Questão bff4d5d5-fe
Prova:UNICENTRO 2019
Disciplina:História
Assunto:História do Brasil

E eram numerosos os canais de recuperação utilizados [...]. A faringite era curada com chá de formiga e gargarejo com sal, a enterite com chá de cidreira e a cefaleia com folhas de algodão aquecidas ou gengibre. Para piolho, indicavam raspa de coco misturada com enxofre, para epilepsia chá de pena de garça e para difteria banhos de sândalo e alcaçuz. A asma era tratada com banha de ema, as luxações e entorses com emplastro de clara de ovo batida com breu e hemorragias com suco de arnica. A verminose, muito comum entre os membros do bando em decorrência da pouca higienização, era curada com lavagem de manipueira, utilizada como purgante. Até para a impotência, preocupação já existente na época, havia receita: chá de velame, chá de cabeça de negro em jejum e água de arroz. Quem contraísse doença venérea deveria se tratar com o sumo de doze limões ingerido em jejum após o sol nascer. [...]. Em momentos de dor, também faziam uso de superstições, algumas, curiosas [...]: “Mulher menstruada era impedida de entrar nos quartos de guerra para não arruinar a ferida”. Amuletos e rezas eram usados com a finalidade de ter o “corpo fechado” contra os inimigos ou animais perigosos. E para auxiliar no ato da cura, rezadeiras, beatos e fanáticos por vezes eram invocados. E quando as crendices e simpatias não funcionavam, a que recorriam [...]? “O jeito era apelar para outras práticas, como a tintura de iodo, a pomada de São Lázaro, para as chagas abertas no meio das brigas, e a banha de baiacu, para amenizar as dores de hérnias”, (HISTORIADOR..., 2019.

A análise do texto e os conhecimentos sobre a história do Brasil permitem afirmar, sobre o desenvolvimento dos saberes, que 

A
o processo histórico, durante o período colonial, esteve preso às crenças do misticismo medievais, arraigadas na mentalidade do colonizador português, sem sofrer qualquer influência do racionalismo renascentista e iluminista.
B
o período imperial estabeleceu a ruptura radical entre o saber científico e as crendices e superstições populares, em decorrência do fim do Padroado e da separação entre Igreja e Estado.
C
a permanência da prática da medicina popular, na Primeira República, indica a existência de um Brasil urbano, ligado às transformações do capitalismo e um rural, preso às tradições e aos saberes populares.
D
a legislação social varguista, ao equiparar os direitos dos trabalhadores rurais e urbanos, aproximou os saberes populares dos científicos, possibilitando a convivência pacífica no contexto da política de compromisso.
E
a urbanização e a industrialização, promovidas durante o governo Juscelino Kubitschek, foram fundamentais para o êxodo rural e para o processo de modernização das relações de trabalho no campo, minimizando a influência das crendices populares.

Gabarito comentado

V
Vanessa CamposMonitor do Qconcursos

Gabarito: alternativa C

Tema central: a questão trata da permanência e circulação de saberes médicos populares no Brasil e do que isso revela sobre as diferenças sociais e espaciais (urbano vs. rural) durante a Primeira República.

Resumo teórico: No Brasil republicano (1889–1930) houve avanços da medicina científica e políticas públicas de saúde (ex.: atuação de Oswaldo Cruz e a campanha sanitária que culminou na Revolta da Vacina, 1904). Porém, práticas tradicionais — remédios caseiros, rezas, curandeiros — continuaram amplamente usadas, sobretudo entre populações rurais e camadas urbanas pobres. Assim, o país apresentava uma dupla realidade: centros urbanos com aproximações ao saber científico e um vasto interior marcado por saberes populares e continuidade de práticas tradicionais.

Fonte e referência curta: estudos de história da saúde pública no Brasil (campanhas sanitárias de início do século XX; Revolta da Vacina) e historiografia social que destaca a coexistência entre medicina científica e medicina popular.

Por que a alternativa C está correta: ela reconhece essa dupla configuração — um Brasil em processo de urbanização e inserção nas lógicas capitalistas e outro mais rural ligado a tradições. A permanência de remédios tradicionais no cotidiano, mesmo nas cidades, confirma que não houve substituição uniforme do saber popular pelo saber científico na Primeira República; em vez disso, houve convivência e desigualdade no acesso às práticas médicas.

Análise das alternativas incorretas:

A — incorreta porque exagera: o período colonial não ficou “preso” apenas ao misticismo medieval. Houve influências diversas (conhecimento indígena e africano, práticas europeias variadas e, ao longo do tempo, contatos com ideias renascentistas e iluministas).

B — incorreta porque não houve ruptura radical no período imperial que eliminasse crendices; a separação Igreja‑Estado e o fim do Padroado não implicaram eliminação imediata das práticas populares nem uma aceitação unânime do saber científico.

D — incorreta: a legislação trabalhista varguista (décadas de 1930–40) ampliou direitos urbanos, mas não equiparou plenamente direitos rurais e urbanos nem promoveu uma harmonização mágica entre saberes populares e científicos.

E — incorreta: o governo JK acelerou urbanização e indústria, mas não eliminou as crendices populares nem resolveu a assimetria cultural entre campo e cidade de forma imediata; as práticas tradicionais continuaram influentes.

Dicas de interpretação: foque nos marcadores temporais (Primeira República) e no verbo-chave (“indica”): a alternativa deve oferecer uma leitura plausível do que a permanência da medicina popular revela sobre a estrutura social e espacial do país.

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