Questão 9c9f4615-e8
Prova:FAME 2014
Disciplina:Português
Assunto:Interpretação de Textos, Homonímia, Paronímia, Sinonímia e Antonímia

Instrução - Leia o texto 2, relacione-o ao texto 1, Somos uma sociedade injusta e segregacionista, para responder à questão 

Texto 1

Somos uma sociedade injusta e segregacionista

O fenômeno dos centenas de rolezinhos que ocuparam shoppings centers no Rio e em São Paulo suscitaram as mais disparatadas interpretações. 

(...)Eu, por minha parte, interpreto da seguinte forma tal irrupção:

Em primeiro lugar, são jovens pobres, das grandes periferias, sem espaços de lazer e de cultura, penalizados por serviços públicos ausentes ou muito ruins como saúde, escola, infra-estrutura sanitária, transporte, lazer e segurança. Veem televisão cujas propagandas os seduzem para um consumo que nunca vão poder realizar. E sabem manejar computadores e entrar nas redes sociais para articular encontros. Seria ridículo exigir deles que teoricamente tematizem sua insatisfação.

Mas sentem na pele o quanto nossa sociedade é malvada porque exclui, despreza e mantém os filhos e filhas da pobreza na invisibilidade forçada. O que se esconde por trás de sua irrupção? O fato de não serem incluídos no contrato social. Não adianta termos uma "constituição cidadã" que neste aspecto é apenas retórica, pois implementou muito pouco do que prometeu em vista da inclusão social. Eles estão fora, não contam, nem sequer servem de carvão para o consumo de nossa fábrica social (Darcy Ribeiro). Estar incluído no contrato social significa ter garantidos os serviços básicos: saúde, educação, moradia, transporte, cultura, lazer e segurança. Quase nada disso funciona nas periferias. O que eles estão dizendo com suas penetrações nos bunkers do consumo? "Oia nóis na fita"; "nois não tamo parado";"nóis tamo aqui para zoar"(incomodar). Eles estão com seu comportamento rompendo as barreiras do aparheid social.(...)

Continuamos uma Brasilíndia: uma Bélgica rica dentro de uma Índia pobre. Tudo isso os rolezinhos denunciam, por atos e menos por palavras.Em segundo lugar, eles denunciam a nossa maior chaga: a desigualdade social cujo verdadeiro nome é injustiça histórica e social. Releva constatar que, com as políticas sociais do governo do PT, a desigualdade diminuiu, pois, segundo o IPEA, os 10% mais pobres tiveram entre 2001-2011 um crescimento de renda acumulado de 91,2%, enquanto a parte mais rica cresceu 16,6%. Mas esta diferença não atingiu a raiz do problema, pois o que supera a desigualdade é uma infraestrutura social de saúde, escola, transporte, cultura e lazer que funcione e seja acessível a todos. Não é suficiente transferir renda; tem que criar oportunidades e oferecer serviços, coisa que não foi o foco principal no Ministério de Desenvolvimento Social.

O "Atlas da Exclusão Social" de Márcio Poschmann (Cortez 2004) nos mostra que há cerca de 60 milhões de famílias no Brasil, das quais cinco mil famílias extensas detém 45% da riqueza nacional. Democracia sem igualdade, que é seu pressuposto, é farsa e retórica. Os rolezinhos denunciam essa contradição. Eles entram no "paraíso das mercadorias" vistas virtualmente na TV para vê-las realmente e senti-las nas mãos. Eis o sacrilégio insuportável pelos donos dos shoppings. Eles não sabem dialogar, chamam logo a polícia para bater e fecham as portas a esses bárbaros. Sim, bem o viu T.Todorov em seu livro "Os novos bárbaros": os marginalizados do mundo inteiro estão saindo da margem e indo rumo ao centro para suscitar a má consciência dos "consumidores felizes" e lhes dizer: esta ordem é ordem na desordem. Ela os faz frustrados e infelizes, tomados de medo, medo dos próprios semelhantes que somos nós.

Por fim, os rolezinhos não querem apenas consumir. Não são animaizinhos famintos. Eles têm fome sim, mas fome de reconhecimento, de acolhida na sociedade, de lazer, de cultura e de mostrar o que sabem: cantar, dançar, criar poemas críticos, celebrar a convivência humana. E querem trabalhar para ganhar sua vida. Tudo isso lhes é negado, porque, por serem pobres, negros, mestiços sem olhos azuis e cabelos loiros, são desprezados e mantidos longe, na margem.

Esse tipo de sociedade pode ser chamada ainda de humana e civilizada? Ou é uma forma travestida de barbárie? Esta última lhe convém mais. Os rolezinhos mexeram numa pedra que começou a rolar. Só parará se houver mudanças.

BOFF, Leonardo. Jornal Zero Hora. 28 jan. 2014. (adaptado). Disponível em: <http://goo.gl/4UeRbD>. Acesso em 05 abr. 2014.



Texto 2


                        Decifrando os rolezinhos


“Note-se que nas jornadas de junho os jovens se manifestaram nas ruas, que é o local mais adequado para esse tipo de mobilização. Não houve, em seu primeiro momento, nenhuma conotação anticapitalista, mas, ao contrário, uma indignação apartidária com os governos federal, estaduais e municipais pela péssima qualidade dos serviços públicos. Ademais, havia uma clara insatisfação com os partidos políticos e os movimentos sociais organizados.

Agora há uma diferença essencial. As manifestações estão sendo feitas em shoppings, que são locais privados, empresariais. Isto é, os manifestantes, mesmo nos genuínos rolezinhos, apesar de gostarem de roupas de grife, já se dirigem a estabelecimentos privados apagando a distinção entre o público e o privado. De um lado, identificam-se com a economia de mercado e o consumo, procurando ter mais de seus produtos; são pró- capitalistas nessa perspectiva. De outro, não respeitam a propriedade privada”.

ROSENFIELD, Denis. Decifrando os rolezinhos. O Estado de São Paulo. 27 jan. 2014.(fragmento). Disponível em : < http://goo.gl/iUbWMG> .Acesso em 13 abr.2014.


Ao relacionar os pontos de vista dos dois textos, é CORRETO afirmar que

A
o texto 1 define rolezinhos como atos de protestos contra o consumismo e o texto 2 considera os rolezinhos uma manifestação dúbia.
B
o texto 1 apresenta a reação dos shoppings aos rolezinhos como segregacionista e o texto 2 considera a propriedade privada inalienável.
C
o texto 1 considera os rolezinhos como protestos contra a desigualdade social e o texto 2 entende que apenas como locais públicos, os shoppings podem receber manifestações.
D
o texto 1 critica o consumismo dos rolezinhos e o texto 2 considera o consumismo dos rolezinhos como forma de protesto contra a propriedade privada.

Gabarito comentado

P
Priscila CoutinhoMonitor do Qconcursos

Gabarito Comentado – Interpretação de Textos (Comparação de Pontos de Vista)

Tema central: Esta questão exige habilidade de interpretação comparativa entre textos argumentativos, foco fundamental em vestibulares e concursos. O candidato deve identificar opiniões, argumentos e posições dos autores sobre um mesmo fenômeno social – os “rolezinhos” – e compreender como cada um enxerga esse movimento diante da sociedade e da propriedade privada.

Justificativa da alternativa correta (B):

A alternativa B afirma que o texto 1 apresenta a reação dos shoppings como segregacionista, e o texto 2 ressalta o valor da propriedade privada. Veja:

  • No texto 1, BOFF descreve os rolezinhos como resposta à exclusão social, criticando a postura dos shoppings de fechar portas e chamar a polícia, prática vista como segregacionista.
  • No texto 2, ROSENFIELD diferencia os espaços públicos dos privados, destacando que as manifestações em shoppings confrontam o princípio da propriedade privada, considerada por ele inalienável.

Estratégia: Ao comparar textos, observe sempre as palavras e frases que expressam juízo de valor (por exemplo, “segregacionista”, “não respeitam a propriedade privada”), além do contexto argumentativo de cada autor, conforme orientações de Koch & Elias.

Análise das alternativas incorretas:

A) Errada, pois o texto 1 não vê os rolezinhos como protesto contra consumismo, e o texto 2 não os define como manifestação “dúbia”.

C) Parcialmente correta sobre a denúncia da desigualdade social, mas o texto 2 não afirma que apenas locais públicos podem receber manifestações; apenas assinala a diferença entre espaço público e privado.

D) Incorreta, pois o texto 1 não critica o consumismo, e o texto 2 não trata o consumismo como protesto contra a propriedade privada: trata das manifestações propriamente.

Dica de prova: Evite assumir interpretações que não estejam fundamentadas explicitamente nos textos. Cuidado com alternativas que ampliam ou distorcem a posição dos autores.

Referências:
Cunha & Cintra, “Nova Gramática do Português Contemporâneo” – sobre coesão e coerência.
Koch & Elias, “Ler e Compreender” – análise comparativa de textos.

Resumo: A alternativa B é correta porque estabelece, de modo fiel, a relação entre os posicionamentos de ambos os autores sobre segregação social e propriedade privada.

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