No terceiro parágrafo do texto, o modo como as reflexões são feitas pelo articulista – usando interrogações, exclamações e diversas marcas de oralidade – indica que, em relação às funções da linguagem, o texto
Geopolítica do coração
Existem duas Copas paralelas: aquela em que o Brasil joga – e você sofre, grita, esperneia – e aquela em que as outras seleções jogam – e você pode se dar ao luxo de assistir tranquilamente do seu sofá, encantado com as belezas e surpresas do esporte bretão. O único problema dessa segunda modalidade de fruição desportiva é que nem sempre é fácil escolher o time para o qual torcer.
Tendo sido criado por um torcedor fiel do Linense, com moderadas convicções de esquerda, cresci
acreditando que uma das graças do futebol é ver o mais fraco vencer. Chile e Espanha, portanto, foi bico: colonizados contra colonizadores, atuais campeões do mundo contra um time que jamais ganhou uma Copa. Até fui a um restaurante chileno, gritei "Chi-chi-chi-le-le-le" e fiquei com os olhos marejados na hora do hino.
Diante de Holanda e Austrália, porém, minha opção preferencial pelos pobres subiu no telhado. Como não querer ver a máquina que havia metido cinco na Espanha funcionando perfeitamente, de novo? Entre Robben e a retranca, ficaria com a retranca? Tive que me submeter a um rápido tour de force para aceitar meus pendores alaranjados: a Holanda é um país liberal, pensei, os caras esconderam a Anne Frank dos nazistas durante anos, que coisa linda é “A Noite Estrelada", do Van Gogh. Ótimo:
mas aos 21 minutos do primeiro tempo, quando Cahill pegou na veia e mandou pro fundo da rede, abandonei imediatamente a laranja mecânica e abracei a esquadra amarela. Que Holanda, que nada! Eles liberam o consumo de maconha, mas não o plantio, incentivando o tráfico em outros países! Entregaram a Anne Frank pros nazistas! O Van Gogh morreu sem orelha e na miséria! Go, Aussies! (...)
Antonio Prata. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/antonioprata/... geopolitica-do-coracao.shtml. Acesso em 25.06.14.
Existem duas Copas paralelas: aquela em que o Brasil joga – e você sofre, grita, esperneia – e aquela em que as outras seleções jogam – e você pode se dar ao luxo de assistir tranquilamente do seu sofá, encantado com as belezas e surpresas do esporte bretão. O único problema dessa segunda modalidade de fruição desportiva é que nem sempre é fácil escolher o time para o qual torcer.
Tendo sido criado por um torcedor fiel do Linense, com moderadas convicções de esquerda, cresci
acreditando que uma das graças do futebol é ver o mais fraco vencer. Chile e Espanha, portanto, foi bico: colonizados contra colonizadores, atuais campeões do mundo contra um time que jamais ganhou uma Copa. Até fui a um restaurante chileno, gritei "Chi-chi-chi-le-le-le" e fiquei com os olhos marejados na hora do hino.
Diante de Holanda e Austrália, porém, minha opção preferencial pelos pobres subiu no telhado. Como não querer ver a máquina que havia metido cinco na Espanha funcionando perfeitamente, de novo? Entre Robben e a retranca, ficaria com a retranca? Tive que me submeter a um rápido tour de force para aceitar meus pendores alaranjados: a Holanda é um país liberal, pensei, os caras esconderam a Anne Frank dos nazistas durante anos, que coisa linda é “A Noite Estrelada", do Van Gogh. Ótimo:
mas aos 21 minutos do primeiro tempo, quando Cahill pegou na veia e mandou pro fundo da rede, abandonei imediatamente a laranja mecânica e abracei a esquadra amarela. Que Holanda, que nada! Eles liberam o consumo de maconha, mas não o plantio, incentivando o tráfico em outros países! Entregaram a Anne Frank pros nazistas! O Van Gogh morreu sem orelha e na miséria! Go, Aussies! (...)
Antonio Prata. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/antonioprata/... geopolitica-do-coracao.shtml. Acesso em 25.06.14.
Gabarito comentado
Tema central: Funções da linguagem e interpretação de texto. A questão explora como recursos linguísticos – interrogações, exclamações, marcas de oralidade – revelam intenções comunicativas (sentimentos e tentativa de envolver/receptores) no texto.
Alternativa correta: E) mistura as funções emotiva e conativa, chegando a se referir aos australianos como receptores da mensagem.
Justificativa: O texto evidencia função emotiva (expressão de sentimentos e opiniões do autor – “Tive que me submeter…”, exclamações, interjeições) e função conativa (apelo ao receptor, como no uso de “Go, Aussies!”, expressão empregada para incentivar os australianos). De acordo com Jakobson e gramáticas de referência (Bechara; Cunha & Cintra), funções emotiva (centrada no emissor, 1ª pessoa, pontuação expressiva) e conativa (voltada ao interlocutor, apelos e imperativos) podedem coexistir em um texto. A análise do trecho mostra essas marcas com clareza.
Estratégia: Observe palavras em 1ª pessoa, sinais de exclamação/interrogação e trechos onde o autor “puxa” o interlocutor diretamente para o discurso ou usa frases de incentivo.
Análise das alternativas incorretas:
A) Função fática: Incorreta. Visa apenas manter o canal de comunicação. No texto, não há preocupação em testar/reafirmar o contato com o leitor, mas sim expressar emoções/reflexões.
B) Perguntas retóricas desconsiderando o receptor: Errada. As perguntas aproximam o leitor do raciocínio do autor e expressam dúvidas/emoções, não o excluem da mensagem.
C) Função referencial: Incorreta. A narração objetiva é secundária; o foco é a emoção/opinião do autor, não a informação factual do gol.
D) Função metalinguística: Errada. Não há explicação sobre linguagem/código; a menção a Van Gogh é argumento e não exemplificação de código linguístico.
Resumo de regra: Função emotiva: Expressa o “eu”, emoções, avaliações (marcas: 1ª pessoa, sinais expressivos). Função conativa: Dirige-se ao “tu/você”, tenta alterar o comportamento/opinião do leitor (marcas: vocativo, imperativo, apelos diretos).
Dica de prova: Sempre identifique a quem o texto parece querer convencer, emocionar ou incentivar. Isso diferencia facilmente as funções.
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