Questão ca0cdaf0-b1
Prova:UFGD 2011
Disciplina:História
Assunto:História Geral, Imperialismo e Colonialismo do século XIX

Leia a seguir partes do livro Filosofia da História Universal, do filósofo alemão George Friedrich Hegel (1770-1831).  

Texto A
     ''A África propriamente dita é a parte característica deste continente. Começamos pela consideração deste continente, porque em seguida podemos deixá-lo de lado, por assim dizer. Não tem interesse histórico próprio, senão o de que os homens vivem ali na barbárie e na selvageria, sem fornecer nenhum elemento à civilização. Por mais que retrocedamos na história, acharemos que a África está sempre fechada no contato com o resto do mundo, é um eldorado recolhido em si mesmo, é o país criança, envolvido na escuridão da noite, aquém da luz da história consciente. [...] Nesta parte principal da África, não pode haver história''.

Texto B
     “Encontramos, [...], aqui o homem em seu estado bruto. Tal é o homem na África. Porquanto o homem aparece como homem, põe-se em oposição à natureza; assim é como se faz homem. Mas, porquanto se limita a diferenciar-se da natureza, encontra-se no primeiro estágio, dominado pela paixão, pelo orgulho e a pobreza; é um homem estúpido. No estado de selvageria achamos o africano, enquanto podemos observá-lo e assim tem permanecido. O negro representa o homem natural em toda a sua barbárie e violência; para compreendê-lo devemos esquecer todas as representações europeias. Devemos esquecer Deus e a lei moral. Para compreendê-lo exatamente, devemos abstrair de todo respeito e moralidade, de todo o sentimento. Tudo isso está no homem em seu estado bruto, em cujo caráter nada se encontra que pareça humano''.


Assinale a alternativa que traz a afirmação correta acerca da África subsaariana e de suas sociedades.

A
Apesar de uma grande carga de preconceito, o texto ''A'' apresenta uma consideração verdadeira sobre a África, uma vez que mesmo nos tempos atuais aquele continente se caracteriza por possuir tribos que vivem ainda na pré-história.
B
Embora etnocêntrico, o texto ''B'', se considerarmos a época em que foi escrito, expressa em parte uma verdade, pois somente é possível falar de ―civilização‖ na África após a chegada, no século XIX, dos europeus ao continente africano.
C
Do ponto de vista dos historiadores, o texto ''A'', apesar de seu conteúdo racista, é em parte correto porque não se pode falar de história em sociedades que não conhecem a escrita (ágrafas). Assim, a África subsaariana era, no momento em que o texto foi escrito, uma sociedade sem história ou pré-histórica.
D
Ambos os textos expressam preconceitos derivados do sentimento de superioridade de seu autor, um europeu. Na verdade, no século XIX, as sociedades existentes na África subsaariana organizavam-se em tribos devido ao esvaziamento demográfico e às migrações internas, ocorridos em séculos anteriores devido à escravidão. Porém, essas sociedades já se encaminhavam na direção da construção de novos Estados Nações, algo que se efetivaria no século XX.
E
Os textos ''A''e ''B'' expressam opiniões correntes nos séculos XIX e XX sobre a África e as sociedades subsaarianas. Em grande medida, tais opiniões derivavam das ideias iluministas de civilização e progresso que circulavam amplamente na Europa antes da Primeira Grande Guerra e que somente começaram a ser efetivamente derrubadas após o final da Segunda Guerra Mundial.

Gabarito comentado

G
Gabrielle FrancoMonitor do Qconcursos

Alternativa correta: E

Tema central: crítica ao etnocentrismo historiográfico. Os textos de Hegel refletem uma visão europeia do século XIX que hierarquizava sociedades segundo critérios de "civilização" e escrita. Para responder é preciso compreender conceitos de etnocentrismo, Enlightenment (progresso/civilização) e as transformações da historiografia sobre a África no século XX.

Resumo teórico e evidências: - No século XIX muitos pensadores europeus usavam a noção de progresso linear para justificar imperialismo. Hegel exemplifica esse olhar que negava agência histórica a povos sem escrita alfabética. - A historiografia moderna reconhece múltiplas fontes (oralidade, arqueologia, fontes arqueobotânicas, documentos islâmicos e etíopes, manuscritos de Timbuktu, inscrições etíopes, ruínas como Great Zimbabwe, reinos do Mali, Songhai, Benin, Kongo, cidades swahili) que demonstram Estados, comércio e cultura complexa na África subsaariana antes da colonização. - Após a Segunda Guerra Mundial, com processos de descolonização e a emergência dos estudos pós-coloniais (ex.: Frantz Fanon; Walter Rodney problematizou relações coloniais), as interpretações racistas e lineares perderam legitimidade acadêmica.

Por que a alternativa E é correta: Porque afirma que os textos refletem opiniões correntes nos séculos XIX/XX baseadas nas ideias iluministas de civilização e progresso — e que essas visões só foram amplamente contestadas depois da Segunda Guerra Mundial, com o fortalecimento da crítica anticolonial e da renovação da historiografia. Essa síntese coaduna-se com a evolução historiográfica e política do século XX.

Análise das alternativas incorretas: - A: Errada — afirma que hoje existiriam tribos "pré-históricas" como justificativa; isso é reducionista e reproduz o preconceito: ausência de escrita não significa ausência de história. - B: Errada — afirma que civilização só veio com europeus no século XIX; falso: havia Estados e sistemas culturais desenvolvidos antes do contato europeu moderno. - C: Errada — sustenta que historiadores validam "sem história" para sociedades ágrafas; a historiografia contemporânea aceita oralidade e outras fontes como históricas. - D: Parcialmente confusa e imprecisa — acerta ao identificar preconceito nos textos, mas erra ao atribuir organização em "tribos" unicamente à escravidão e a um processo linear de formação de Estados-nação; a formação política africana foi variada e complexa, e Estados-nação modernos surgiram em contextos coloniais e pós-coloniais, não como continuidade simples.

Dica de estratégia para provas: procure sinais de etnocentrismo (palavras como "selvageria" ou "sem história") e questione pressupostos: "história = escrita?" — use exemplos concretos (Mali, Etiópia, Timbuktu, Great Zimbabwe) para refutar alternativas que naturalizam o preconceito.

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