Questão b2cf7a69-a6
Prova:FGV 2015, FGV 2015
Disciplina:História
Assunto:História Geral

      “Só para mim nasceu Dom Quixote, e eu para ele: ele para praticar as ações e eu para as escrever (...) a contar com pena de avestruz, grosseira e mal aparada, as façanhas do meu valoroso cavaleiro, porque não é carga para os seus ombros, nem assunto para o seu frio engenho; e a esse advertirás, se acaso chegares a conhecê-lo, que deixe descansar na sepultura os cansados e já apodrecidos ossos de Dom Quixote (...), pois não foi outro o meu intento, senão o de tornar aborrecidas dos homens as fingidas e disparatadas histórias dos livros de cavalarias, que vão já tropeçando com as do meu verdadeiro Dom Quixote, e ainda hão de cair de todo, sem dúvida."

                                                 (Miguel de Cervantes Saavedra, Dom Quixote de la Mancha, 1991)

Sobre a obra em questão, é correto afirmar que

A
Dom Quixote é um homem de valores de cavalaria, instituição típica da modernidade ocidental, com suas aventuras tragicômicas, fruto de suas leituras, que vão do heroísmo à ingenuidade, caracterizando a sensibilidade do homem moderno, mais ligado à ciência e à experiência, em oposição ao primado da fé.
B
o homem medieval, representado por Dom Quixote, considera a cavalaria, instituição típica do período, o símbolo dos valores cristãos, como a fé, a honra e a justiça, e vê, na guerra santa, forma de propagar esses valores, em defesa do mundo que crê nas lições dos livros sagrados, sem duvidar das verdades tradicionais.
C
a figura trágica de Dom Quixote é a representação do homem do mundo antigo, ou seja, aquele que considera a guerra como missão a fim de louvar os deuses e transformar as ações em mitos, condenando a injustiça e as civilizações frágeis, o que possibilita localizar o texto no final da Antiguidade.
D
Cervantes cria Dom Quixote, o cavaleiro andante, um fidalgo cujas proezas o tornam inadequado à época moderna, marcando o limite entre o heroísmo e a fantasia, pois não só aspira a uma missão purificadora do mundo como acredita nela, e revela que, na passagem do homem medieval para o moderno, a cavalaria era algo ultrapassado.
E
o texto de Cervantes nos conta a aventura de um fidalgo que, por meio de leituras de livros de cavalaria, torna-se um cavaleiro, uma personagem identificada com os valores medievais, de guerra, honra e justiça, mostrando como, na Idade Moderna, esses valores são importantes, ainda têm lugar e guiam a ação e a consciência do homem moderno.

Gabarito comentado

V
Vanessa CamposMonitor do Qconcursos

Alternativa correta: D

Tema central: a questão trata da obra Dom Quixote como crítica às histórias de cavalaria e como símbolo da transição entre o mundo medieval e a modernidade. Para resolver é preciso reconhecer que Cervantes satiriza valores cavaleirescos, mostrando-os ultrapassados no contexto da Espanha dos séculos XVI–XVII.

Resumo teórico (claro e progressivo): Dom Quixote (publicado em 1605 e 1615) é frequentemente apontado como marco do romance moderno. Cervantes cria um protagonista que vive segundo ideais medievais de honra e cavalaria, mas cujas ações se mostram anacrônicas frente à realidade social e racional emergente. A obra mistura paródia, realismo e reflexão sobre verdade e ficção, indicando a passagem cultural do feudal/cavalar para formas sociais e cognitivas modernas.

Justificativa da alternativa D: A alternativa D descreve corretamente que Dom Quixote é um fidalgo cujas proezas são inadequadas à época moderna, marcando o limite entre heroísmo e fantasia. Cervantes mostra que a cavalaria já não corresponde à experiência social e intelectual do início da Idade Moderna, e que o herói crê sinceramente em sua missão purificadora — o que reforça a ideia de anacronismo e de crítica nostálgica/irônica aos valores medievais.

Análise das alternativas incorretas:

A — Errada: afirma que Dom Quixote representa a sensibilidade do homem moderno, ligado à ciência e à experiência. Na verdade, ele encarna um ideal medieval e irracional; o romance, sim, é obra moderna, mas o personagem não é cientificista.

B — Errada: exagera ao apresentar Dom Quixote como defensor acrítico da guerra santa e dos valores cristãos tradicionais. Cervantes ironiza esses ideais; o foco é a literatura de cavalaria e seu descompasso com a realidade, não a defesa de cruzadas.

C — Errada: associa a figura à Antiguidade e à devoção aos deuses — leitura anacrônica. A obra é fruto das disputas culturais do início da Idade Moderna (século XVII), não do final da Antiguidade.

E — Errada: afirma que os valores cavaleirescos ainda guiam o homem moderno. A proposta de Cervantes é justamente mostrar que esses valores estão esgotados socialmente; a obra problematiza sua continuidade, não a celebra.

Fontes sugeridas: Miguel de Cervantes, Dom Quixote (1605/1615); verbete "Don Quixote" na Encyclopaedia Britannica; estudos sobre a formação do romance moderno (ex.: análises de Perry Anderson, Peter Burke).

Estratégia prática: busque termos-chave no enunciado (ex.: "ultrapassado", "passagem do medieval para o moderno", "inadequado à época") — eles costumam indicar a alternativa correta.

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