“Por que sentir piedade, se em vez disso podemos simplesmente ajudar os sofredores? Devemos ser justos e caridosos, mas sem sofrer o que os outros sofrem”.
A argumentação de Cícero sugere que
A questão focaliza uma passagem de um artigo de José Francisco Botelho e uma das ilustrações de Carlo Giovani a esse artigo.
Compaixão Considerada a maior de todas as virtudes por religiões como o budismo e o hinduísmo, a compaixão é a capacidade humana de compartilhar (ou experimentar de forma parcial) os sentimentos alheios — principalmente o sofrimento. Mas a onipresença da miséria humana faz da compaixão uma virtude potencialmente paralisante. Afogados na enchente das dores alheias, podemos facilmente cair no desespero e na inação. Por isso, a piedade tem uma reputação conturbada na história do pensamento: se alguns a apontaram como o alicerce da ética e da moral, outros viram nela uma armadilha, um mero acréscimo de tristeza a um Universo já suficientemente amargo. Porém, vale lembrar que as virtudes, para funcionarem, devem se encaixar umas às outras: quando aliado à temperança, o sentimento de comiseração pelas dores do mundo pode ser um dos caminhos que nos afastam da cratera de Averno*. Dosando com prudência uma compaixão potencialmente infinita, é possível sentirmos de forma mais intensa a felicidade, a nossa e a dos outros — como alguém que se delicia com um gole de água fresca, lembrando-se do deserto que arde lá fora.Isso tudo pode parecer estranho, mas o fato é que a denúncia da compaixão segue um raciocínio bastante rigoroso. O sofrimento — e todos concordam — é algo ruim. A compaixão multiplica o sofrimento do mundo, fazendo com que a dor de uma criatura seja sentida também por outra. E o que é pior: ao passar a infelicidade adiante, ela não corrige, nem remedia, nem alivia a dor original. Como essa infiltração universal da tristeza poderia ser uma virtude? No século 1 a.C., Cícero escreveu: “Por que sentir piedade, se em vez disso podemos simplesmente ajudar os sofredores? Devemos ser justos e caridosos, mas sem sofrer o que os outros sofrem".
* Os romanos consideravam a cratera vulcânica de Averno, situada perto de Nápoles, como entrada para o mundo inferior, o mundo dos mortos, governado por Plutão.
Gabarito comentado
Gabarito comentado:
Tema central: Trata-se de uma questão de interpretação de texto, que exige a análise do sentido e da intenção do autor em um trecho filosófico de Cícero. Trabalha-se aqui a compreensão da ideia principal, o reconhecimento da tese defendida e a avaliação semântica das alternativas.
Justificativa para a alternativa correta (A):
Segundo o fragmento, Cícero questiona a utilidade de apenas sentir piedade ("Por que sentir piedade, se em vez disso podemos simplesmente ajudar os sofredores?") e orienta que sejamos justos e caridosos sem, necessariamente, sofrer como os outros. Ou seja, o texto valoriza a ação concreta de ajudar acima do mero sentimento de pena ou piedade.
Essa leitura está em sintonia com a orientação das gramáticas de referência, como Bechara ("Moderna Gramática Portuguesa"), que ressalta o papel da interpretação atenta ao contexto e às palavras-chave, e de Cunha & Cintra, que recomendam foco na coerência das ideias centrais.
Análise das alternativas incorretas:
B) Afirma que devemos sofrer pelos outros, o que é oposto ao defendido por Cícero. O texto recomenda a caridade sem internalizar o sofrimento, sem culpa atribuída aos que ajudam.
C) Trata-se de uma generalização equivocada: Cícero não despreza os sentimentos humanos, mas propõe que a ajuda é mais eficaz do que a compaixão passiva.
D) O texto não menciona a questão da impossibilidade de sentir o que outro sente. Ele discute a importância do agir, não a empatia propriamente dita.
E) A ideia de que "quem é feliz jamais entenderá a infelicidade alheia" não está presente. A tese não é sobre impossibilidade de compreensão, mas sobre priorizar a ajuda ao sentimento de pena.
Estratégias de resolução: Leia atentamente as perguntas que levam à ação ou à oposição, identifique os termos-chave (como “em vez disso”, “devemos”, “mas sem sofrer”), e sempre fundamente sua escolha na ideia central. Segundo Rocha Lima, foque no eixo semântico do texto para evitar distrações e pegadinhas de alternativas.
Resumindo, a alternativa A é a correta porque expressa com clareza o argumento central do texto: agir em prol do próximo é mais importante do que apenas compadecer-se.
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