Com base no texto, afirma-se:
I. A grande variedade de pronomes presentes no
texto aponta para a existência de pelo menos três
elementos narrativos: Virgília, o narrador Brás
Cubas e o leitor.
II. Expressões como “mais tarde”, “Agora”, “ribas
de uma África juvenil” assinalam a existência
de diferentes planos temporais na narrativa, dos
quais se destacam o momento da enunciação, o
passado recente e o passado mais remoto.
III. O último parágrafo do trecho, ao revelar a causa
da morte do narrador a partir de uma doença
banal, serve de contraponto ao tom poético do
parágrafo anterior.A(s) afirmativa(s) correta(s) é/são
“Caio é um homem, os homens são mortais, logo Caio
é mortal, [esse silogismo] parecera-lhe, durante toda
a sua vida, correto em relação a Caio, mas de modo
algum em relação a ele.”
TOLSTOI, Lev. A morte de Ivan Ilitch. São Paulo:
Editora 34, 2006.
Exceção entre os animais, o homem é o único que
carrega consigo a certeza da sua própria morte.
Esse conhecimento antecipado serve tanto de medida
e restrição para as ambições da vida quanto de
combustível para atos que garantam algum tipo de
imortalidade. De maneira geral, ao defrontar-se com
a morte, o ser humano tem noção dos seus limites e
daquilo que é possível fazer enquanto está vivo. Planos,
viagens, sonhos são marcos postos entre cada
um e seu próprio fim. Nesta prova você se deparará
com textos que refletem sobre esse tema.
Memórias
Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis.
“– “Morto! morto!” dizia consigo.
E a imaginação dela, como as cegonhas que
um ilustre viajante viu desferirem o voo desde o
Ilisso às ribas africanas, sem embargo das ruínas
e dos tempos, – a imaginação dessa senhora também
voou por sobre os destroços presentes até às
ribas de uma África juvenil... Deixá-la ir; lá iremos
mais tarde; lá iremos quando eu me restituir aos
primeiros anos. Agora, quero morrer tranquilamente,
metodicamente, ouvindo os soluços das damas, as
falas baixas dos homens, a chuva que tamborila nas
folhas de tinhorão da chácara, e o som estrídulo de
uma navalha que um amolador está afiando lá fora, à
porta de um correeiro. Juro-lhes que essa orquestra
da morte foi muito menos triste do que podia parecer.
De certo ponto em diante chegou a ser deliciosa. A
vida estrebuchava-me no peito, com uns ímpetos de
vaga marinha, esvaía-se-me a consciência, eu descia
à imobilidade física e moral, e o corpo fazia-se-me
planta, e pedra e lodo, e coisa nenhuma.
Morri de uma pneumonia; mas se lhe disser que
foi menos a pneumonia, do que uma ideia grandiosa
e útil, a causa da minha morte, é possível que o leitor
me não creia, e todavia é verdade. Vou expor-lhe
sumariamente o caso. Julgue-o por si mesmo.”
Gabarito comentado
Gabarito: E
Tema central: A questão avalia recursos de construção narrativa marcantes nas obras do Realismo brasileiro, destacando em Memórias Póstumas de Brás Cubas aspectos como narrador autoconsciente, fragmentação temporal e ironia – traços essenciais do estilo de Machado de Assis.
Conceitos-Chave:
1. Narrador autoconsciente e multiplicidade de vozes: Brás Cubas conversa com o leitor, cita Virgília (personagem) e frequentemente comenta a própria narrativa. Pronomes como “eu”, “lhe” e “leitor” evidenciam três presenças narrativas (narrador, leitora, personagem).
2. Fragmentação Temporal: Expressões como “Agora”, “mais tarde”, “ribas de uma África juvenil” demonstram a habilidade do autor em alternar planos temporais, explorando presente, passado recente e remoto, típico do fluxo de memória característica do narrador pós-morte.
3. Ironia e contraponto: Ao descrever poeticamente o momento da morte para, em seguida, revelar que ela foi causada por uma simples pneumonia, Machado emprega contraponto irônico entre grandiosidade e banalidade, desconstruindo expectativas heroicas.
Análise das alternativas:
I – Correta. Os pronomes mostram “Virgília” (personagem), “narrador” e “leitor”, evidenciando diálogo e metalinguagem.
II – Correta. As indicações temporais sugerem diferentes períodos sendo recuperados na narrativa, comprovando a fragmentação do tempo.
III – Correta. O contraste entre o tom poético do penúltimo parágrafo e o tom prosaico ao tratar da causa da morte é exemplar da ironia de Machado.
Estratégia de prova: Atenção às palavras de oposição (mas, porém), marcadores temporais e mudanças súbitas de registro – todos indícios de ironia, fragmentação temporal e uso de múltiplas vozes.
Erros das alternativas incorretas: As demais opções ignoram afirmações corretas, eliminando elementos essenciais que fundamentam a resposta.
Lembre: Machado de Assis desafia linearidade e certezas. Observe sempre pronomes, vocativos e mudanças de tom para identificar recursos realistas e irônicos em textos literários.
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