Na frase “os cientistas não precisarão mais dissecá-las para
saber como reagem às substâncias que eles vivem lhes
injetando” (1°
parágrafo), o verbo “viver” foi empregado com
a mesma acepção que se verifica em:
Leia a crônica de Ruy Castro para responder à questão.
Como um tumor
Cientistas da Universidade de Hiroshima, no Japão, criaram uma rã transparente, cujas intimidades ficam expostas e
podem ser perfeitamente observadas pelo lado de fora. Com
isso, salvaram-se gerações inteiras de rãs, porque os cientistas não precisarão mais dissecá-las para saber como reagem
às substâncias que eles vivem lhes injetando. Outra vantagem é a de que poderão acompanhar uma rã por todo o seu
ciclo de vida — o ciclo de vida da rã, claro, não dos cientistas. Para chegar à rã transparente, os japoneses, craques em
engenharia genética, levaram anos cruzando exemplares de
rãs albinas. E agora partiram para aperfeiçoá-la: vão fazer
com que qualquer corpo estranho que apareça dentro da rã
se acenda. Um tumor, por exemplo. Já no Marrocos, também nesta semana, os cientistas da
Universidade de Rabat conseguiram com que um pato nascesse no ovo de uma galinha. Se isso lhe parece meio mixo
(afinal, no mesmo dia, em Recife, uma avó deu à luz seus
próprios netos, lembra-se?), saiba que a proeza marroquina
é considerada mais importante, pelo fato de os palmípedes e
os galináceos constituírem famílias diferentes. Por coincidência, é o que se está discutindo em Brasília
nos últimos dias: um político gerado num ovo destinado a
palmípedes pode se baldear no meio do mandato para o terreiro dos galináceos, por ver neste mais oportunidades para
ciscar? Em princípio, não. Mas e se o eleitor só quiser saber
do pinto ou do pato, e não do ovo de onde ele saiu? Essas mudanças nunca são de graça. Assim, sugiro convocar os japoneses para cruzar nossos políticos com as rãs
albinas e, com isso, criar políticos transparentes. Quando
um deles recebesse um corpo estranho — uma propina, por
exemplo —, esse corpo se acenderia. Como um tumor.
(Crônicas para ler na escola, 2010.)
Gabarito comentado
▶ Tema central: Semântica verbal – Análise do sentido contextual do verbo “viver” e sua relação com ações habituais ou frequentes, conforme a norma-padrão.
▶ Justificativa da alternativa correta:
No trecho exemplificado, o verbo “viver” em “os cientistas não precisarão mais dissecá-las para saber como reagem às substâncias que eles vivem lhes injetando” tem valor aspectual de frequência/habitualidade: indica que a ação de injetar ocorre repetidas vezes. Esse fenômeno, como explicitam as gramáticas de Bechara e Cunha & Cintra, é comum quando “viver” atua como verbo auxiliar de gerúndio, atribuindo ao processo verbal o sentido de repetição ou constância.
Correta – C) “Diogo vive esquecendo os óculos em casa.”
Aqui, “vive” + gerúndio (“esquecendo”) transmite ação habitual: Diogo costuma esquecer os óculos, logo, o mesmo emprego semântico do texto original.
▶ Análise das alternativas incorretas:
A) “Os velhos é que sabem viver.” – “Viver” com sentido de aproveitar a vida, experiência existencial, não de frequência de ação.
B) “Um bom artista vive para seu trabalho.” – “Viver” manifesta dedicação, finalidade de vida, não se refere a algo repetitivo.
D) “Até quando viverá esta dor?” – “Viverá” indica duração de um estado, projetando-o para o futuro, sem o traço da repetição frequente.
E) “As classes mais pobres vivem exclusivamente do salário.” – Emprego indicando meio de subsistência, ou seja, como mantêm a vida/finanças, não há noção de ação repetida.
▶ Estratégia de resolução: Sempre atente para o contexto em que o verbo aparece. Nas provas, os verbos auxiliares seguidos de gerúndio geralmente indicam aspecto habitual ou contínuo. Fique atento a pegadinhas: nem todo “viver” implica rotina!
▶ Resumindo a regra (Bechara, Moderna Gramática): “Viver”, como verbo auxiliar + gerúndio, exprime hábitos ou repetição (“vive reclamando”, “vive faltando”), e é nesse uso que se insere a alternativa correta.
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