“Só para mim nasceu Dom Quixote, e eu para ele: ele
para praticar as ações e eu para as escrever (...) a contar
com pena de avestruz, grosseira e mal aparada, as façanhas
do meu valoroso cavaleiro, porque não é carga para os
seus ombros, nem assunto para o seu frio engenho; e a esse
advertirás, se acaso chegares a conhecê-lo, que deixe descansar
na sepultura os cansados e já apodrecidos ossos de
Dom Quixote (...), pois não foi outro o meu intento, senão o
de tornar aborrecidas dos homens as fingidas e disparatadas
histórias dos livros de cavalarias, que vão já tropeçando com
as do meu verdadeiro Dom Quixote, e ainda hão de cair de
todo, sem dúvida."
(Miguel de Cervantes Saavedra, Dom Quixote de la Mancha, 1991)
Sobre a obra em questão, é correto afirmar que
(Miguel de Cervantes Saavedra, Dom Quixote de la Mancha, 1991)
Sobre a obra em questão, é correto afirmar que
Gabarito comentado
Alternativa correta: D
Tema central: a questão trata da obra Dom Quixote como crítica às histórias de cavalaria e como símbolo da transição entre o mundo medieval e a modernidade. Para resolver é preciso reconhecer que Cervantes satiriza valores cavaleirescos, mostrando-os ultrapassados no contexto da Espanha dos séculos XVI–XVII.
Resumo teórico (claro e progressivo): Dom Quixote (publicado em 1605 e 1615) é frequentemente apontado como marco do romance moderno. Cervantes cria um protagonista que vive segundo ideais medievais de honra e cavalaria, mas cujas ações se mostram anacrônicas frente à realidade social e racional emergente. A obra mistura paródia, realismo e reflexão sobre verdade e ficção, indicando a passagem cultural do feudal/cavalar para formas sociais e cognitivas modernas.
Justificativa da alternativa D: A alternativa D descreve corretamente que Dom Quixote é um fidalgo cujas proezas são inadequadas à época moderna, marcando o limite entre heroísmo e fantasia. Cervantes mostra que a cavalaria já não corresponde à experiência social e intelectual do início da Idade Moderna, e que o herói crê sinceramente em sua missão purificadora — o que reforça a ideia de anacronismo e de crítica nostálgica/irônica aos valores medievais.
Análise das alternativas incorretas:
A — Errada: afirma que Dom Quixote representa a sensibilidade do homem moderno, ligado à ciência e à experiência. Na verdade, ele encarna um ideal medieval e irracional; o romance, sim, é obra moderna, mas o personagem não é cientificista.
B — Errada: exagera ao apresentar Dom Quixote como defensor acrítico da guerra santa e dos valores cristãos tradicionais. Cervantes ironiza esses ideais; o foco é a literatura de cavalaria e seu descompasso com a realidade, não a defesa de cruzadas.
C — Errada: associa a figura à Antiguidade e à devoção aos deuses — leitura anacrônica. A obra é fruto das disputas culturais do início da Idade Moderna (século XVII), não do final da Antiguidade.
E — Errada: afirma que os valores cavaleirescos ainda guiam o homem moderno. A proposta de Cervantes é justamente mostrar que esses valores estão esgotados socialmente; a obra problematiza sua continuidade, não a celebra.
Fontes sugeridas: Miguel de Cervantes, Dom Quixote (1605/1615); verbete "Don Quixote" na Encyclopaedia Britannica; estudos sobre a formação do romance moderno (ex.: análises de Perry Anderson, Peter Burke).
Estratégia prática: busque termos-chave no enunciado (ex.: "ultrapassado", "passagem do medieval para o moderno", "inadequado à época") — eles costumam indicar a alternativa correta.
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