K. – relato de uma busca, de Bernardo Kucisnki, é um romance baseado na desaparição da irmã do autor nos anos da
Ditadura Militar no Brasil. No fragmento, o personagem K., após participar de uma cerimônia em homenagem a
desaparecidos políticos, observa nomes de avenidas e pontes. Sua reflexão a respeito dos nomes que lê nas placas
simboliza a
O loteamento ficava num fim de mundo, terrenos baratos para estimular a autoconstrução de modo a valorizar terras
do mesmo dono mais próximas ao centro, depois de os moradores conseguirem água, luz e ônibus. Ali, um projeto de
lei de um vereador de esquerda deu a cada rua o nome de um desaparecido político, quarenta e sete ruas, quarenta e
sete desaparecidos políticos.(...) Mas passou a prestar atenção nas placas e indicativos de ruas à medida que o micro‐ônibus percorria o caminho
de volta. (...)
(...) Percorreram algumas ruas com nomes que ele desconhecia. Depois para espanto de K., uma avenida General
Milton Tavares de Souza. Esse ele sabia muito bem quem foi: jamais esqueceria esse nome. O filho do farmacêutico
falara dele. Dom Paulo também. Foi quem criou o DOI‐CODI, para onde levaram o Herzog e o mataram.
(...) Centenas de pessoas passam por aqui todos os dias, jovens, crianças, e leem esse nome na placa, e podem pensar
que é um herói. Devem pensar isso. Agora ele entendia por que as placas com os nomes dos desaparecidos foram
postas num fim do mundo.
KUCINSKI, Bernardo. K. ‐ Relato de uma busca. São Paulo, Cosac Naify, 2014, p. 160‐165
Gabarito comentado
Gabarito Comentado – Interpretação de Texto
Tema central: Esta questão aborda interpretação de texto, com foco na identificação da ideia principal, dos implícitos e dos recursos discursivos (como a ironia) presentes no fragmento. Exige analisar criticamente o texto – habilidade indispensável em provas de concursos para engenheiros – especialmente ao tratar de temas relacionados à memória e à história.
Justificativa da alternativa correta (A):
O texto evidencia uma crítica à forma como a memória dos desaparecidos políticos é tratada no espaço urbano: as ruas homenageando-os ficam em locais afastados (“fim de mundo”), enquanto uma avenida importante celebra um general notório da repressão. Esse contraste revela, de maneira sutil e irônica, uma denúncia quanto à manipulação da memória histórica – trata-se de ocultar ou diminuir a visibilidade daqueles que sofreram injustiças, enquanto figuras do regime são exaltadas.
Como chegar a essa conclusão? Observe palavras-chaves e a construção do raciocínio de K., que percebe o paradoxo das homenagens: “agora ele entendia por que as placas com os nomes dos desaparecidos foram postas num fim do mundo”. Isso implica uma crítica irônica (conforme a definição de Beth Brait, a ironia é um recurso que exige do leitor perceber sentidos ocultos e críticos).
Análise das alternativas incorretas:
B) Preservação da memória: O texto não celebra uma preservação efetiva, mas mostra que ela foi relegada a espaços pouco visíveis, portanto, não há preservação digna.
C) Necessidade de tornar públicos os episódios: O foco do texto não é promover o acesso à história, e sim criticar o modo como ela é apresentada ao público.
D) Universalização da experiência traumática: Não há no texto indicação de que o trauma é universalizado ou experimentado por todos, mas sim uma crítica localizada.
E) Incapacidade de recuperação do indivíduo: O fragmento não trata do dano psicológico individual, e sim da disputa simbólica pela memória coletiva.
Estratégia de Prova: Ao analisar questões de interpretação, busque sempre o sentido implícito e a crítica subjacente. Palavras de destaque, ironias e/ou situações paradoxais costumam indicar o caminho do gabarito.
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