Leia o fragmento, abaixo transcrito, da obra Vidas
Secas e responda à questão a seguir.
Vivia longe dos homens, só se dava bem com
animais. Os seus pés duros quebravam espinhos
e não sentiam a quentura da terra. Montado
confundia-se com o cavalo, grudava-se a ele. E
falava uma linguagem cantada, monossilábica e
gutural, que o companheiro entendia. Apé, não
se aguentava bem. Pendia para um lado, para o
outro lado, cambaio, torto e feio. Às vezes,
utilizava nas relações com as pessoas a mesma
língua com que se dirigia aos brutos –
exclamações, onomatopeias. Na verdade falava
pouco. Admira as palavras compridas e difíceis
da gente da cidade, tentava reproduzir algumas
em vão, mas sabia que elas eram inúteis e talvez
perigosas. (Graciliano Ramos).
Tomando-se como referência a leitura completa
da obra e a leitura do texto acima, marque V ou F,
conforme sejam verdadeiras ou falsas as
afirmativas.
( ) Adescrição do personagem revela o contraste
entre o mundo cultural e o mundo físico e faz
referência ao modo como o personagem utiliza a
linguagem, indicando assim o seu distanciamento
do mundo animal.
( ) Ao longo da narrativa, as personagens
humanas, em razão da seca, da fome, da miséria
e das injustiças sociais, animalizam-se; em
contrapartida, os bichos humanizam-se. Exemplo
disso é a cena descrita da morte de Baleia.
( ) A relação do personagem com a linguagem é
descrita de tal modo que se pode inferir que a
limitação de horizonte e a vida miserável que
levam conduzem não só o pai, mas a família ao
silêncio; eles não têm sequer recursos verbais
para discutir qualquer tipo de ofensa ou
humilhação a que eram submetidos.
( ) O autor descreve a realidade a partir da visão
amarga do sertanejo, associando a psicologia das
personagens com as condições naturais e sociais em que estão inseridas. Por essa razão, eles
mergulham em um mundo silencioso onde
encontram a felicidade plena a partir da fantasia.
( ) Infere-se da leitura que a família de retirantes
vive numa espécie de mudez introspectiva,
em precárias condições físicas e num estado
degradante de condição humana.
A alternativa que contém a sequência correta, de
cima para baixo, é a
Gabarito comentado
Tema central: Interpretação de texto e análise semântica de enunciados. A questão explora a compreensão de sentidos implícitos e explícitos na obra “Vidas Secas”, exigindo atenção ao nível de linguagem, à relação entre cultura e natureza e à condição humana dos personagens.
Justificativa da alternativa correta (C – F V V F V):
(1ª) Falsa. O enunciado sugere o distanciamento do mundo animal, mas o texto mostra o contrário: o personagem comunica-se por meio de “linguagem gutural”, similar ao animal, o que aproxima, e não afasta, do mundo natural.
(2ª) Verdadeira. A narrativa mostra a animalização dos humanos (seca, miséria) e a humanização dos bichos, como na morte de Baleia, descrita com sentimentos e sonhos. Esse recurso expressa a inversão de papéis, reforçando a desumanização gerada pela adversidade social.
(3ª) Verdadeira. O trecho “falava pouco” e a limitação da linguagem são reflexos da condição miserável, que conduz toda a família ao silêncio e à ausência de recursos verbais, impossibilitando reação a humilhações. Segundo Bechara, a linguagem exprime o universo do falante; aqui, o universo é restrito.
(4ª) Falsa. O texto destaca a influência das condições naturais e sociais na psicologia do personagem, porém não há felicidade plena por meio da fantasia. A narrativa é marcada por resignação, não por escape idealista.
(5ª) Verdadeira. A família é retratada em “mudez introspectiva”, vivendo em condições precárias e degradantes, conforme destacado por estudiosos como Cunha & Cintra, que indicam a introspecção como reflexo do meio adverso.
Análise das alternativas incorretas:
- Falso: Afirma o oposto do texto (aproximação do animal, não distanciamento).
- Falso: Supõe felicidade plena (não há na obra – cuidado com afirmações absolutas!).
Estratégias para próximas provas: Procure relacionar elementos do texto à experiência da obra completa, identificar palavras-chave (“semanticamente próximas de animalização ou silêncio”) e desconfie de absolutismos (“felicidade plena”, “nunca”, “sempre”) nas afirmativas.
Referência teórica: Cunha & Cintra, Bechara, e o princípio de coerência textual (Koch e Elias) fundamentam o raciocínio.
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