A porta aberta, ele percebe – saiu de casa e deixou uma fresta de pista. Com certeza
pegou o elevador para descer os dezenove andares, o que ele sabe fazer. Não, o porteiro
não viu [...]. O prédio, sinal dos tempos, ainda não tinha as grades altas com pontas
agudas e as câmeras de segurança e os fios elétricos desencapados que pouco depois
fechariam aquele pátio generoso e inteiro aberto, [...] Teria de achar a palavra certa para
explicar, as pessoas não sabem – talvez dizer “você viu meu filho? Ele é um menino com
problema”, ou “ele é meio bobo”; ou, ele é “deficiente mental”, e tudo aquilo não
corresponde nem ao filho nem ao que ele quer dizer para definir seu filho; ele é uma
criança carinhosa mas meio tontinho, talvez assim ficasse melhor: não pode dizer
“mongoloide”, que dói, nem “síndrome de Down” – naquela década de 1980, ninguém
sabe o que é isso.
TEZZA, Cristovão. O filho eterno. Rio de Janeiro: Record, 2013. p.163-164.
O fragmento evidencia uma temática que perpassa o livro O filho eterno, que é
Gabarito comentado
Gabarito comentado – Interpretação de Texto
Tema central da questão:
Esta é uma questão de interpretação de texto, que exige a análise dos temas e intenções do fragmento apresentado. O candidato precisa compreender não apenas o conteúdo literal, mas também aquilo que está implícito e as dificuldades do personagem relacionadas à linguagem.
Justificativa da alternativa correta (A):
A alternativa A) a insuficiência da linguagem é a correta. O trecho explora a dificuldade do narrador em encontrar palavras que expressem de modo preciso quem é seu filho. Ele testa expressões como “meu filho tem problema”, “meio bobo”, “deficiente mental” e percebe que nenhuma traduz, de fato, o que sente e pensa. Por fim, ainda sente que a terminologia da época (“mongoloide”, “síndrome de Down”) não satisfaz. Isso evidencia a limitação da língua para captar realidades e sentimentos complexos, um ponto central da obra. Segundo Koch (2013), “há sempre um hiato entre o mundo interior do sujeito e os recursos objetivos da linguagem”.
Análise das alternativas incorretas:
B) a vergonha que sente do filho.
Incorreta. Apesar de possíveis conflitos internos do pai na obra, o recorte não menciona vergonha. O texto mostra busca por palavras, não constrangimento explícito.
C) a insensibilidade das pessoas.
Incorreta. A insensibilidade social pode surgir em outros pontos do livro, mas neste momento, o foco está no dilema pessoal de expressão do narrador, não nas reações de terceiros.
D) o desejo da morte do filho.
Incorreta. A alternativa destoa totalmente do texto: em nenhum momento o trecho sugere esse tipo de desejo. Não há respaldo algum no fragmento.
Dicas para interpretar esse tipo de questão:
Busque sempre palavras-chave ou frases que revelem qual é o conflito central do personagem ou do narrador. Atenção às opções que exageram interpretações ou trazem juízos morais não apoiados pelo texto. Para temas como linguagem, observe quando o personagem tenta – sem sucesso – nomear sentimentos ou situações. Esse é um clássico caso em que a coerência do texto revela o que está nas entrelinhas.
Referências úteis: Bechara (2002); Cunha & Cintra (2013); Koch (2013). Ler obras de referência auxilia a entender como a linguagem pode ser vista como limitada diante de experiências humanas profundas.
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