Questão 9232e96b-02
Prova:UNIFOA 2018
Disciplina:Português
Assunto:Interpretação de Textos, Uso das aspas, Pontuação, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

Ao longo do TEXTO, encontramos diversos trechos entre aspas, tais como “espírito de combate da tropa”, “fazer o debate” e “alguns papelotes de cocaína”. Esses trechos têm por objetivo:

A indiferença com a violência nas favelas do Rio de Janeiro

O silêncio de autoridades e instituições revela o fatalismo de uma política de segurança pública falida

Marcelo Baumann Burgo

 

A rotina de tiroteios em diversas favelas do Rio de Janeiro tem por cenário um labirinto de casas recheadas de seres humanos, acuados e humilhados. O quadro ultrapassa as raias do absurdo, e nem os escritores do realismo mágico seriam capazes de imaginá-lo.

O que mais surpreende, contudo, é o silêncio condescendente das autoridades e instituições cujo papel deveria ser o de, antes de qualquer outra coisa, zelar pelas garantias mínimas do direito à vida e integridade física dos cidadãos.

            Mas ao que tudo indica, para os moradores das favelas cariocas, nem mesmo esse aspecto elementar do pacto hobbesiano tem sido preservado, o que sugere que, para eles, a lei é a da barbárie. Na favela da Rocinha, por exemplo, desde setembro de 2017, a cada três dias pelo menos uma pessoa – incluindo policiais - morreu nesses confrontos.

O primeiro e mais ensurdecedor silêncio é o do governador e das autoridades da segurança pública estaduais e federais. No máximo, se manifestam quando algum policial é morto no “campo de batalha”, para lamentar sua perda e reafirmar o “espírito de combate da tropa”.

Diante desse silêncio deliberado, ficam no ar várias perguntas: como explicar o sentido de uma política de segurança que tem como efeito real a tortura diária da população das favelas, que se vê obrigada a conviver com um fogo cruzado intenso e aleatório? Quem realmente responde por ela, e pelas mortes e sofrimento que ela provoca? Onde se pretende chegar com isso? Quais as suas razões “técnicas”, se é que não é uma ofensa às vítimas formular essa pergunta? SILÊNCIO...

Sob esse primeiro vácuo de respostas, há um segundo nível de silêncio, o das instituições que deveriam questionar as autoridades estaduais e federais. Cadê os poderes legislativos, que não criam um grupo suprapartidário de parlamentares para interpelar o governo? Neste caso, não vale alegar que estamos aguardando as próximas eleições para “fazer o debate”, pois o sofrimento é hoje, e a morte espreita diariamente a vida dessa população.

E o Ministério Público, que não organiza uma força-tarefa para, tempestivamente, proteger a ordem jurídica escandalosamente violada, com a agressão de todo tipo aos direitos fundamentais dos cidadãos? SILÊNCIO...

Sob essa segunda e espessa camada de silêncios, subsiste uma terceira igualmente decisiva, a da grande imprensa. Não que ela não faça a crônica diária dos tiroteios, mas em geral as faz descrevendo os fatos com aparente neutralidade, como se eles simplesmente fizessem parte da rotina, não dando sinais, portanto, de que reflete sobre o que significa informar, em uma mesma matéria, que três ou quatro pessoas morreram ou se feriram, e que a operação teve como saldo a apreensão de “um fuzil”, “dez trouxinhas de maconha”, e “alguns papelotes de cocaína”...

Cadê os editoriais cobrando respostas das autoridades? Cadê o trabalho que, em outras áreas da vida pública, por exemplo na questão da corrupção, a grande imprensa faz com tanto zelo para mobilizar a opinião pública? No caso da rotina de tiroteios nas favelas o que parece resultar do trabalho da grande imprensa é o oposto da mobilização, ou seja, um efeito de resignação diante da violência ordinária.

Restaria, ainda, a sociedade civil organizada. Cadê a OAB, CNBB, ABI, as universidades, associações de bairro, e tantas outras que se irmanaram na luta contra a ditadura? Para ser justo com elas, até esboçaram alguma reação, mas sem força para fazer diferença. Com isso, tudo se passa como se esse bangue-bangue diário e estúpido dissesse respeito apenas aos moradores das favelas. Será que devemos esperar que somente eles se mobilizem?

Como se vê, para além de quaisquer outras razões de ordem econômica e social, o que se passa com a (in)segurança nos territórios populares do Rio de Janeiro deve ser creditado, antes de mais nada, aos silêncios e omissões de diferentes autoridades e instituições. Tal postura não deixa de revelar o quadro de fatalismo e perplexidade a que chegamos e não por acaso! Pois não há mesmo muito a se fazer com o modelo atual de segurança pública.

Em face de uma trama social que se torna cada vez mais complexa, a verdade é que não há como insistir com respostas casuísticas, provisórias e crescentemente brutais, que sintomaticamente já não podem prescindir do apoio recorrente das Forças Armadas.

Mas se é assim, que ao menos se reconheça, com honestidade, a necessidade de enfrentarmos um amplo debate sobre a reforma estrutural das instituições de segurança pública, a começar pelas polícias civil e militar. A cada dia, sua incompatibilidade com o projeto de democracia se mostra mais explícita.

O sofrimento de quem convive diariamente sob a tortura da loteria dos tiroteios nos territórios populares não terá como ser reparado, mas ainda não é tarde demais para mobilizarmos energia para esse debate.

No caso do Rio de Janeiro, o mínimo aceitável seria exigir que as autoridades, de um lado, contribuíssem para precipitar esta discussão e, de outro, interrompessem imediatamente a escalada do descalabro que elas vêm chancelando, movidas sabe-se lá por que tipo de cálculo.

 

Adaptado a partir de: https://www.cartacapital.com.br/sociedade/a-indiferenca-com-a-violencia-nasfavelas-do-rio-de-janeiro /. Acesso em 10 de maio de 2018.

A
apresentar citações diretas de autores da área da sociologia e criminologia crítica.
B
apresentar afirmações que são e/ou foram usualmente mencionadas nas situações descritas pelo texto.
C
descrever afirmações do atual governador do estado do Rio de Janeiro em situações de chacina.
D
apresentar trechos de gravações captadas em investigação realizada na polícia do Rio de Janeiro.
E
descrever afirmações das classes populares que explicam o motivo da violência por elas sofrida.

Gabarito comentado

O
Oswaldo Sampaio Monitor do Qconcursos

Comentário do Gabarito – Interpretação e Uso das Aspas no Texto

Tema central: Interpretação de texto, com foco no uso das aspas conforme a norma-padrão da Língua Portuguesa.

As aspas, segundo gramáticas como as de Cunha & Cintra e Bechara, são empregadas para destacar expressões corriqueiras ou citações usuais em determinado contexto, indicando que são palavras frequentemente proferidas por autoridades, imprensa ou outros agentes sociais, muitas vezes com um viés crítico, de distanciamento ou ironia.

No texto, exemplos como "espírito de combate da tropa" e "alguns papelotes de cocaína" não constituem citações literais de pessoas ou documentos, mas sim afirmações constantemente repetidas nos contextos relatados. O emprego das aspas serve para sugerir familiaridade do leitor com essas frases e também provoca reflexão sobre o seu uso automático ou superficial.

A alternativa correta é a B: "apresentar afirmações que são e/ou foram usualmente mencionadas nas situações descritas pelo texto".

Justificativa: O uso das aspas, nesse caso, é para apresentar expressões consagradas pelo uso em tais situações, e não para indicar autoria, gravação ou manifestações específicas de algum grupo. Isso demonstra domínio da técnica interpretativa de perceber como recursos gráficos — como as aspas — contribuem para o sentido e o posicionamento do narrador.

Análise das alternativas incorretas:

A) Errada, pois não há citação direta de autores acadêmicos.
C) Errada, visto que não atribui as frases ao governador especificamente.
D) Errada, sem referência a gravações policiais.
E) Errada, porque as frases não são, necessariamente, das classes populares.

Dica de leitura e interpretação: Sempre que encontrar aspas em textos, questione se o autor busca ironizar, destacar clichês, mostrar citações indiretas ou expressar distanciamento destas afirmações — isso é muito frequente em questões de concursos!

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