Questão 118505ef-fd
Prova:UNICENTRO 2017
Disciplina:Português
Assunto:Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

Assinale a única alternativa incorreta em relação à leitura e à interpretação do texto 01.

O animal satisfeito dorme,
Mário Sérgio Cortella

O sempre surpreendente Guimarães Rosa dizia: “o animal satisfeito dorme”. Por trás dessa aparente obviedade está um dos mais fundos alertas contra o risco de cairmos na monotonia existencial, na redundância afetiva e na indigência intelectual. O que o escritor tão bem percebeu é que a condição humana perde substância e energia vital toda vez que se sente plenamente confortável com a maneira como as coisas já estão, rendendo-se à sedução do repouso e imobilizando-se na acomodação.
A advertência é preciosa: não esquecer que a satisfação conclui, encerra, termina; a satisfação não deixa margem para a continuidade, para o prosseguimento, para a persistência, para o desdobramento. A satisfação acalma, limita, amortece. Por isso, quando alguém diz “fiquei muito satisfeito com você” ou “estou muito satisfeita com teu trabalho”, é assustador. O que se quer dizer com isso? Que nada mais de mim se deseja? Que o ponto atual é meu limite e, portanto, minha possibilidade? Que de mim nada mais além se pode esperar? Que está bom como está? Assim seria apavorante; passaria a ideia de que desse jeito já basta. Ora, o agradável é quando alguém diz: “teu trabalho (ou carinho, ou comida, ou aula, ou texto, ou música etc.) é bom, fiquei muito insatisfeito e, portanto, quero mais, quero continuar, quero conhecer outras coisas.
Um bom filme não é exatamente aquele que, quando termina, ficamos insatisfeitos, parados, olhando, quietos, para a tela, enquanto passam os letreiros, desejando que não cesse? Um bom livro não é aquele que, quando encerramos a leitura, o deixamos um pouco apoiado no colo, absortos e distantes, pensando que não poderia terminar? Uma boa festa, um bom jogo, um bom passeio, uma boa cerimônia não é aquela que queremos que se prolongue?
Com a vida de cada um e de cada uma também tem de ser assim; afinal de contas, não nascemos prontos e acabados. Ainda bem, pois estar satisfeito consigo mesmo é considerar-se terminado e constrangido ao possível da condição do momento. 
Quando crianças (só as crianças?), muitas vezes, diante da tensão provocada por algum desafio que exigia esforço (estudar, treinar, EMAGRECER etc.) ficávamos preocupados e irritados, sonhando e pensando: por que a gente já não nasce pronto, sabendo todas as coisas? Bela e ingênua perspectiva. É fundamental não nascermos sabendo e nem prontos; o ser que nasce sabendo não terá novidades, só reiterações. Somos seres de insatisfação e precisamos ter nisso alguma dose de ambição; todavia, ambição é diferente de ganância, dado que o ambicioso quer mais e melhor, enquanto que o ganancioso quer só para si próprio.
Nascer sabendo é uma limitação porque obriga a apenas repetir e, nunca, a criar, inovar, refazer, modificar. Quanto mais se nasce pronto, mais refém do que já se sabe e, portanto, do passado; aprender sempre é o que mais impede que nos tornemos prisioneiros de situações que, por serem inéditas, não saberíamos enfrentar.
Diante dessa realidade, é absurdo acreditar na ideia de que uma pessoa, quanto mais vive, mais velha fica; para que alguém quanto mais vivesse mais velho ficasse, teria de ter nascido pronto e ir se gastando… 
Isso não ocorre com gente, e sim com fogão, sapato, geladeira. Gente não nasce pronta e vai se gastando; gente nasce não-pronta, e vai se fazendo. Eu, no ano que estamos, sou a minha mais nova edição (revista e, às vezes, um pouco ampliada); o mais velho de mim (se é o tempo a medida) está no meu passado e não no presente. 
Demora um pouco para entender tudo isso; aliás, como falou o mesmo Guimarães, “não convém fazer escândalo de começo; só aos poucos é que o escuro é claro”… 

Excerto do livro “Não nascemos prontos! – provocações filosóficas”. De Mário Sérgio Cortella.
Disponível em:<http://www.contioutra.com/o-animal-satisfeito-dorme-texto-de-mario-sergio-cortella/> 

A
Podemos inferir que, através de uma metáfora, presente no primeiro parágrafo, o autor introduz a ideia principal do texto: o indivíduo acomoda-se quando está satisfeito com a sua condição atual.
B
Para o autor, de acordo com o texto, a sensação de satisfação inicia um período de dormência que, infelizmente, não pode ser interrompida a não ser pela fome excessiva.
C
De acordo com as opiniões do autor, o fato de alguém dizer " estou muito satisfeita com teu trabalho” deveria ser visto de maneira assustadora.
D
Um bom filme, um bom livro, de acordo com o texto, deveriam provocar na audiência, no leitor, a sensação de “quero mais”.
E
Podemos inferir, lendo o texto que, para o autor, o que se desgasta são bens como sapatos, geladeiras, eletrodomésticos, por exemplo. Com o homem, o que acontece é um constante aprendizado. Tal fato pode ser comprovado na passagem: “Nascer sabendo é uma limitação porque obriga a apenas repetir e, nunca, a criar, inovar, refazer, modificar. Quanto mais se nasce pronto, mais refém do que já se sabe e, portanto, do passado; aprender sempre é o que mais impede que nos tornemos prisioneiros de situações que, por serem inéditas, não saberíamos enfrentar.”

Gabarito comentado

N
Nicolas PadilhaMentora Qconcursos

Comentário da questão – Interpretação de Texto

Tema central: A questão aborda interpretação de texto, especialmente inferências, sentido figurado (metáfora) e análise das ideias centrais do autor, habilidades fundamentais para provas de vestibular e concursos. Segundo a Norma-Padrão e gramáticos como Evanildo Bechara, a interpretação exige do candidato não só leitura atenta, mas também o domínio do contexto e das intenções do texto.

Justificativa da alternativa INCORRETA – Letra B

A alternativa B afirma que, para o autor, "a satisfação inicia uma dormência que só pode ser interrompida pela fome excessiva". Essa relação direta não é feita pelo autor. Cortella utiliza a metáfora do “animal satisfeito” para criticar a acomodação humana, mas não limita a “interrupção da dormência” à fome física. O texto trabalha o conceito de insatisfação como motor do crescimento, não como ausência de fome literal. Essa ideia deturpa o sentido original, tornando a alternativa incompatível com o texto.

Análise das alternativas corretas:

A) Correta: O autor usa a metáfora "o animal satisfeito dorme" para introduzir o tema da acomodação, mostrando como a satisfação pode levar à estagnação. Esse recurso é reconhecido na semântica da metáfora — um clássico de análise textual.

C) Correta: De acordo com o autor, ser visto como plenamente satisfatório pode ser “assustador”, pois sugere ausência de expectativas e limitação ao autodesenvolvimento.

D) Correta: O texto afirma que experiências marcantes, como bons filmes ou livros, provocam desejo de continuidade — insatisfação produtiva.

E) Correta: Está bem alinhada ao trecho em que o autor diferencia pessoas de objetos: gente não “gasta”, mas “se faz” constantemente — conceito fundamental de aprendizagem contínua.

Estratégias para provas:

- Ao analisar alternativas de interpretação, recorra sempre ao texto original e busque provas literais do que se afirma.
- Destaque palavras-chave e relações causa-consequência.
- Atenção a interpretações literais versus figuradas: cair em "pegadinhas" de leitura superficial é comum.
- Pergunte-se: Essa afirmação realmente foi feita pelo autor, ou apenas é uma inferência distorcida?

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