Ao respeitável público
Chegou meu dia.Todo cronista tem seu dia em que não tendo nada a escrever, fala da falta
de assunto. Chegou meu dia. Que bela tarde para não escrever!
Esse calor que arrasa tudo; esse carnaval que está perto, que aí vem no fim da semana;
esses jornais lidos e relidos na minha mesa, sem nada interessante; esse cigarro que fumo
sem prazer; essas cartas na gaveta onde ninguém me conta nada que possa me fazer mal
ou bem; essa perspectiva morna do dia de amanhã; essa lembrança aborrecida do dia de
ontem; e outra vez, e sempre, esse calor, esse calor, esse calor...
Portanto, meu distinto leitor, portanto, minha encantadora leitora, queiram ter a fineza de
retirar os olhos dessa coluna. Não leiam mais. Fiquem sabendo que eu secretamente os
odeio a todos; que vocês todos são pessoas aborrecidas e irritantes; que eu desejo sinceramente que todos tenham péssimo carnaval, uma horrível quaresma, um infelicíssimo
ano de 1934, uma vida toda atrapalhada, uma morte estúpida!.
(BRAGA, Rubem 1980 Literatura Comentada. São Paulo: Abril Educação, 1980, p.13)
Todas as afirmativas se referem ao titulo do texto, exceto:
Ao respeitável público
Chegou meu dia.Todo cronista tem seu dia em que não tendo nada a escrever, fala da falta de assunto. Chegou meu dia. Que bela tarde para não escrever! Esse calor que arrasa tudo; esse carnaval que está perto, que aí vem no fim da semana; esses jornais lidos e relidos na minha mesa, sem nada interessante; esse cigarro que fumo sem prazer; essas cartas na gaveta onde ninguém me conta nada que possa me fazer mal ou bem; essa perspectiva morna do dia de amanhã; essa lembrança aborrecida do dia de ontem; e outra vez, e sempre, esse calor, esse calor, esse calor... Portanto, meu distinto leitor, portanto, minha encantadora leitora, queiram ter a fineza de retirar os olhos dessa coluna. Não leiam mais. Fiquem sabendo que eu secretamente os odeio a todos; que vocês todos são pessoas aborrecidas e irritantes; que eu desejo sinceramente que todos tenham péssimo carnaval, uma horrível quaresma, um infelicíssimo ano de 1934, uma vida toda atrapalhada, uma morte estúpida!.
(BRAGA, Rubem 1980 Literatura Comentada. São Paulo: Abril Educação, 1980, p.13)
Todas as afirmativas se referem ao titulo do texto, exceto:
Gabarito comentado
Comentário do Gabarito – Questão de Interpretação de Texto
Tema central: A questão explora interpretação de texto, com foco no entendimento da ironia e da intenção comunicativa do cronista ao usar o título “Ao respeitável público”. Essa análise exige a capacidade de perceber descompassos entre sentido literal e sentido contextual, além de identificar figuras de linguagem como a ironia.
Justificativa da alternativa correta (C):
A alternativa C é a incorreta, pois afirma: “O título faz referência ao respeito que o cronista tem pelo público, ao interlocutor ao qual se dirige.” Pela norma-padrão e pela análise semântica, essa leitura desconsidera o uso de ironia feito pelo autor. O título “Ao respeitável público” simula cortesia e respeito, mas no decorrer do texto, Rubem Braga dirige-se ao leitor de modo sarcástico e até agressivo, desejando-lhe coisas negativas e revelando desprezo: “Fiquem sabendo que eu secretamente os odeio a todos...” Segundo Bechara (Moderna Gramática Portuguesa), a ironia consiste justamente em afirmar, de modo aparente, o oposto do que se deseja comunicar, criando um efeito crítico ou humorístico.
Análise das alternativas incorretas:
A) Correta. A expressão “respeitável público” é, de fato, típica dos pregões circenses, tratando a plateia como digna de respeito.
B) Correta. O texto coloca o leitor em posição de plateia, e o cronista, como “espetáculo” — leitura coerente.
D) Correta. O tratamento ao leitor, apesar de inicialmente formal, transborda informalidade e sarcasmo ao longo do texto, rompendo com expectativas.
Elementos centrais para acertar a questão:
- Perceba o tom irônico do narrador ao longo do texto.
- Avalie o efeito da escolha das palavras (ex: "secretamente os odeio a todos").
Dica de ouro: Sempre questione se o título reflete o conteúdo real do texto. Quando houver indícios de sarcasmo, desconfie de leituras literais. Atenção a expressões de cortesia empregadas em contextos de crítica ou humor: são pistas de ironia!
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