No texto, o poeta
Remissão
Tua memória, pasto de poesia,
tua poesia, pasto dos vulgares,
vão se engastando numa coisa fria
a que tu chamas: vida, e seus pesares.
Mas, pesares de quê? perguntaria,
se esse travo de angústia nos cantares,
se o que dorme na base da elegia
vai correndo e secando pelos ares,
e nada resta, mesmo, do que escreves
e te forçou ao exílio das palavras,
senão contentamento de escrever,
enquanto o tempo, em suas formas breves
ou longas, que sutil interpretavas,
se evapora no fundo de teu ser?
Carlos Drummond de Andrade, Claro enigma.
Remissão
Tua memória, pasto de poesia,
tua poesia, pasto dos vulgares,
vão se engastando numa coisa fria
a que tu chamas: vida, e seus pesares.
Mas, pesares de quê? perguntaria,
se esse travo de angústia nos cantares,
se o que dorme na base da elegia
vai correndo e secando pelos ares,
e nada resta, mesmo, do que escreves
e te forçou ao exílio das palavras,
senão contentamento de escrever,
enquanto o tempo, em suas formas breves
ou longas, que sutil interpretavas,
se evapora no fundo de teu ser?
Carlos Drummond de Andrade, Claro enigma.
Gabarito comentado
Comentário da Questão – Interpretação de Texto
Tema central: Esta questão aborda interpretação de texto, mais especificamente o reconhecimento do uso da metalinguagem na produção poética. Exige análise da intenção do eu-lírico e dos elementos implícitos do poema de Carlos Drummond de Andrade.
Alternativa correta – A:
Justificativa: O poeta questiona incisivamente o seu fazer poético, refletindo sobre o sentido e a utilidade de sua própria poesia. Essa característica é evidente nas passagens “tua memória, pasto de poesia”, “tua poesia, pasto dos vulgares” e ao mencionar “vida, e seus pesares”, mostrando um olhar crítico e até desencantado sobre o papel da poesia e sobre o motivo de escrevê-la.
Esse tipo de questionamento é chamado de metalinguagem, conceito destacado, por exemplo, por Evanildo Bechara em sua gramática: "A metalinguagem ocorre quando a linguagem fala de si própria." O poeta volta-se para seu próprio texto e expõe dúvidas e incômodos quanto ao fazer literário. A alternativa A traduz fielmente esse movimento autorreflexivo.
Análise das alternativas incorretas:
B) Não há interpelação direta ao leitor; o poema é introspectivo, centrado no próprio sujeito poético.
C) Não há invocação do pai morto nem referência à busca de redenção familiar ou pessoal.
D) A memória de Mário de Andrade ou dedicatória não aparece no texto; trata-se de uma leitura equivocada do destinatário do poema.
E) Não há diálogo com escritor classicista ou figura imaginária; a reflexão é interna, e não voltada a outro personagem.
Estratégia para questões desse tipo: Fique atento a palavras e construções que denunciem introspecção e autorreflexão. O uso de perguntas e de expressões como “o que resta do que escreves” é um forte indício de questionamento sobre o próprio fazer poético.
Resumo: A correta é A porque revela o aspecto metalinguístico e crítico do eu-lírico em relação à escrita, conforme defendem gramáticos como Cunha & Cintra e Bechara em suas obras.
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