Questão cfceec1a-ed
Prova:
Disciplina:
Assunto:
Quanto ao gênero do texto, trata-se de:
Quanto ao gênero do texto, trata-se de:
Leia o texto a seguir e responda à questão:
Muitas regras, poucos direitos
Há um princípio político que nos leva a acreditar que as lutas políticas caminham
necessariamente para a institucionalização de direitos adquiridos. Assim, lutamos para ter
direitos reconhecidos pelo ordenamento jurídico. Como resultado desse princípio, cada vez
mais a vida social fica institucionalizada e regulada por cláusulas que visam dar voz ao direito
dos grupos, até então, profundamente vulneráveis.
Esse princípio funcionou para a ampliação de direitos em relação às minorias étnicas,
religiosas e sexuais. Ou seja, nestes casos, eram demandas direcionadas ao Estado como
ator capaz de garantir a universalização real das condições de liberdade exigidas por
seus cidadãos. É inegável que tal processo foi e ainda é importante, mas ele poderia
ser radicalizado. No entanto, tal radicalização não passa por um aprofundamento
dos mecanismos de institucionalização. Ela passa, ao contrário, por uma profunda
desinstitucionalização.
Quando alguém levanta tal ideia, alguns acabam por ver nela uma forma insidiosa de
liberalismo. Ou seja, tudo se passa como se estivéssemos diante de uma aplicação do velho
mantra: quanto menos Estado melhor. Nesse sentido, desinstitucionalizar significaria deixar
a sociedade livre para criar formas de vida, fechando os olhos para experiências de opressão
e de vulnerabilidade. Dessa forma, liberais radicais defendem, por exemplo, o direito de uma
mulher alugar seu útero, procedimento conhecido como “barriga de aluguel”. Eles afirmam
que o Estado não deveria intervir no conteúdo do que sujeitos decidem colocar em relações
de contrato, especialmente se ele passa pelo corpo próprio.
Um contraargumento lembraria que a experiência concreta de alugar o útero é feita,
normalmente, por mulheres em extrema pobreza e que praticamente ninguém passa por
tal experiência se não estiver em grande vulnerabilidade econômica. Desinstitucionalizar
tal “possibilidade de escolha” seria permitir e legitimar a pior de todas as espoliações
econômicas.
O argumento é válido. Por isso, poderíamos pensar uma versão de políticas de
desinstitucionalização distinta de sua versão liberal. Ela passa pelo retraimento das legislações
sobre costumes, família e autodeterminação, e pelo fortalecimento da sensibilidade jurídica
contra processos de espoliação. Em outras ocasiões, sugeri dois exemplos. Um ligado à
desinstitucionalização do casamento.
Processo no interior do qual o Estado deixa de legislar sobre a forma do matrimônio,
guardando-se para legislar única e exclusivamente sobre as relações econômicas entre casais ou outras formas de “agrupamentos afetivos”. Esta seria uma maneira de radicalizar o
princípio de abertura do casamento a modelos não ligados à família heterossexual burguesa.
Em vez de ampliar a lei para casos que ela não contemplava (como os homossexuais),
deveríamos simplesmente eliminar a lei, conservando apenas os dispositivos ligados a
problemas econômicos (pensão, obrigações financeiras) e guarda de filhos.
Outro exemplo concerne às legislações sobre porte de signos religiosos, como burcas e véus.
Em vez de entrar no guarda-roupa de seus cidadãos e decidir o que eles não devem vestir,
o Estado deveria simplesmente garantir a liberdade de ninguém, a partir de certa idade,
portar o que não quer (o que leva em conta até mesmo uniformes escolares impostos a
adolescentes). Ou seja, no lugar de institucionalizar hábitos, como as vestimentas, por meio
do discurso de que há roupas mais opressivas que outras, o Estado simplesmente sai, por
exemplo, das discussões surreais sobre o significado de uma burca e contenta-se em garantir
um quadro formal de liberdade.
Esses processos de desinstitucionalização permitem às sociedades caminharem
paulatinamente para um estado de indiferença em relação a questões culturais e de
costumes. Pois questões culturais sempre serão espaços de afirmação da multiplicidade de
identidades. Mas a política deve, no horizonte, se descolar dessa afirmação. Por mais que
isso possa parecer contraintuitivo, a verdadeira política está sempre para além da afirmação
das identidades. O que pode soar estranho para alguns, mas parece-me uma proposição
necessária. (Vladimir Safatle, Carta Capital n. 768, ano XIX, 2/10/2013, p. 39).
Leia o texto a seguir e responda à questão:
Muitas regras, poucos direitos
Há um princípio político que nos leva a acreditar que as lutas políticas caminham
necessariamente para a institucionalização de direitos adquiridos. Assim, lutamos para ter
direitos reconhecidos pelo ordenamento jurídico. Como resultado desse princípio, cada vez
mais a vida social fica institucionalizada e regulada por cláusulas que visam dar voz ao direito
dos grupos, até então, profundamente vulneráveis.
Esse princípio funcionou para a ampliação de direitos em relação às minorias étnicas,
religiosas e sexuais. Ou seja, nestes casos, eram demandas direcionadas ao Estado como
ator capaz de garantir a universalização real das condições de liberdade exigidas por
seus cidadãos. É inegável que tal processo foi e ainda é importante, mas ele poderia
ser radicalizado. No entanto, tal radicalização não passa por um aprofundamento
dos mecanismos de institucionalização. Ela passa, ao contrário, por uma profunda
desinstitucionalização.
Quando alguém levanta tal ideia, alguns acabam por ver nela uma forma insidiosa de
liberalismo. Ou seja, tudo se passa como se estivéssemos diante de uma aplicação do velho
mantra: quanto menos Estado melhor. Nesse sentido, desinstitucionalizar significaria deixar
a sociedade livre para criar formas de vida, fechando os olhos para experiências de opressão
e de vulnerabilidade. Dessa forma, liberais radicais defendem, por exemplo, o direito de uma
mulher alugar seu útero, procedimento conhecido como “barriga de aluguel”. Eles afirmam
que o Estado não deveria intervir no conteúdo do que sujeitos decidem colocar em relações
de contrato, especialmente se ele passa pelo corpo próprio.
Um contraargumento lembraria que a experiência concreta de alugar o útero é feita,
normalmente, por mulheres em extrema pobreza e que praticamente ninguém passa por
tal experiência se não estiver em grande vulnerabilidade econômica. Desinstitucionalizar
tal “possibilidade de escolha” seria permitir e legitimar a pior de todas as espoliações
econômicas.
O argumento é válido. Por isso, poderíamos pensar uma versão de políticas de
desinstitucionalização distinta de sua versão liberal. Ela passa pelo retraimento das legislações
sobre costumes, família e autodeterminação, e pelo fortalecimento da sensibilidade jurídica
contra processos de espoliação. Em outras ocasiões, sugeri dois exemplos. Um ligado à
desinstitucionalização do casamento.
Processo no interior do qual o Estado deixa de legislar sobre a forma do matrimônio,
guardando-se para legislar única e exclusivamente sobre as relações econômicas entre casais ou outras formas de “agrupamentos afetivos”. Esta seria uma maneira de radicalizar o
princípio de abertura do casamento a modelos não ligados à família heterossexual burguesa.
Em vez de ampliar a lei para casos que ela não contemplava (como os homossexuais),
deveríamos simplesmente eliminar a lei, conservando apenas os dispositivos ligados a
problemas econômicos (pensão, obrigações financeiras) e guarda de filhos.
Outro exemplo concerne às legislações sobre porte de signos religiosos, como burcas e véus.
Em vez de entrar no guarda-roupa de seus cidadãos e decidir o que eles não devem vestir,
o Estado deveria simplesmente garantir a liberdade de ninguém, a partir de certa idade,
portar o que não quer (o que leva em conta até mesmo uniformes escolares impostos a
adolescentes). Ou seja, no lugar de institucionalizar hábitos, como as vestimentas, por meio
do discurso de que há roupas mais opressivas que outras, o Estado simplesmente sai, por
exemplo, das discussões surreais sobre o significado de uma burca e contenta-se em garantir
um quadro formal de liberdade.
Esses processos de desinstitucionalização permitem às sociedades caminharem
paulatinamente para um estado de indiferença em relação a questões culturais e de
costumes. Pois questões culturais sempre serão espaços de afirmação da multiplicidade de
identidades. Mas a política deve, no horizonte, se descolar dessa afirmação. Por mais que
isso possa parecer contraintuitivo, a verdadeira política está sempre para além da afirmação
das identidades. O que pode soar estranho para alguns, mas parece-me uma proposição
necessária. (Vladimir Safatle, Carta Capital n. 768, ano XIX, 2/10/2013, p. 39).
A
Um artigo argumentativo no qual o autor constrói seu raciocínio a partir de conhecimentos
extraídos da Política, da Filosofia e do Direito.
B
Uma resenha de cunho jurídico na qual o autor explana um assunto da história das
mentalidades, sob perspectiva notadamente acadêmica.
C
Um ensaio filosófico no qual o autor exercita uma atividade crítica, repudiando o
autoritarismo do pensamento do Direito.
D
Uma crítica reflexiva cujo objetivo é guiar o leitor à melhor compreensão e avaliação do que
seja a Filosofia do Direito.
E
Uma crônica filosófica na qual prevalece o poder de recriação da realidade (por parte do
autor) sobre o de mera transcrição.