Sobre os procedimentos do autor quanto aos recursos de construção, a única
afirmação que NÃO está correta é:
Por que o senhor não escreve coisas poéticas, soltas, gostosas? As crônicas,
antigamente, nos deixavam mais leves, de bem com a vida e o mundo. Agora, tudo o
que a gente lê nos leva para baixo. Está difícil de suportar. Escrevo na manhã de um
domingo. Sete horas. Aquele sol que nos tem castigado, começava a dar sinais de
ardência profunda. Olhei pela porta de vidro do terraço e descobri, maravilhado e
feliz, que a pitangueira plantada em vaso, que chegou há dois anos, estava repleta
de frutos vermelhos, reluzentes, envernizados. Os primeiros. Fiquei admirado. Os
pássaros não tinham descoberto? Aquelas frutinhas tinham se salvado? Chupei uma,
duas três, queria todas, mas precisava guardar para a família, afinal, eram as
primeiras. Pitanga, coisa de infância, do interior. Uma das frutas mais sofisticadas
do Brasil, a meu ver. Antigamente, quando viajávamos pela Varig, ao sair do Recife,
recebíamos um copo de suco fresco de pitanga, perfumado. Dia desses, Maria
Eduarda, amiga pernambucana, me disse: “Você está chegando aqui, sabemos que
gosta de vinhos. Que vinho prefere?”. E eu: “Nenhum! Quero suco de pitanga”. Maria
Eduarda: “Pois vai tomar das pitangas do pomar de meu pai, Cornélio”. Foi uma
celebração!
Esta é a pitada de poesia que encontrei neste momento. Mas ficaram em minha
mente essas perguntas cotidianas que todos estão fazendo. Ouço no dia a dia, pela
manhã ao comprar o pão e o leite, no supermercado, no bar, numa escola, na
livraria, ao entrar no cinema. Ouvi agora, ao percorrer cinco cidades do litoral (...).
Jovens e mais velhos, acreditando que o escritor tem as respostas, me olhavam: “O
senhor acha que a gente sai dessa?”. Só consegui dizer: “Não sei e acho que ninguém
sabe”.
Ignácio de Loyola Brandão, O Estado de S. Paulo, 02/10/2015.
Por que o senhor não escreve coisas poéticas, soltas, gostosas? As crônicas, antigamente, nos deixavam mais leves, de bem com a vida e o mundo. Agora, tudo o que a gente lê nos leva para baixo. Está difícil de suportar. Escrevo na manhã de um domingo. Sete horas. Aquele sol que nos tem castigado, começava a dar sinais de ardência profunda. Olhei pela porta de vidro do terraço e descobri, maravilhado e feliz, que a pitangueira plantada em vaso, que chegou há dois anos, estava repleta de frutos vermelhos, reluzentes, envernizados. Os primeiros. Fiquei admirado. Os pássaros não tinham descoberto? Aquelas frutinhas tinham se salvado? Chupei uma, duas três, queria todas, mas precisava guardar para a família, afinal, eram as primeiras. Pitanga, coisa de infância, do interior. Uma das frutas mais sofisticadas do Brasil, a meu ver. Antigamente, quando viajávamos pela Varig, ao sair do Recife, recebíamos um copo de suco fresco de pitanga, perfumado. Dia desses, Maria Eduarda, amiga pernambucana, me disse: “Você está chegando aqui, sabemos que gosta de vinhos. Que vinho prefere?”. E eu: “Nenhum! Quero suco de pitanga”. Maria Eduarda: “Pois vai tomar das pitangas do pomar de meu pai, Cornélio”. Foi uma celebração!
Esta é a pitada de poesia que encontrei neste momento. Mas ficaram em minha mente essas perguntas cotidianas que todos estão fazendo. Ouço no dia a dia, pela manhã ao comprar o pão e o leite, no supermercado, no bar, numa escola, na livraria, ao entrar no cinema. Ouvi agora, ao percorrer cinco cidades do litoral (...). Jovens e mais velhos, acreditando que o escritor tem as respostas, me olhavam: “O senhor acha que a gente sai dessa?”. Só consegui dizer: “Não sei e acho que ninguém sabe”.