Assinale a alternativa em que a reformulação do trecho transcrito entre parênteses implique erro ou mudança de sentido.
A questão referem-se ao texto a seguir. Leia-o atentamente antes de responder a elas.
O PEIXE NEMO E O MAIS MÉDICOS
Rogério Cezar de Cerqueira Leite
1º § A indústria farmacêutica apresenta uma característica peculiar. Ela vende para um, o doente, que é quem paga, mas quem escolhe o medicamento é outro, o médico.
2º § Essa condição fez com que a indústria farmacêutica internacional desenvolvesse uma estratégia “sui generis” que, não obstante, imita um comportamento comum entre animais inferiores, a simbiose.
3º § Observo em meu aquário o peixe-palhaço percola Nemo colher um vôngole e levá-lo à boca de “sua” anêmona, antes mesmo que ele próprio se alimente. Em troca, recebe da anêmona – um animal com tentáculos venenosos – proteção contra eventuais predadores. Essa troca de favores chamamos simbiose.
4º § A promoção de medicamentos se faz de porta em porta, nos consultórios médicos. Todo mundo sabe que os inúmeros congressos médicos nos mais pitorescos locais do mundo, de Paris a Cancun, são patrocinados pelas empresas produtoras de medicamentos, inclusive com passagens e estadia pagas.
5º § O que não era percebido até recentemente é a importância e o volume de recursos repassados diretamente a médicos como remuneração pela promoção de medicamentos. Pois bem, embora sejam esses recursos diminutos em comparação com os gastos globais dessas empresas com propaganda, em que se incluem as conferências técnico-turísticas, elas ultrapassam só nos Estados Unidos uma centena de milhões de dólares por ano.
6º § E onde fica a ética? E o ensinamento de Hipócrates? A prática quotidiana e a necessidade de sobrevivência geram padrões de comportamento que, por sua vez, estabelecem dogmas, tabus, que enfim são incorporados como princípios éticos à cultura de cada sociedade.
7º § Aos poucos, os médicos acabam por sepultar sua própria percepção dos conflitos de interesse que regem essa maléfica simbiose. Três empresas multinacionais do setor farmacêutico foram há pouco multadas e 18 de seus funcionários presos na China por adotarem essa prática.
8º § Recentemente, o médico britânico e Nobel de medicina Richard J. Roberts acusou as farmacêuticas de evitar a cura em prol da dependência, um fato já conhecido. Se você cura o doente, você deixa de faturar. Se você simplesmente o mantém vivo, você fatura indefinidamente. Uma estratégia também adotada por animais parasitas. Quantas corporações médicas denunciaram essa condição maléfica?
9º § Médicos e suas associações já se opuseram, se não publicamente, pelo menos nos bastidores, a iniciativas positivas do Estado. Isso ocorreu com a instalação do SUS e com as poucas iniciativas de produção de medicamentos em laboratórios estatais. Agora acontece com o programa Mais Médicos, que, para as condições atuais da saúde no Brasil, é imprescindível. Tudo que pareça interferir com a tradicional simbiose médico-produtoras de medicamentos, mesmo que tangencialmente, passa a ser hostilizado.
10º § Quantos dos médicos que se declaram contra o programa repudiaram ofertas de passagens e estadias em gostosas conferências? Quantos colocam o interesse da sociedade brasileira acima dos seus próprios e de sua corporação?
(Extraído de: Folha de S.Paulo, 19 nov. 2013.)
O PEIXE NEMO E O MAIS MÉDICOS
Rogério Cezar de Cerqueira Leite
1º § A indústria farmacêutica apresenta uma característica peculiar. Ela vende para um, o doente, que é quem paga, mas quem escolhe o medicamento é outro, o médico.
2º § Essa condição fez com que a indústria farmacêutica internacional desenvolvesse uma estratégia “sui generis” que, não obstante, imita um comportamento comum entre animais inferiores, a simbiose.
3º § Observo em meu aquário o peixe-palhaço percola Nemo colher um vôngole e levá-lo à boca de “sua” anêmona, antes mesmo que ele próprio se alimente. Em troca, recebe da anêmona – um animal com tentáculos venenosos – proteção contra eventuais predadores. Essa troca de favores chamamos simbiose.
4º § A promoção de medicamentos se faz de porta em porta, nos consultórios médicos. Todo mundo sabe que os inúmeros congressos médicos nos mais pitorescos locais do mundo, de Paris a Cancun, são patrocinados pelas empresas produtoras de medicamentos, inclusive com passagens e estadia pagas.
5º § O que não era percebido até recentemente é a importância e o volume de recursos repassados diretamente a médicos como remuneração pela promoção de medicamentos. Pois bem, embora sejam esses recursos diminutos em comparação com os gastos globais dessas empresas com propaganda, em que se incluem as conferências técnico-turísticas, elas ultrapassam só nos Estados Unidos uma centena de milhões de dólares por ano.
6º § E onde fica a ética? E o ensinamento de Hipócrates? A prática quotidiana e a necessidade de sobrevivência geram padrões de comportamento que, por sua vez, estabelecem dogmas, tabus, que enfim são incorporados como princípios éticos à cultura de cada sociedade.
7º § Aos poucos, os médicos acabam por sepultar sua própria percepção dos conflitos de interesse que regem essa maléfica simbiose. Três empresas multinacionais do setor farmacêutico foram há pouco multadas e 18 de seus funcionários presos na China por adotarem essa prática.
8º § Recentemente, o médico britânico e Nobel de medicina Richard J. Roberts acusou as farmacêuticas de evitar a cura em prol da dependência, um fato já conhecido. Se você cura o doente, você deixa de faturar. Se você simplesmente o mantém vivo, você fatura indefinidamente. Uma estratégia também adotada por animais parasitas. Quantas corporações médicas denunciaram essa condição maléfica?
9º § Médicos e suas associações já se opuseram, se não publicamente, pelo menos nos bastidores, a iniciativas positivas do Estado. Isso ocorreu com a instalação do SUS e com as poucas iniciativas de produção de medicamentos em laboratórios estatais. Agora acontece com o programa Mais Médicos, que, para as condições atuais da saúde no Brasil, é imprescindível. Tudo que pareça interferir com a tradicional simbiose médico-produtoras de medicamentos, mesmo que tangencialmente, passa a ser hostilizado.
10º § Quantos dos médicos que se declaram contra o programa repudiaram ofertas de passagens e estadias em gostosas conferências? Quantos colocam o interesse da sociedade brasileira acima dos seus próprios e de sua corporação?
(Extraído de: Folha de S.Paulo, 19 nov. 2013.)
(O que não era percebido até recentemente é a importância e o volume de recursos repassados diretamente a médicos como remuneração pela promoção de medicamentos. – 5º §)
(A indústria farmacêutica apresenta uma característica peculiar. – 1º §)
(Se você cura o doente, você deixa de faturar. – 8º §)
(Tudo que pareça interferir com a tradicional simbiose médico-produtoras de medicamentos, mesmo que tangencialmente, passa a ser hostilizado. – 9º §)
Gabarito comentado
Gabarito comentado — Língua Portuguesa / Interpretação de Texto (Vestibular)
Assunto central: Interpretação e reescritura de trechos, focando em semântica (manutenção do sentido) e precisão vocabular. A questão exige perceber se a reescrita propõe erro ou mudança de sentido em relação ao texto original — habilidade clássica cobrada em vestibulares.
Alternativa correta: D
Justificativa:
A alternativa D muda o sentido do trecho original ao alterar elementos essenciais:
- “Tudo que pareça interferir” (no texto) utiliza o subjuntivo “pareça”, indicando dúvida ou possibilidade. Já “tudo quanto interfira” (na reescrita) sugere interferência real e efetiva, mudando o sentido, pois reforça certeza.
- “Mesmo que tangencialmente” significa mesmo que de modo periférico, indireto. Alterar para “ainda que aparentemente” desloca o foco para a superficialidade ou aparência, o que é diferente de grau de envolvimento.
- “Passa a ser hostilizado” (ação clara) e “passa a ser alvo de hostilidades” (posição menos ativa) também adicionam uma diferença interpretativa.
Segundo Bechara (Moderna Gramática), ao reformular um texto, é obrigatório zelar pelo valor semântico e pelo grau de modificação linguística. A alternativa D viola esse princípio.
Análise das alternativas incorretas:
A) Equivale ao original: “não era percebido” ⇄ “não se percebia”; “até recentemente” ⇄ “até há pouco”; “como” ⇄ “a título de”. Sem alteração relevante de sentido.
B) “Indústria farmacêutica” e “empresas produtoras de medicamentos”; “característica peculiar” e “traço sui generis” — sinônimos contextuais.
C) Uso correto do “se” indeterminando o sujeito. “Faturar” (obter ganhos) ≈ “lucrar”. Não compromete o sentido.
Estratégia: Em provas, fique atento a mudanças de tempo/modalidade verbal, a troca de advérbios/conjunções e a diferenças nos graus de certeza. Essa foi a “pegadinha” da alternativa D.
Dica final: Sempre confronte trecho original e reformulação, observando modificadores, modo verbal e palavras-chave. Segundo Cunha & Cintra, toda mudança nestes elementos pode implicar alteração semântica.
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