Questão a733a531-70
Prova:UPE 2021
Disciplina:Português
Assunto:Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

Não apenas os textos literários se materializam em gêneros. Na verdade, hoje há um consenso de que qualquer texto se organiza em um gênero. Outro consenso é o de que o que define um gênero textual é menos o conjunto de suas características formais, e mais a sua função social. Isso porque todo texto é escrito (ou falado) com um propósito comunicativo. Considerando esse propósito, é CORRETO afirmar que

Os Textos 1, 2, 3 e 4 servem de base para a questão.

Texto 1
Anjo — Esta é; que demandais?
Fildalgo — Que me deixeis embarcar;
 sou fidalgo de solar,
 é bem que me recolhais.
Anjo — Não se embarca tirania
 neste batel divinal.
Fildalgo — Não sei por que haveis por mal
 que entre a minha senhoria.
Anjo — Para vossa fantasia
 mui pequena é esta barca.
Fildalgo — Para senhor de tal marca
 Não há aqui mais cortesia?

VICENTE, Gil. ―Auto da Barca do Inferno‖. In:______. Autos e farsas de Gil Vicente. São Paulo: Melhoramentos, 2012. Excertos.

Texto 2

Canto I

As armas e os Barões assinalados
Que, da Ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca de antes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;

E também as memórias gloriosas
Daqueles Reis que foram dilatando
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando,
E aqueles que por obras valerosas
Se vão da lei da Morte libertando:
Cantando espalharei por toda parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte.

CAMÕES, Luís de. Os Lusíadas. São Paulo: Martin Claret, 2001. Excertos.


Texto 3

Rompe o poeta com a primeira impaciência querendo declarar-se e temendo perder por ousado

Anjo no nome, Angélica na cara!
Isso é ser flor, e Anjo juntamente:
Ser Angélica flor, e Anjo florente,
Em quem, senão em vós, se uniformara:

Quem vira uma tal flor, que a não cortara,
Do verde pé, da rama fluorescente;
E quem um Anjo vira tão luzente,
Que por seu Deus o não idolatrara?

Se pois como Anjo sois dos meus altares,
Fôreis o meu Custódio, e a minha guarda,
Livrara eu de diabólicos azares.

Mas vejo, que por bela, e por galharda,
Posto que os Anjos nunca dão pesares,
Sois Anjo, que me tenta, e não me guarda.

MATOS, Gregório de. Poemas escolhidos. São Paulo: Cultrix, 1997. 

Texto 4
Lira XIX – 1ª parte

Enquanto pasta alegre o manso gado,
Minha bela Marília, nos sentemos
À sombra deste cedro levantado.
 Um pouco meditemos
 Na regular beleza,
Que em tudo quanto vive, nos descobre
 A sábia Natureza.

GONZAGA, Tomás Antônio. Marília de Dirceu. São Paulo: DCD, 2010. Excertos.

A
no Texto 1, o autor pretende representar nosso comportamento em um momento de introspecção, no qual travamos intenso diálogo com nosso 'eu interior‘.
B
no Texto 2, em que o eu lírico se dirige ao Rei, o que o autor pretende é tecer comentários críticos acerca da situação sociopolítica de seu país.
C
o Texto 3 deve ser compreendido, de fato, como uma declaração de amor; mas um amor conflituoso, contra o qual o eu lírico está em luta.
D
com o Texto 4, o autor tenciona retratar o jogo amoroso da conquista; por isso, nele, o eu lírico exalta a beleza da sua amada, visando conseguir seu amor.
E
o Texto 2 foi escrito para expressar a intensa alegria do autor diante da mais gloriosa conquista portuguesa: a de ter descoberto uma nova terra – o Brasil.

Gabarito comentado

J
João NunesMonitor do Qconcursos

Tema central: Interpretação de textos e compreensão de gêneros textuais, com foco na identificação da função social de cada texto apresentado. Questão típica de vestibular, exigindo leitura atenta, associação de elementos e conhecimento literário.

Justificativa da alternativa correta (C):

O Texto 3, de Gregório de Matos, é um soneto barroco em que o eu lírico expressa um amor conflituoso. Ele compara a amada a um anjo e a uma flor, exaltando sua beleza, mas também revela, nos versos finais, o conflito entre desejo e razão (“Sois Anjo, que me tenta, e não me guarda”). Isso revela o dualismo barroco – beleza e pecado –, sendo a declaração amorosa permeada por luta interna.

Pela norma-padrão e pela análise do gênero lírico, está correto afirmar que o poema exprime amor e conflito interno, não sendo apenas declarativo, mas dialético.

Análise das alternativas incorretas:

A) Incorreta. O diálogo entre Anjo e Fidalgo, em Gil Vicente, não é introspectivo, mas um embate entre personagens, simbolizando crítica social e moralidade, não um “diálogo com o eu interior”.

B) Incorreta. “Os Lusíadas” exaltam feitos heroicos e não são voltados principalmente para comentários sociopolíticos críticos. O poeta busca narrar glórias, conforme destaca Cunha & Cintra (2013).

D) Incorreta. Gonzaga, em “Marília de Dirceu”, valoriza a simplicidade arcádica e a vida pastoril, mais do que um “jogo de conquista”. Predomina o amor idealizado e bucólico.

E) Incorreta. Erro factual: “Os Lusíadas” têm como foco as viagens à Índia, não a descoberta do Brasil. O texto celebra a expansão marítima em geral.

Estratégias para futuras questões:

Leia atentamente o gênero e a intenção do texto; desconfie de alternativas que simplificam demais (“introspecção”, “alegria com o ‘Brasil’”) ou distorcem o contexto histórico. Atenção especial à palavra-chave de função social e ao que realmente está em destaque no texto.

Referências: Bechara (2009), Cunha & Cintra (2013), Bosi (1994).

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