A relação entre aspectos físicos e patologias morais
foi uma tônica da Medicina Criminal. Estudiosos como
o italiano Cesare Lombroso (1835-1909) fizeram sucesso
ao relacionar a forma do crânio e do rosto ao caráter das
pessoas, sugerindo que a criminalidade seria inata. Aqui
no Brasil, ficou famoso o requerimento para estudar a
cabeça do líder de Canudos, o beato Antônio Conselheiro,
que foi decepada e enviada ao Dr. Nina Rodrigues.
Acerca do impacto social dessas teorias consideradas
científicas no inicio do século XX, assinale a alternativa
correta:
TEXTO 5
Raios de sol ao meio
Mais uma vez ele aparecia na minha frente como
se tivesse vindo do nada. Seus olhos eram grandes e
negros e pareciam ter nascido bem antes dele. Suas
espinhas se agigantavam conforme o ângulo de que
eram vistas. Sua orelha era algo indescritível. Além
de orelha ela era disforme, meio redonda e meio
achatada nas pontas. Ela era meio várias coisas. Uma
orelha monstro. A boca era alguma coisa que só estava
ali para cumprir seu espaço no rosto. Era boca
porque estava exatamente no lugar da boca. E era a
segunda vez que ele me mobilizava. Mas no conjunto
de elementos díspares reinava uma sensualidade ímpar que me tirava de mim sem que eu soubesse
navegar no outro que em mim surgia. De mim não
sabia entender o que emanava para ele em toda a
sua estranha vastidão de patologia visual. No meio
sol da meia-noite as coisas se anunciaram e antes
que a madrugada avançasse a lua em sua metade
escondida ardeu com um olhar malicioso e sorriu.
(GONÇALVES, Aguinaldo. Das estampas.
São Paulo: Nankin, 2013. p. 177.)
TEXTO 5
Raios de sol ao meio
Mais uma vez ele aparecia na minha frente como se tivesse vindo do nada. Seus olhos eram grandes e negros e pareciam ter nascido bem antes dele. Suas espinhas se agigantavam conforme o ângulo de que eram vistas. Sua orelha era algo indescritível. Além de orelha ela era disforme, meio redonda e meio achatada nas pontas. Ela era meio várias coisas. Uma orelha monstro. A boca era alguma coisa que só estava ali para cumprir seu espaço no rosto. Era boca porque estava exatamente no lugar da boca. E era a segunda vez que ele me mobilizava. Mas no conjunto de elementos díspares reinava uma sensualidade ímpar que me tirava de mim sem que eu soubesse navegar no outro que em mim surgia. De mim não sabia entender o que emanava para ele em toda a sua estranha vastidão de patologia visual. No meio sol da meia-noite as coisas se anunciaram e antes que a madrugada avançasse a lua em sua metade escondida ardeu com um olhar malicioso e sorriu.
(GONÇALVES, Aguinaldo. Das estampas. São Paulo: Nankin, 2013. p. 177.)
Gabarito comentado
Resposta correta: Alternativa A
1. Tema central: trata-se do impacto social da chamada Medicina Criminal (criminal anthropology) — correntes como as de Cesare Lombroso — que associavam traços físicos à propensão ao crime. No Brasil, essas ideias influenciaram peritos, imprensa, polícia e políticas públicas, estigmatizando grupos sociais.
2. Resumo teórico: Lombroso propôs o conceito de "atavismo" (século XIX) — traços corporais refletiriam uma inferioridade inata. No Brasil, pesquisadores como Nina Rodrigues adotaram e adaptaram essas teses, legitimando tratamentos discriminatórios e medidas de controle social sobre pobres, negros, indígenas e imigrantes. Fontes úteis: Cesare Lombroso, L'uomo delinquente (1876); estudos de história da ciência e da medicina no Brasil sobre Nina Rodrigues.
3. Justificativa da alternativa A: A alternativa A está correta porque demonstra o efeito prático dessas teorias: moradias, aparência e costumes populares foram patologizados. Isso alimentou políticas higienistas, estigmas na imprensa e ações policiais e médicas que marcaram famílias e bairros pobres — evidência ampla na historiografia da medicina, das ciências sociais e da antropologia criminal brasileira.
4. Por que as outras alternativas estão erradas:
B (incorreta): afirma que as teorias ficaram restritas a poucos professores. Na realidade, transbordaram universidades e peritagem: imprensa, polícia, hospitais e políticas públicas divulgaram e aplicaram essas ideias.
C (incorreta): vincula as teorias diretamente à Revolta da Vacina (1904). A Revolta decorreu sobretudo da vacinação obrigatória, da falta de comunicação e da resistência popular a medidas coercitivas de saúde pública — não de debates de Medicina Criminal sobre a fisiognomia.
D (incorreta): sugere que as teorias favoreceram uma visão idealizada da vida rural. Pelo contrário, elas patologizaram setores urbanos populares e serviram para justificar intervenções e exclusões na cidade, não para enaltecer o campo como contraponto.
Dica de prova: Busque palavras-chave no enunciado (“Medicina Criminal”, “Lombroso”, “impacto social”) e relacione-as a consequências sociais concretas — estigmatização, políticas higienistas, perícias e imprensa — para eliminar alternativas que desviem do foco.
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