesar de esta se esquivar da eloquência vazia.
E
se estende à sociedade, na qual o cinismo é o trunfo dos fortes.

Gabarito comentado

V
Viviane Mendes Monitor do Qconcursos

Tema central: Interpretação de texto, envolvendo também intertextualidade e um domínio semântico do vocabulário. Exige-se compreender o sentido de “tartufice” (derivado do personagem Tartufo, de Molière), que remete à hipocrisia, à dissimulação, conceitos basilares para análise.

Justificativa da alternativa correta (E):

Machado de Assis utiliza a intertextualidade ao fazer referência à peça Tartufo, associando o falso moralismo e a hipocrisia de seu personagem ao comportamento social retratado no romance. No contexto de Quincas Borba, a crítica feita pelo narrador transcende personagens isolados; mira a sociedade de seu tempo, marcada por relações movidas pelo interesse e pelo cinismo, onde “tartufice” é um traço coletivo, comum aos que desejam ascender socialmente ou manter aparências. Assim, a hipocrisia não é particular de Sofia, da leitora ou da imprensa, mas um fenômeno social amplo: “se estende à sociedade, na qual o cinismo é o trunfo dos fortes”. Isso respeita o que Bechara (2009) define em semântica: “O sentido das palavras se amplia sensivelmente quando inseridas no contexto da crítica social”.

Análise das alternativas incorretas:

A) Incorreta. A “tartufice” não se refere à leitora; ela apenas indaga, mas não é personagem do romance.
B) Parcialmente verdadeira, mas restrita: Sofia pode ter traços hipócritas, porém a intenção crítica do autor é mais ampla.
C) Errada. Quincas Borba representa filosofia e crítica ao humanitismo, não personifica o conceito de tartufice.
D) Errada. A imprensa é citada, mas não é ela que protagoniza a hipocrisia. É apenas um reflexo da sociedade.

Estratégias para provas:
Fique atento a generalizações ou restrições indevidas. Aqui, “tartufice” é um fenômeno geral, confirmando que nunca se deve restringir o sentido sem lastro no texto.
Leia os conectivos e expressões que ampliam ou restringem o alcance do conceito.
Busque sempre o subtexto, especialmente em autores como Machado.

Conclusão:
A resposta correta é a E: a tartufice corresponde à hipocrisia ampla, característica da sociedade descrita no romance.
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