Questão ef26463d-eb
Prova:FAG 2017
Disciplina:Português
Assunto:Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

“Nunca, em tempo algum, qualquer vítima de atropelamento, tentativa de morte, conflito, briga ou simples indisposição intestinal foi parar num hospital”. Pela afirmativa do narrador, depreendesse que:

Texto 2: Repórter Policial


    [...] Assim como o locutor esportivo jamais chamou nada pelo nome comum, assim também o repórter policial é um entortado literário. Nessa classe, os que se prezam nunca chamariam um hospital de hospital. De jeito nenhum. É nosocômio. Nunca, em tempo algum, qualquer vítima de atropelamento, tentativa de morte, conflito, briga ou simples indisposição intestinal foi parar num hospital. Só vai para o nosocômio.E assim sucessivamente.
    Qualquer cidadão que vai à Polícia prestar declarações que possam ajudá-la numa diligência (apelido que eles puseram no ato de investigar), é logo apelidada de testemunha chave. Suspeito é Mister X, advogado é causídico, soldado é militar, marinheiro é naval, copeira é doméstica e, conforme esteja deitada, a vítima de um crime – de costas ou de barriga pra baixo – fica numa destas duas incômodas posições: decúbito dorsal ou decúbito ventral.
    Num crime descrito pela imprensa sangrenta, a vítima nunca se vestiu. A vítima trajava. Todo mundo se veste… mas, basta virar vítima de crime, que a rapaziada sadia ignora o verbo comum e mete lá: “A vítima traja terno azul e gravata do mesmo tom”. Eis, portanto, que é preciso estar acostumado ao “métier” para morar no noticiário policial. Como os locutores esportivos, a Delegacia do Imposto de Renda, os guardas de trânsito, as mulheres dos outros, os repórteres policiais nasceram para complicar a vida da gente. Se um porco morde a perna de um caixeiro de uma dessas casas da banha, por exemplo, é batata…a manchete no dia seguinte tá lá: “Suíno atacou comerciário”.
    Outro detalhezinho interessante: se a vítima de uma agressão morre, tá legal, mas se — ao contrário — em vez de morrer fica estendida no asfalto, está prostrada. Podia estar caída, derrubada ou mesmo derribada, mas um repórter de crime não vai trair a classe assim à toa. E castiga na página: "Naval prostrou desafeto com certeira facada." Desafeto — para os que são novos na turma — devemos explicar que é inimigo, adversário, etc. E mais: se morre na hora, tá certo; do contrário, morrerá invariavelmente ao dar entrada na sala de operações.
    De como vive a imprensa sangrenta, é fácil explicar. Vive da desgraça alheia, em fotos ampliadas. Um repórter de polícia, quando está sem notícia, fica na redação, telefonando pras delegacias distritais ou para os hospitais, perdão, para os nosocômios, onde sempre tem um cupincha de plantão. [...]
Fonte: STANISLAW, Ponte Preta. São Paulo: Moderna, 1986.

A
Os repórteres policiais raramente usam o termo ‘hospital’.
B
Os repórteres policiais costumam deturpar a realidade.
C
A vítima prefere ficar no anonimato.
D
Pessoas envolvidas em ocorrência policial procuram medicar-se por conta própria.
E
A vítima prefere não ir ao hospital, desse modo não precisa prestar queixa policial.

Gabarito comentado

R
Rafael Martins Monitor do Qconcursos

Tema central: Interpretação de texto – Ironia e uso da linguagem jornalística

A questão exige que o aluno identifique a ironia e compreenda a crítica feita à linguagem dos repórteres policiais. O texto destaca, com humor, que estes profissionais evitam termos cotidianos como “hospital” e preferem jargões como “nosocômio”. Isso é uma crítica à afetação linguística do noticiário policial.

Segundo Evanildo Bechara (Moderna Gramática Portuguesa), a ironia é uma figura de linguagem em que se diz o oposto do que realmente se pensa, geralmente com efeito humorístico ou crítico. O narrador ironiza ao dizer que “nunca, em tempo algum, qualquer vítima [...] foi parar num hospital”, sugerindo que o termo “hospital” é evitado.

Justificativa da alternativa correta:

A) Os repórteres policiais raramente usam o termo ‘hospital’.

Correta. O trecho demonstra que, por tradição ou costume de redação, usam outras palavras mais eruditas. O uso de “nosocômio” é um exemplo claro dado pelo próprio narrador, reforçado por expressões como “nunca chamariam um hospital de hospital”.

Análise das alternativas incorretas:

B) Errada. O texto não afirma que os repórteres deturpam a realidade, mas sim que usam linguagem rebuscada.

C) Errada. Não há menção à escolha da vítima pelo anonimato.

D) Errada. Não existe no texto a ideia de automedicação ou esquiva do atendimento médico.

E) Errada. O texto não sugere que a vítima evite o hospital para não prestar queixa.

Estratégia de resolução e dica importante:

Para identificar ironias e críticas indiretas, atente-se a expressões absolutas (“nunca, em tempo algum”), repetições e exageros. O uso do humor costuma camuflar o que realmente se quer dizer. Por isso, busque o sentido figurado e não apenas o objetivo.

Assim, a correta compreensão das intencionalidades do narrador é essencial para evitar distrações com alternativas fora do contexto ou sem base textual.

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