Vai passar/ Nessa avenida um samba popular/ Cada paralelepípedo/ Da velha cidade/ Essa noite vai/ Se arrepiar/ Ao lembrar/ Que aqui passaram sambas imortais/ Que aqui sangraram pelos nossos pés/ Que aqui sambaram nossos ancestrais/ Num tempo/ Página infeliz da nossa história/ Passagem desbotada na memória/ Das nossas novas gerações/ Dormia/ A nossa pátria mãe tão distraída/ Sem perceber que era subtraída/ Em tenebrosas transações
“Vai passar”, Chico Buarque e Francis Hime

Com base nessa música gravada por Chico Buarque, em 1984, ano que marcou o auge da campanha pelas Diretas Já, é INCORRETO afirmar que a canção:

compara a ditadura à escravidão, lembrando antepassados, pés sangrados, calçamentos de paralelepípedo e até o samba como dança de escravizados.

sugere a presença do povo nas ruas, num contexto em que as grandes manifestações de massa voltaram à cena política.

trata a ditadura como uma “página infeliz” do Brasil, manifestação crítica essa favorecida pela revogação do AI-5 e pelo abrandamento da censura prévia, em 1978.

apresenta a luta pelas Diretas Já como um “samba popular”, considerando o apoio nas ruas e a vitória da Emenda Dante de Oliveira, no Congresso Nacional.

cita as “tenebrosas transações”, uma referência aos casos de corrupção revelados na fase final da ditadura, com a maior liberdade aos meios de comunicação.

Gabarito comentado

Gabrielle FrancoMonitor do Qconcursos

Alternativa correta: D

Tema central: a questão exige distinguir leitura metafórica do texto musical (imagem do samba, ruas, ancestralidade) de afirmações factuais sobre o processo político de 1984 (resultado da Emenda Dante de Oliveira). É preciso conhecer o contexto da transição democrática e o desfecho das Diretas Já.

Resumo teórico: a canção usa metáforas para evocar memória coletiva e indignação contra a ditadura (anos de repressão e desigualdades históricas). Historicamente, a campanha pelas Diretas Já mobilizou grandes manifestações em 1983–84, mas a proposta de emenda constitucional que convocaria eleições diretas (Emenda Dante de Oliveira) foi rejeitada pelo Congresso em abril de 1984 — a vitória popular nas ruas não se traduziu em aprovação legislativa imediata (fontes: Senado Federal; CPDOC/FGV).

Por que D é a resposta certa (ou seja, INCORRETA na afirmação)? A alternativa associa corretamente o tom popular da canção ao protagonismo das ruas, mas erra ao afirmar que houve “vitória da Emenda Dante de Oliveira, no Congresso Nacional”. Isso é fato histórico falso: a emenda não foi aprovada. Logo, a afirmação é incorreta e por isso é o gabarito.

Análise das demais alternativas (por que não são o erro pedido):

A: Correta — a letra estabelece analogias com escravidão e sofrimento (ancestrais, pés sangrando), rehegendo a crítica à continuação de violações e à memória social.

B: Correta — a música sugere presença popular nas avenidas; isso dialoga com as grandes mobilizações das Diretas Já.

C: Correta — o tom de “página infeliz” é leitura crítica da ditadura; essa crítica tornou‑se mais audível após o processo de abertura política (final dos anos 1970), quando censura e repressão foram sendo atenuadas.

E: Correta — “tenebrosas transações” pode remeter a negócios obscuros e escândalos que vieram à tona na fase final do regime, em sintonia com maior espaço para imprensa e denúncias.

Dica de prova: identifique se a alternativa mistura metáfora literária com afirmação factual verificável — questione datas e resultados (ex.: passou/foi aprovada?) antes de marcar.

Fontes sugeridas: acervos do Senado Federal sobre a Emenda Dante de Oliveira (1984) e o CPDOC/FGV sobre Diretas Já e abertura política.

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