Questão 6f8195fd-06
Prova:UNIFESP 2015
Disciplina:Português
Assunto:Interpretação de Textos, Figuras de Linguagem

O eufemismo (do grego euphemismós, que significava “emprego de uma palavra favorável no lugar de uma de mau augúrio”, vocábulo formado de eu, “bem” + femi, “dizer, falar”, designando, pois, “o ato de falar de uma maneira agradável”) é a figura de retórica em que há uma diminuição da intensidade semântica, com a utilização de uma expressão atenuada para dizer alguma coisa desagradável.

(José Luiz Fiorin. Figuras de retórica, 2014. Adaptado.)

Verifica-se a ocorrência desse recurso no seguinte trecho:

Leia o trecho inicial de um artigo do livro Bilhões e bilhões do astrônomo e divulgador científico Carl Sagan (1934-1996) para responder à questão.

O tabuleiro de xadrez persa
    
  Segundo o modo como ouvi pela primeira vez a história, aconteceu na Pérsia antiga. Mas podia ter sido na Índia ou até na China. De qualquer forma, aconteceu há muito tempo. O grão-vizir, o principal conselheiro do rei, tinha inventado um novo jogo. Era jogado com peças móveis sobre um tabuleiro quadrado que consistia em 64 quadrados vermelhos e pretos. A peça mais importante era o rei. A segunda peça mais importante era o grão-vizir – exatamente o que se esperaria de um jogo inventado por um grão-vizir. O objetivo era capturar o rei inimigo e, por isso, o jogo era chamado, em persa, shahmat – shah para rei, mat para morto. Morte ao rei. Em russo, é ainda chamado shakhmat. Expressão que talvez transmita um remanescente sentimento revolucionário. Até em inglês, há um eco desse nome – o lance final é chamado checkmate (xeque-mate). O jogo, claro, é o xadrez. Ao longo do tempo, as peças, seus movimentos, as regras do jogo, tudo evoluiu. Por exemplo, já não existe um grão-vizir – que se metamorfoseou numa rainha, com poderes muito mais terríveis.
    A razão de um rei se deliciar com a invenção de um jogo chamado “Morte ao rei” é um mistério. Mas reza a história que ele ficou tão encantado que mandou o grão-vizir determinar sua própria recompensa por ter criado uma invenção tão magnífica. O grão-vizir tinha a resposta na ponta da língua: era um homem modesto, disse ao xá. Desejava apenas uma recompensa simples. Apontando as oito colunas e as oito filas de quadrados no tabuleiro que tinha inventado, pediu que lhe fosse dado um único grão de trigo no primeiro quadrado, o dobro dessa quantia no segundo, o dobro dessa quantia no terceiro e assim por diante, até que cada quadrado tivesse o seu complemento de trigo. Não, protestou o rei, era uma recompensa demasiado modesta para uma invenção tão importante. Ofereceu joias, dançarinas, palácios. Mas o grão-vizir, com os olhos apropriadamente baixos, recusou todas as ofertas. Só desejava pequenos montes de trigo. Assim, admirando-se secretamente da humildade e comedimento de seu conselheiro, o rei consentiu.
    No entanto, quando o mestre do Celeiro Real começou a contar os grãos, o rei se viu diante de uma surpresa desagradável. O número de grãos começa bem pequeno: 1, 2, 4, 8, 16, 32, 64, 128, 256, 512, 1024... mas quando se chega ao 64o quadrado, o número se torna colossal, esmagador. Na realidade, o número é quase 18,5 quintilhões*. Talvez o grão-vizir estivesse fazendo uma dieta rica em fibras.
    Quanto pesam 18,5 quintilhões de grãos de trigo? Se cada grão tivesse o tamanho de um milímetro, todos os grãos juntos pesariam cerca de 75 bilhões de toneladas métricas, o que é muito mais do que poderia ser armazenado nos celeiros do xá. Na verdade, esse número equivale a cerca de 150 anos da produção de trigo mundial no presente. O relato do que aconteceu a seguir não chegou até nós. Se o rei, inadimplente, culpando-se pela falta de atenção nos seus estudos de aritmética, entregou o reino ao vizir, ou se o último experimentou as aflições de um novo jogo chamado vizirmat, não temos o privilégio de saber.

*1 quintilhão = 1 000 000 000 000 000 000 = 1018. Para se contar esse número a partir de 0 (um número por segundo, dia e noite), seriam necessários 32 bilhões de anos (mais tempo do que a idade do universo).

(Carl Sagan. Bilhões e bilhões, 2008. Adaptado.)

A
“se o último experimentou as aflições de um novo jogo chamado vizirmat” (4º parágrafo).
B
“O número de grãos começa bem pequeno” (3º parágrafo).
C
“pediu que lhe fosse dado um único grão de trigo no primeiro quadrado” (2º parágrafo).
D
“De qualquer forma, aconteceu há muito tempo” (1º parágrafo).
E
“admirando-se secretamente da humildade e comedimento de seu conselheiro” (2º parágrafo).

Gabarito comentado

L
Larissa FernandesMonitor do Qconcursos

Tema central da questão: Figuras de linguagem – Eufemismo

A questão avalia a habilidade de identificar a figura de linguagem chamada eufemismo. Segundo a norma-padrão e autores como Bechara (Moderna Gramática Portuguesa) e Fiorin (Figuras de Retórica), eufemismo consiste em suavizar expressões potencialmente desagradáveis, usando termos mais amenos.

Justificativa da alternativa correta:

A) “se o último experimentou as aflições de um novo jogo chamado vizirmat

Neste trecho, o autor suaviza possíveis consequências graves ao grão-vizir (provavelmente a morte) dizendo apenas que ele “experimentou as aflições de um novo jogo”, sem afirmar diretamente a morte ou punição. Este é o exemplo clássico de eufemismo, substituindo expressão chocante por outra mais branda, conforme destacado no conceito de Fiorin.

Por que as demais alternativas estão erradas?

B) “O número de grãos começa bem pequeno”

Nenhuma informação desagradável está sendo suavizada; trata-se de um dado literal sobre a contagem dos grãos.

C) “pediu que lhe fosse dado um único grão de trigo no primeiro quadrado”

O pedido do grão-vizir é dito de forma objetiva, sem atenuação de sentido.

D) “De qualquer forma, aconteceu há muito tempo”

Expressa apenas uma informação temporal, sem suavização de conteúdo negativo.

E) “admirando-se secretamente da humildade e comedimento de seu conselheiro”

Há um relato direto do pensamento do rei, sem emprego de eufemismo.

Estratégia de interpretação:

Em provas, atente-se sempre ao contexto e à intenção do autor! O eufemismo aparece onde há ocultação suave de fatos desagradáveis. Palavras como “aflições”, “partiu”, “descansou”, quando substituem “castigo” ou “morte”, costumam sinalizar esse recurso.

Resumo: Marque quando o autor ameniza uma dureza — é aí que está o eufemismo.

Gabarito: A

Gostou do comentário? Deixe sua avaliação aqui embaixo!

Estatísticas

Aulas sobre o assunto

Questões para exercitar

Artigos relacionados

Dicas de estudo