Sobre a interpretação do texto, assinale a alternativa
CORRETA.
Opinião não é argumento
Aqui está uma história que pode ser verdadeira no contexto
atual do Brasil. Um jovem professor de Filosofia, instruindo
seus alunos à Filosofia da Religião, introduz, à maneira que a
Filosofia opera há séculos, argumentos favoráveis e contrários
à existência de Deus. Um dos alunos se queixa, para o diretor
e também nas onipresentes redes sociais, de que suas
crenças religiosas estão sendo atacadas. “Eu tenho direito às
minhas crenças”. O diretor concorda com o aluno e força o
professor a desistir de ensinar Filosofia da Religião.
Mas o que é exatamente um “direito às minhas crenças”? [...]
O direito à crença, nesse caso, poderia ser visto como o
“direito evidencial”. Alguém tem um direito evidencial à sua
crença se estiver disposto a fornecer evidências apropriadas
em apoio a ela. Mas o que o estudante e o diretor estão
reivindicando e promovendo não parece ser esse direito, pois
isso implicaria precisamente a necessidade de pôr as
evidencias à prova.
Parece que o estudante está reivindicando outra coisa, um
certo “direito moral” à sua crença, como avaliado pelo filósofo
americano Joel Feinberg, que trabalhou temas da Ética,
Teoria da Ação e Filosofia Política. O estudante está
afirmando que tem o direito moral de acreditar no que quiser,
mesmo em crenças falsas.
Muitas pessoas acham que, se têm um direito moral a uma
crença, todo mundo tem o dever de não as privar dessa
crença, o que envolve não criticá-la, não mostrar que é ilógica
ou que lhe falta apoio evidencial. O problema é que essa é
uma maneira cada vez mais comum de pensar sobre o direito
de acreditar. E as grandes perdedoras são a liberdade de
expressão e a democracia.
[...] A defesa de uma crença está restrita ao uso de métodos
que pertence ao espaço das razões – argumentação e
persuasão, em vez de força. Você tem o direito de avançar
sua crença na arena pública usando os mesmos métodos de
que seus oponentes dispõem para dissuadi-lo.
O pior acontece quando crenças se materializam em opinião,
e são usadas como substitutas de argumentos, quando o “Eu
tenho direito às minhas crenças” se transforma em “Eu tenho
direito à minha opinião”. Crenças e opiniões não são
argumentos. Mais precisamente, crenças diferem de opinião,
que diferem de fatos, que diferem de argumentos. Um fato é
algo que pode ser comprovado verdadeiro. Por exemplo, é um
fato que Júpiter é o maior planeta do sistema solar tanto em
diâmetro quanto em massa. Esse fato pode ser provado pela
observação ou pela consulta a uma fonte fidedigna.
Uma crença é uma ideia ou convicção que alguém aceita
como verdade, como “passar debaixo de uma escada dá
azar”. Isso certamente não pode ser provado (ou pelo menos
nunca foi). Mas a pessoa ainda pode manter sua crença,
como vimos, se não pelo “direito evidencial”, apelando para o
“direito moral”. Ou ainda, pelo mesmo “direito moral”, deixar de
acreditar no que ela própria pensa ser evidência, como no
caso do famoso dito (atribuído a Sancho Pança): “Não creio
em bruxas, ainda que existam”. [...]
Fonte: CARNIELLI, Walter. Página Aberta. In: Revista Veja. Edição 2578, ano 51,
nº 16. São Paulo: Editora Abril, 2018, p. 64 (fragmento adaptado).
Gabarito comentado
Gabarito: B
Tema central: Interpretação de texto, com ênfase em compreensão global e análise do posicionamento das personagens da narrativa. O candidato deve utilizar leitura atenta e identificar informações explícitas no texto para eliminar pegadinhas e generalizações equivocadas.
Análise da alternativa correta (B):
O texto narra que um aluno sente-se desrespeitado ao considerar suas crenças violadas quando um professor expõe temas relativos à Filosofia da Religião. O trecho-chave está em: "Um dos alunos se queixa [...] de que suas crenças religiosas estão sendo atacadas." Portanto, a alternativa B replica fielmente a situação relatada, demonstrando a importância de distinguir fatos efetivamente ocorridos no texto dos juízos pessoais do candidato.
Estratégia para acertar: Localize no texto as ações e reações das personagens, tomando cuidado com inferências exageradas ou interpretações subjetivas.
Análise das alternativas incorretas:
A) Incorreta porque o texto critica justamente a substituição de argumentos e persuasão por crenças e opiniões. Não há recomendação para que professores ajam assim.
C) Equivocada ao sugerir que o texto defende a superioridade da opinião dos alunos e a omissão do professor em temas de Filosofia da Religião. O texto ressalta, ao contrário, o valor do debate e das razões.
D) Incorreta porque o texto reforça a necessidade da escola em fomentar a argumentação e persuasão em debates de crenças e opiniões. Portanto, é oposto ao que apresenta essa alternativa.
Dica de prova: Em questões desse tipo, atenção aos conectivos ("por isso", "logo", "portanto") e aos termos referenciais ("esse", "isso", "aquele"), que auxiliam a localizar relações de causa e efeito ou de oposição entre as ideias.
Referência: Segundo Bechara e Koch, na interpretação textual, a coerência e a fidelidade ao texto-base são fundamentais: não se deve inferir além do que está realmente expresso.
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