A leitura do texto permite concluir, com correção, que no último parágrafo o autor sustenta
Leia o texto para responder à questão.
De repente, uma variante trágica.
Aproxima-se a seca.
O sertanejo adivinha-a e prefixa-a graças ao ritmo singular com que se desencadeia o flagelo.
Entretanto não foge logo, abandonando a terra a pouco
e pouco invadida pelo limbo candente que irradia do Ceará.
[...]
Os sintomas do flagelo despontam-lhe, então, encadeados em série, sucedendo-se inflexíveis, como sinais comemorativos de uma moléstia cíclica, da sezão assombradora
da Terra. [...] E ao descer das tardes, dia a dia menores e sem
crepúsculos, considera, entristecido, nos ares, em bandos,
as primeiras aves emigrantes, transvoando a outras climas...
É o prelúdio da desgraça.
Vê-o acentuar, num crescente, até dezembro.
Precautela-se: revista, apreensivo, as malhadas. Percorre os logradouros longos. Procura entre as chapadas que se
esterilizam várzeas mais benignas para onde tange os rebanhos. E espera, resignado, o dia 13 daquele mês. Porque, em
tal data, usança avoenga lhe faculta sondar o futuro, interrogando a Providência.
É a experiência tradicional de Santa Luzia. No dia 12 ao
anoitecer expõe ao relento, em linha, seis pedrinhas de sal,
que representam, em ordem sucessiva da esquerda para a
direita, os seis meses vindouros, de janeiro a junho. Ao alvorecer de 13 observa-as: se estão intactas, pressagiam a
seca; se a primeira apenas se deliu, transmudada em aljôfar
límpido, é certa a chuva em janeiro; se a segunda, em fevereiro; se a maioria ou todas, é inevitável o inverno benfazejo.
Esta experiência é belíssima. Em que pese ao estigma
supersticioso, tem base positiva, e é aceitável desde que se
considere que dela se colhe a maior ou menor dosagem de
vapor d’água nos ares, e, dedutivamente, maiores ou menores probabilidades de depressões barométricas, capazes de
atrair o afluxo das chuvas.
(Euclides da Cunha. Os Sertões, 1979. Adaptado)
Gabarito comentado
Tema central da questão:
Trata-se de interpretação de texto, com foco na identificação do enfoque discursivo e na relação desse enfoque com os movimentos literários, especialmente o Pré-Modernismo.
Justificativa para a alternativa correta (C):
No último parágrafo do texto, o autor, Euclides da Cunha, adota um enfoque científico ao explicar a tradição popular das pedrinhas de sal. Ele não se limita ao relato folclórico da cultura sertaneja, mas busca fundamentação racional — usa argumentos como “maior ou menor dosagem de vapor d’água nos ares” e “probabilidades de depressões barométricas”. Essa análise revela uma preocupação sociológica em compreender a realidade nacional e suas manifestações, característica fundamental do Pré-Modernismo (como afirmam Cunha & Cintra). Logo, a alternativa C é correta.
Análise das alternativas incorretas:
A) Sentimentalismo e subjetividade não aparecem no trecho analisado. O autor emprega uma abordagem analítica, e não emocional. O Modernismo trabalha com subjetividade, mas não corresponde à proposta de Euclides aqui.
B) O texto não idealiza o sertanejo; ao contrário, procura encarar a realidade sem amenizações, opondo-se à visão romântica e confirmando o realismo crítico e científico, típico do Pré-Modernismo.
D) O autor menciona a prática popular, mas não a reduz à superstição. Ele ressignifica o hábito sob perspectiva científica. Além disso, o Simbolismo caracteriza-se pelo subjetivismo, o que não ocorre nesse contexto.
E) Não há imparcialidade nem ingenuidade na análise; o autor apresenta argumentos baseados em observações científicas, descartando qualquer relação com teses pós-modernistas.
Estratégias de leitura e dicas para a prova:
Sempre observe palavras-chave como “base positiva”, “dedutivamente”, e expressões que indicam análise racional. Ao relacionar o texto a movimentos, busque elementos explícitos de cientificidade, crítica social e realismo, que marcam o Pré-Modernismo segundo Bechara e Rocha Lima.
Evite distrações com termos subjetivos, pois podem ser usados como pegadinha pelas bancas.
Conclusão:
O autor interpreta uma tradição regional sob enfoque científico e sociológico, o que torna C a alternativa correta. Essa análise exemplifica o olhar crítico pré-modernista para a realidade brasileira.
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