Com base no texto I e nos seus conhecimentos sobre a
escravidão negra no Brasil durante a segunda metade do
século XIX, é CORRETO afirmar:
TEXTO I“ ...na cidade de Óbidos, em 11 de janeiro de 1854 [...]
Raimunda, “24 anos de idade, crioula, bem retinta, um tanto
baixa, bem figurada, muito humilde” [...] estava fugida com
seu companheiro José Moisés, “de 26 anos de idade, cafuz
bastante fornido do corpo, estatura regular, mal encarado,
olhos pequenos, e fundos”. Os dois fugiram com a ajuda do
forro Antônio Maranhoto, natural do Maranhão que [...antes]
“foi marinheiro de embarcação de guerra”[...]. Em fevereiro
de 1861, a escrava Benedita, “cafuza, natural de Óbidos,
com falta de dentes na frente, cabelos cacheados, cheia de
corpo, cara risonha” fugiu na companhia do soldado mulato
Francisco Lima. Levou uma rede nova, um balaio e um baú
de cedro contendo “um par de chinela, um fio de conta de
ouro, uma camisa de chita amarela, uma saia de cambraia
branca com três folhos e duas camisas brancas”. Em abril do
mesmo ano, a escrava Maria, “crioula retinta, magra, alta,
olhos e beiços grandes” fugiu com Hipólito, “crioulo bem
retinto, barbado, falta de dentes na parte superior”. Maria
e Hipólito fugiram pouco tempo depois do falecimento de
seu senhor Antônio Guerra, diretor de índios no rio Madeira.
A viúva pedia sua captura e ainda oferecia 100 mil réis de
recompensa por cada escravo.”
CAVALCANTI, Y.R.O; SAMPAIO, P.M. Histórias de Joaquinas, Mulheres,
Escravidão e Liberdade (Brasil, Amazonas: séc.XIX). Revista Afro-Ásia, 46.
p.97-120. Disponível em < http://www.scielo.br/pdf/afro/n46/a03n46.pdf>
Gabarito comentado
Tema central: Fugidas de escravas e o contexto legal da escravidão no Brasil na segunda metade do século XIX. Para resolver, é preciso relacionar fontes primárias (atos de fuga, anúncios, relatos) ao quadro legal (Lei Euzébio de Queiroz, Lei do Ventre Livre, Lei Áurea) e às práticas sociais na Amazônia.
Resumo teórico: A Lei Euzébio de Queiroz (1850) proibiu o tráfico transatlântico de escravos — isto é, a entrada de novos escravizados vindos de fora — mas não aboliu a escravidão interna. A Lei do Ventre Livre (1871) declarou livres os filhos de escravas nascidos a partir daquela data, sem libertar os escravos já existentes. A abolição plena só veio com a Lei Áurea (1888). Enquanto isso, fugas, redes de apoio locais e relações interétnicas continuaram sendo práticas comuns, inclusive na Amazônia (ver Cavalcanti & Sampaio, Revista Afro-Ásia).
Justificativa da alternativa D: A alternativa D afirma corretamente que, em 1850, a Lei Euzébio de Queiroz proibiu o tráfico internacional e, portanto, a importação de escravos, mas que a manutenção da escravidão interna permaneceu legal. Isso corresponde ao quadro legal histórico: a proibição do tráfico não equivalia à libertação dos cativos já existentes nem à proibição do comércio interno.
Análise das alternativas incorretas:
A — Incorreta. Reduzir fugas de mulheres à “má influência masculina” é simplista. Mulheres escravas atuavam tanto no serviço doméstico quanto na produção (especialmente em áreas rurais e na Amazônia), e fugas eram motivadas por múltiplos fatores: busca por liberdade, redes de fuga, casamentos informais, condições de vida e morte do senhor.
B — Incorreta. O Amazonas não foi pioneiro no fim da escravidão por não haver mais escravos; ao contrário, o trabalho escravo persistiu nas regiões amazônicas até o final do século XIX. A ausência de tráfico internacional não significou ausência de escravidão local.
C — Incorreta. A Lei do Ventre Livre (1871) não libertou “milhares de filhos de escravos” de imediato de modo a reduzir substancialmente as fugas de mulheres. Ela garantia liberdade aos nascidos após 1871, mas a situação das mulheres escravas adultas permaneceu inalterada e as fugas continuaram por décadas.
E — Incorreta. Apesar de haver variações no trato cotidiano, não se pode generalizar que senhoras davam “cuidados especiais” ou liberdade plena para constituir família. A família escrava era frequentemente fragilizada por vendas, punições e controle do senhor.
Leis citadas: Lei Euzébio de Queiroz (1850); Lei do Ventre Livre (1871); Lei Áurea (1888). Consulta recomendada: Cavalcanti & Sampaio, Revista Afro-Ásia (uso de arquivos locais sobre fugas na Amazônia).
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