Questão ef2298c4-eb
Prova:FAG 2017
Disciplina:Português
Assunto:Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

Assinale a alternativa correta quanto ao que esclarece o texto 2:

Texto 2: Repórter Policial


    [...] Assim como o locutor esportivo jamais chamou nada pelo nome comum, assim também o repórter policial é um entortado literário. Nessa classe, os que se prezam nunca chamariam um hospital de hospital. De jeito nenhum. É nosocômio. Nunca, em tempo algum, qualquer vítima de atropelamento, tentativa de morte, conflito, briga ou simples indisposição intestinal foi parar num hospital. Só vai para o nosocômio.E assim sucessivamente.
    Qualquer cidadão que vai à Polícia prestar declarações que possam ajudá-la numa diligência (apelido que eles puseram no ato de investigar), é logo apelidada de testemunha chave. Suspeito é Mister X, advogado é causídico, soldado é militar, marinheiro é naval, copeira é doméstica e, conforme esteja deitada, a vítima de um crime – de costas ou de barriga pra baixo – fica numa destas duas incômodas posições: decúbito dorsal ou decúbito ventral.
    Num crime descrito pela imprensa sangrenta, a vítima nunca se vestiu. A vítima trajava. Todo mundo se veste… mas, basta virar vítima de crime, que a rapaziada sadia ignora o verbo comum e mete lá: “A vítima traja terno azul e gravata do mesmo tom”. Eis, portanto, que é preciso estar acostumado ao “métier” para morar no noticiário policial. Como os locutores esportivos, a Delegacia do Imposto de Renda, os guardas de trânsito, as mulheres dos outros, os repórteres policiais nasceram para complicar a vida da gente. Se um porco morde a perna de um caixeiro de uma dessas casas da banha, por exemplo, é batata…a manchete no dia seguinte tá lá: “Suíno atacou comerciário”.
    Outro detalhezinho interessante: se a vítima de uma agressão morre, tá legal, mas se — ao contrário — em vez de morrer fica estendida no asfalto, está prostrada. Podia estar caída, derrubada ou mesmo derribada, mas um repórter de crime não vai trair a classe assim à toa. E castiga na página: "Naval prostrou desafeto com certeira facada." Desafeto — para os que são novos na turma — devemos explicar que é inimigo, adversário, etc. E mais: se morre na hora, tá certo; do contrário, morrerá invariavelmente ao dar entrada na sala de operações.
    De como vive a imprensa sangrenta, é fácil explicar. Vive da desgraça alheia, em fotos ampliadas. Um repórter de polícia, quando está sem notícia, fica na redação, telefonando pras delegacias distritais ou para os hospitais, perdão, para os nosocômios, onde sempre tem um cupincha de plantão. [...]
Fonte: STANISLAW, Ponte Preta. São Paulo: Moderna, 1986.

A
Num ato investigativo, testemunha-chave é o suspeito de ter cometido algum delito.
B
O repórter policial, tanto quanto o esportivo, são entortados literários por que suas linguagens são específicas.
C
O repórter policial é alguém que corrige as expressões de gíria e os inconvenientes da língua falada.
D
O dia a dia do repórter policial é buscar notícias junto às delegacias distritais da redação onde trabalha.
E
Numa descrição de crime, a imprensa sangrenta sempre descreve a vítima em estado de nudez.

Gabarito comentado

M
Miguel Vargas Monitor do Qconcursos

Gabarito: B

Tema central da questão: Interpretação de Texto, com ênfase na análise do estilo linguístico e das escolhas semânticas do autor ao descrever peculiaridades da linguagem dos repórteres policiais.

O texto explora, de forma humorística e crítica, o modo como certos profissionais, como repórteres policiais e locutores esportivos, adotam uma linguagem própria, repleta de termos específicos, rebuscados ou técnicos, afastando-se do uso comum da língua. Isso é sintetizado na expressão destacada pelo autor: “entortado literário”, que significa “aquele que distorce ou complica a linguagem habitual”.

Justificativa da alternativa correta (B):

A alternativa B destaca justamente que o repórter policial, assim como o esportivo, são “entortados literários” porque suas linguagens são específicas. Conforme ensina Cunha & Cintra (Nova Gramática do Português Contemporâneo), o uso de “gírias de profissão” ou marcações estilísticas diferencia uma linguagem técnica do registro coloquial. O texto confirma isso ao mostrar como, por exemplo, hospital vira nosocômio e veste vira traja.

Análise das alternativas incorretas:

  • A: O texto associa “testemunha-chave” a quem presta declarações, não ao suspeito. Interpretar erroneamente o papel da testemunha é desprezar o contexto – cuidado com generalizações apressadas!
  • C: O repórter não corrige gírias; ao contrário, ele complica (ou rebusca) o discurso, tornando-o pouco convencional. A crítica do texto aponta para um afastamento da linguagem popular, não para purificação linguística.
  • D: Apesar de o repórter buscar informações em delegacias, o texto não diz que isso ocorre sempre da redação – a frase limita um contexto que é mais amplo, caindo numa restrição indevida.
  • E: O texto ironiza o uso do verbo “trajar”, e não descreve casos de nudez; trata-se de erro por extrapolação do sentido, uma pegadinha semântica.

Estratégia para provas: Ao lidar com textos críticos ou satíricos, é fundamental atentar ao tom do autor e a expressões irônicas. Palavras-chave (“entortado literário”, “nunca chamariam hospital de hospital”, “métier”) ajudam a revelar a intenção e temperam a interpretação correta.

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