Texto VI: base para a questão.

Que pode uma criatura senão,

entre criaturas, amar?

amar e esquecer,

amar e malamar,

amar, desamar, amar?

Sempre, e até de olhos vidrados, amar?

[...]

Amar solenemente as palmas do deserto,

o que é entrega ou adoração expectante,

e amar o inóspito, o áspero,

um vaso sem flor um chão de ferro,

e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.

[...]

Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa

amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.

(Carlos Drummond de Andrade)

Considere as seguintes afirmações sobre esse texto:

I - A leitura desses versos permite afirmar que, para o poeta, o homem não pode fugir ao amor, ainda que isto signifique sofrimento apenas.

II - Os trechos "um vaso sem flor, um chão de ferro" e "amar o inóspito, o áspero" podem ser entendidos como possibilidade de se relativizar as expectativas habituais que temos em relação ao assunto tratado no poema.

III - A presença de versos livres e de neologismos indica traços da poética modernista.

Está(ao) correto(s) o(s) item(ns):

Gabarito: E

Tema central: A questão explora interpretação de texto poético, figuras de linguagem e características do Modernismo brasileiro, exigindo do candidato a identificação de sentidos implícitos e de traços estilísticos próprios da poesia modernista.

Item I – Correto: O texto sugere, de modo recorrente, que o ato de amar é condição inevitável para o ser humano, mesmo com possíveis desilusões ou sofrimentos. Repare em versos como “amar e esquecer, amar e malamar, amar, desamar, amar?”: o predomínio do verbo, repetido — ora sozinho, ora acompanhado de palavras de sentido negativo — mostra que o amor está sempre presente, mesmo que venha acompanhado de frustração ou dor. Essa leitura envolve a análise do sentido predominante do poema, indo além do explícito.

Item II – Correto: Os fragmentos “amar o inóspito, o áspero” e “um vaso sem flor, um chão de ferro” simbolizam o deslocamento das expectativas usuais: ao invés do amor idealizado e belo, surge a aceitação do amor em contextos difíceis, adversos, aquilo que normalmente não seria amado. Essa é uma interpretação inferencial: o leitor percebe que o poeta propõe ampliar o olhar sobre o amor — inclusive para o que parece árido ou improvável. Trata-se aqui de analisar símbolos textuais e reconhecer as propostas de sentido do autor.

Item III – Correto: O poema apresenta versos livres (ausência de métrica e rima fixas) e neologismo (“malamar”), ambos característicos da poética modernista. Segundo autores como Evanildo Bechara e Celso Cunha & Lindley Cintra, estas são marcas da busca por inovação e ruptura próprias do Modernismo, destacando-se a liberdade formal e a criação lexical.

Análise das alternativas: As opções A, B, C e D erram ao eliminar itens corretos. Só a alternativa E reconhece corretamente a veracidade dos três itens — leitura global e detalhada do poema é fundamental!

Dicas para provas: Fique atento a termos generalizantes (“sempre”, “apenas”), à análise do contexto poético e aos traços formais. No Modernismo, por exemplo, versos livres e neologismos são “cartões de visita” do movimento.

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