Questão b1db75a2-05
Prova:CESMAC 2018
Disciplina:Português
Assunto:Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

A crônica de Lya Luft trata de tema culturalmente relevante, pois aborda:

Nós, os brasileiros.


    Uma editora europeia me pede que traduza poemas de autores estrangeiros sobre o Brasil.

    Como sempre, eles falam da floresta amazônica, uma floresta muito pouco real, aliás. Um bosque poético, com “mulheres de corpos alvíssimos espreitando entre os troncos das árvores e olhos de serpentes hirtas acariciando esses corpos como dedos amorosos”. Não faltam flores azuis, rios cristalinos e tigres mágicos. Traduzo os poemas por dever de ofício, mas com uma secreta – e nunca realizada – vontade de inserir ali um grãozinho de realidade.

     Nas minhas idas ao Exterior, onde convivi, sobretudo com escritores, professores e estudantes universitários – portanto, gente razoavelmente culta –, fui invariavelmente surpreendida com a profunda ignorância a respeito de quem, como e o que somos.

    – A senhora é brasileira? Comentaram espantados alunos de uma Universidade americana famosa: – Mas a senhora é loira!

     Depois de ler, num Congresso de escritores em Amsterdã, um trecho de um de meus romances traduzidos em inglês, ouvi de um senhor, dono de um antiquário famoso, que segurou comovido minhas duas mãos:

     – Que maravilha! Nunca imaginei que no Brasil houvesse pessoas cultas!

     Pior ainda, no Canadá, alguém exclamou incrédulo:

     – Escritora brasileira? Ué, mas no Brasil existem editoras?

    A culminância foi a observação de uma crítica berlinense, num artigo sobre um romance meu editado por lá, acrescentando, a alguns elogios, a grave restrição: “porém não parece livro brasileiro, pois não fala nem de plantas, nem de índios, nem de bichos.”

   Diante dos três poemas sobre o Brasil, esquisitos para qualquer brasileiro, pensei mais uma vez que esse desconhecimento não se deve apenas à natural alienação estrangeira quanto ao geograficamente fora de seus interesses, mas também é culpa nossa. Pois o que mais exportamos de nós é o exótico e o folclórico.

    Em uma feira do livro de Frankfurt, no espaço brasileiro, o que se via eram livros (não muito bem arrumados), muita caipirinha na mesa, e televisões mostrando carnaval, futebol, praias e ... matos.

    E eu, mulher essencialmente urbana, escritora das geografias interiores de meus personagens neuróticos, me senti tão deslocada quanto um macaco em uma loja de cristais. Mesmo que tentasse explicar, ninguém acreditaria que eu era tão brasileira quanto qualquer negra de origem africana vendendo acarajé nas ruas de Salvador. Porque o Brasil é tudo isso.

    E nem a cor de meu cabelo e olhos, nem meu sobrenome, nem os livros que li na infância, nem o idioma que falei naquele tempo, além do português, me fazem menos nascida e vivida nesta terra de tão surpreendentes misturas: imensa, desaproveitada, instigante e (por que ter medo da palavra?) maravilhosa!


(Lya Luft. Pensar é transgredir. Rio de Janeiro: Record, 2009, p. 49-51) 

A
as experiências peculiares à vida de escritores brasileiros em visita a outros países.
B
as representações fantasiosas com que dados da realidade brasileira são conceituados lá fora.
C
a imagem idealizada das instituições de ensino superior brasileiras e de seus respectivos editores.
D
traços da produção literária de autores brasileiros que se esmeram em revelar as riquezas do Brasil.
E
a habitual preferência de escritores nacionais por divulgar obras poéticas estrangeiras sobre o Brasil.

Gabarito comentado

T
Thiago Martins Monitor do Qconcursos

Gabarito: B

Tema central: Interpretação de Texto. Esta questão explora a habilidade de compreender ideias globais e implícitas, focando em como a realidade brasileira é vista sob ótica estrangeira.

Comentário da alternativa correta (B):

A alternativa B – “as representações fantasiosas com que dados da realidade brasileira são conceituados lá fora” – é a única que traduz com precisão o tema central da crônica. A autora expõe, por exemplos, como o Brasil costuma ser reduzido a “florestas exóticas”, “mulheres misteriosas” e “tigres mágicos” por estrangeiros, evidenciando distorções, estereótipos e generalizações impostos à imagem nacional. Segundo as gramáticas de Evanildo Bechara e Koch & Elias, interpretar bem um texto é identificar o propósito comunicativo do autor e suas críticas implícitas, comparando significados explícitos e subentendidos.

Ao longo da crônica, Lya Luft exemplifica essas distorções ao relatar episódios de surpresa quanto à sua aparência, cultura e existência de editoras e escritores. Também aponta autocrítica: o Brasil mesmo colabora com essa imagem ao exportar o “exótico e folclórico”.

Análise das alternativas incorretas:

A) Cita experiências pessoais, mas não é sobre as “peculiaridades” da vida de escritores, e sim sobre a imagem deturpada do Brasil.

C) Não há foco nas instituições de ensino superior brasileiras ou editores nacionais. O texto relata visões estrangeiras sobre o Brasil.

D) Não trata dos autores brasileiros se “esmerando” em revelar riquezas nacionais, mas sim das imagens que vêm de fora.

E) Não discute a preferência dos escritores nacionais por divulgar obras estrangeiras, mas as visões externas importadas do Brasil.

Dicas de prova: Atenção à ideia principal. Se houver exemplos pessoais, veja se o propósito maior é individual ou coletivo. Busque sempre palavras-chave e críticas do autor para não cair em pegadinhas de alternativas aparentemente concretas, mas deslocadas do tema central.

Resumindo: a alternativa B foi escolhida pela clareza com que traduz o sentido global e a crítica do autor, ensinando a interligar exemplos a argumentos principais, conforme indicado por Cunha & Cintra e Koch.

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