Leia o conto Memórias da afasia, de Moacyr Scliar.
Nos últimos anos de sua vida Mateus descobriu, consternado, que mesmo o seu derradeiro prazer –
escrever no diário – lhe havia sido confiscado pela afasia, que nele se manifestava como
esquecimento de certas palavras. A coisa foi gradual: a princípio, eram poucos os vocábulos que lhe
faltavam. Recorrendo a um de sinônimos, ele conseguia preencher com êxito as lacunas.
Com o decorrer do tempo, porém, acentuou-se o , e o desgosto por este gerado. Foi então
que ele começou a deixar em branco os espaços que não consegue preencher. Era com fascinação
que contemplava esses vazios em meio ao ; tinha certeza de que as letras ali estavam, como
se traçadas com tinta invisível por mão também invisível. Essa existência virtual das palavras não o
afligia, pelo contrário; sabia que o é tão importante quanto o não . No território
da afasia ele encontrava agora uma pátria. Ali recuperaria o seu passado perdido. Ali se uniria
definitivamente àquela que fora seu grande amor, uma linda moça chamada .
Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as seguintes afirmações sobre o conto.
( ) O distúrbio de linguagem de Mateus afeta também o narrador, o que explica os espaços em
branco no texto.
( ) Os espaços em branco no texto constroem a metáfora de uma das principais características da
literatura: as lacunas de interpretação.
( ) O título do conto constrói o paradoxo da afasia, que se caracteriza pela perda da memória.
( ) Os vazios no texto apontam um dos traços da recuperação do passado, que se constrói a partir
do que se lembra e do que se esquece.
A sequência correta de preenchimento dos parênteses, de cima para baixo, é
Gabarito comentado
Gabarito: E) V – V – V – V.
Tema central: A questão aborda recursos estilísticos do conto “Memórias da afasia”, de Moacyr Scliar, enfatizando o significado dos espaços em branco, a relação entre afasia (distúrbio da linguagem) e memória, e a interpretação dos vazios na literatura.
Análise das afirmações:
1) (V) O distúrbio de linguagem afeta o narrador.
Os espaços em branco no texto aparecem porque a história é narrada da perspectiva de Mateus, demonstrando como sua perda de palavras impacta não apenas suas memórias, mas também o próprio texto. Trata-se de um recurso metalinguístico, onde a limitação do personagem afeta a construção narrativa.
2) (V) Os espaços criam metáfora das lacunas interpretativas.
Na literatura, lacunas convidam o leitor a participar da criação do significado. Citando Anatol Rosenfeld, "a arte sugere, não diz tudo". Aqui, o leitor é chamado a preencher os vazios – uma marca forte do literário contemporâneo e pós-moderno.
3) (V) O título constrói o paradoxo da afasia como perda de memória.
O título “Memórias da afasia” já indica oposição: memória pressupõe lembrar, e afasia, esquecer ou perder partes da linguagem. Essa contradição ilustra, de modo subjetivo, o drama de Mateus.
4) (V) Vazios apontam a recuperação fragmentada do passado.
A memória, segundo Marcel Proust, constrói-se “por aquilo que se lembra e pelo que se esquece”. Os espaços vazios simbolizam não só o esquecimento, mas também a reconstrução subjetiva e lacunar das lembranças, temática constante na literatura moderna.
Análise das alternativas incorretas:
Qualquer opção diferente da alternativa E apresenta pelo menos uma afirmação inexplicavelmente falsa. Por exemplo, negar que os espaços em branco sejam parte do sentido da literatura ou dizer que não há paradoxo no título indica desconhecimento da proposta estilística do conto e de recursos modernos de linguagem.
Estratégias de prova: Atenção em questões que usam conceitos como “lacunas”, “interpretação”, “paradoxo” e “memória”. Verifique se todos os elementos do texto foram compreendidos no sentido literário, e evite generalizações precipitadas.
Resumo: O conto utiliza os vazios para simbolizar a experiência da afasia e convidar o leitor a refletir sobre memória e linguagem. Todas as afirmações são verdadeiras, justificando a alternativa E como correta.
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