Questão 1cf8232d-e0
Prova:FAG 2015
Disciplina:Português
Assunto:Interpretação de Textos, Gêneros Textuais, Tipologia Textual

Quanto ao gênero e ao tipo textual, o texto 2 pode ser classificado como um(a):

Texto 2


Coragem


“A pior coisa do mundo é a pessoa não ter coragem na vida”. Pincei essa frase do relato de uma moça chamada Florescelia, nascida no Ceará e que passou (e vem passando) poucas e boas: a morte da mãe quando tinha dois anos, uma madrasta cruel, uma gravidez prematura, a perda do único homem que amou, uma vida sem porto fixo, sem emprego fixo, mas com sonhos diversos, que lhe servem de sustentação.
    Ela segue em frente porque tem o combustível que necessitamos para trilhar o longo caminho desde o nascimento até a morte. Coragem.
    Quando eu era pequena, achava que coragem era o sentimento que designava o ímpeto de fazer coisas perigosas, e por perigoso eu entendia, por exemplo, andar de tobogã, aquela rampa alta e ondulada em que a gente descia sentada sobre um saco de algodão ou coisa parecida.
    Por volta dos nove anos, decidi descer o tobogã, mas na hora H, amarelei. Faltou coragem. Assim como faltou também no dia em que meus pais resolveram ir até a Ilha dos Lobos, em Torres, num barco de pescador. No momento de subir no barco, desisti. Foram meu pai, minha mãe, meu irmão, e eu retornei sozinha, caminhando pela praia, até a casa da vó.
    Muita coragem me faltou na infância: até para colar durante as provas eu ficava nervosa.
    Mentir para pai e mãe, nem pensar. Ir de bicicleta até ruas muito distantes de casa, não me atrevia. Travada desse jeito, desconfiava que meu futuro seria bem diferente do das minhas amigas.
    Até que cresci e segui medrosa para andar de helicóptero, escalar vulcões, descer corredeiras d’água. No entanto, aos poucos fui descobrindo que mais importante do que ter coragem para aventuras de fim de semana, era ter coragem para aventuras mais definitivas, como a de mudar o rumo da minha vida se preciso fosse. Enfrentar helicópteros, vulcões, corredeiras e tobogãs exige apenas que tenhamos um bom relacionamento com a adrenalina.
    Coragem, mesmo, é preciso para terminar um relacionamento, trocar de profissão, abandonar um país que não atende nossos anseios, dizer não para propostas lucrativas porém vampirescas, optar por um caminho diferente do da boiada, confiar mais na intuição do que em estatísticas, arriscar-se a decepções para conhecer o que existe do outro lado da vida convencional. E, principalmente, coragem para enfrentar a própria solidão e descobrir o quanto ela fortalece o ser humano.
    Não subi no barco quando criança – e não gosto de barcos até hoje. Vi minha família sair em expedição pelo mar e voltei sozinha pela praia, uma criança ainda, caminhando em meio ao povo, acreditando que era medrosa. Mas o que parecia medo era a coragem me dando as boas vindas, me acompanhando naquele recuo solitário, quando aprendi que toda escolha requer ousadia.
MEDEIROS, Marta. A graça das coisas. Porto Alegre - RS: L&PM, 2014, p. 90-91.

A
debate sobre a importância da coragem.
B
tese sobre a relação entre coragem e aventura.
C
artigo de natureza informativa sobre coragem e ousadia.
D
crônica em que os fatos relatados servem a uma argumentação.
E
Nenhuma das alternativas anteriores.

Gabarito comentado

R
Rafael CastroMonitor do Qconcursos

Tema central da questão: Interpretação de Gênero e Tipo Textual

O examinador exige reconhecer gênero textual (crônica) e tipo textual (argumentativo), dois conceitos essenciais em Língua Portuguesa. Segundo a norma-padrão, gêneros textuais são formas sociais de uso da linguagem, como carta, artigo, crônica, notícia; tipos textuais são estruturas básicas: narração, descrição, dissertativo/argumentativo, etc. (Cf. Cunha & Cintra; Bechara).

Justificativa da alternativa correta (D):

A alternativa D) "crônica em que os fatos relatados servem a uma argumentação" é correta porque o texto expõe situações do cotidiano pessoal da autora, numa linguagem coloquial e subjetiva—elemento fundamental da crônica.
Ao mesmo tempo, essas experiências são argumentos empregados para refletir sobre o verdadeiro significado da coragem—indo muito além de aventuras físicas, e valorizando desafios existenciais, como mudar de vida, enfrentar solidão e seguir sonhos. Há, portanto, uma estrutura narrativa (relato de vivências) e uma tese argumentativa (coragem como força vital), o que caracteriza plenamente uma “crônica argumentativa”.

Análise das alternativas incorretas:

A) Debate sugere contraposição direta de opiniões ou diálogo, o que não ocorre no texto.
B) Tese sobre a relação entre coragem e aventura limitaria o texto a uma estrutura exclusivamente dissertativa e a um tema muito restrito, desconsiderando a amplitude reflexiva da crônica.
C) Artigo de natureza informativa pressupõe tom impessoal e objetivo, enquanto o texto é subjetivo e opinativo.
E) Incorreta porque a alternativa D é plenamente adequada.

Dica de prova: Identifique o tom subjetivo, o foco em experiências pessoais e a reflexão à qual elas conduzem: são marcas inequívocas da crônica argumentativa. Não confunda crônica com artigo, que é informativo, nem com debate, de múltiplos pontos de vista.

Conforme Evanildo Bechara: "A crônica comporta reflexão sobre fatos cotidianos, e pode ser tanto narrativa quanto argumentativa".

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