Questão 2c80d096-ea
Prova:UFPEL 2019
Disciplina:Literatura
Assunto:Barroco, Escolas Literárias

Leia os fragmentos textuais a seguir, para resolução da questão

[...] Ergui a gola do sobretudo, desci a aba do chapéu até perto dos olhos e troquei as dependências do hotel pelas da cerração. Satolep estava apropriadamente decorada para minha festa solitária. As coisas geometrizadas pelo frio mostravam-se voláteis. Linhas rigorosas à luz do dia eram agora ausência de contornos. Fazer trinta anos era perder-me no nevoeiro tendo em vista a concretude da cidade ou o contrário? Um cão flutuava atrás de uma charrete que passava. O granito do meio-fio corria a meu lado, às vezes reluzente em sua umidade, às vezes dissipado em vapor luminoso; um outro cão, de pedra e de nuvem, cão de alguma mitologia, condenado a nascer e morrer indefinidamente. Nascer pedra e morrer nuvem? Nascer nuvem e morrer pedra? Trinta anos. Soprei velinhas imaginárias, e minha alma revoluteou diante de mim. (RAMIL, 2008, p.08)

Nasce o Sol, e não dura mais que um dia,
Depois da Luz se segue a noite escura,
Em tristes sombras morre a formosura,
Em contínuas tristezas a alegria.

Porém, se acaba o Sol, porque nascia?
Se formosa a Luz é, por que não dura?
Como a beleza assim se transfigura?
Como o gosto da pena assim se fia?

Mas no Sol, e na Luz, falte a firmeza,
Na formosura não se crê constância,
E na alegria sinta-se tristeza.


Começa o mundo enfim pela ignorância,
E tem qualquer dos bens por natureza
A firmeza somente na inconstância.

(Gregório de Matos 1636 – 1695)

Os excerto lidos anteriormente pertencem a diferentes épocas e gêneros literários, entretanto apresentam algumas proximidades temáticas. Considerando os excertos e suas respectivas significações literárias, é correto afirmar que os textos

A
negam a valorização do sofrimento, como bem explicitam a estrofe final do soneto e a frase que encerra a descrição do personagem protagonista.
B
descrevem espaços urbanos e os sentimentos dos cidadãos que vivem nas grandes cidades, bem como o grande estresse causado pela vida contemporânea.
C
reiteram a temática da fugacidade da vida, representados na narrativa pelas imagens do nevoeiro e do teorema “Nascer pedra e morrer nuvem? Nascer nuvem e morrer pedra?”; e no poema pela sua construção a partir de palavras contraditórias que ressaltam as contradições cotidianas.
D
comparam situações semelhantes, cujos protagonistas passam por momentos de perturbação psicológica causado pelo sentimento de impotência frente às durezas da vida cotidiana.
E
transferem a responsabilidade da instabilidade da vida humana para a natureza, como comprovam os versos “A firmeza somente na inconstância” / “Mas no Sol, e na Luz, falte a firmeza”, e a expressão “As coisas geometrizadas pelo frio mostravam-se voláteis.

Gabarito comentado

M
Marília Teixeira Monitor do Qconcursos

Gabarito: C

Tema central da questão:
A questão explora a fugacidade da vida, uma temática essencial tanto na tradição barroca quanto em reflexões contemporâneas, enfatizando a inconstância e transitoriedade da existência humana.

Explicação didática:
No poema barroco de Gregório de Matos, a alternância entre luz e escuridão, alegria e tristeza, vida e morte destaca o princípio da efemeridade, ilustrado estruturalmente pela antítese (“Sol/Luz” x “noite/Trevas”; “alegria” x “tristeza”), um recurso caro ao Barroco para expressar oposições e instabilidade das coisas do mundo.

No texto de Vitor Ramil, imagens como nevoeiro, cão de pedra e nuvem, e a própria dúvida “Nascer pedra e morrer nuvem? Nascer nuvem e morrer pedra?” simbolizam a impermanência – nada é sólido ou perene, tudo se transforma ou evapora. A narração em primeira pessoa faz da percepção subjetiva um espelho da dúvida existencial, mantendo o foco na inconsistência das formas e dos sentimentos.

Justificativa da alternativa correta (C):

Ambos os textos reiteram a fugacidade da vida. O soneto barroco enfatiza a transitoriedade por meio de pares opostos, enquanto o fragmento contemporâneo recorre a imagens que evocam incerteza e dissolução dos limites.

Análise das alternativas incorretas:

A) Errada: Nenhum texto nega a valorização do sofrimento; pelo contrário, ambos tratam do sofrimento como parte indissociável da existência.

B) Errada: Não se focaliza o estresse das grandes cidades, mas a reflexão sobre a existência.

D) Errada: Não há personagem explicitamente perturbado psicologicamente; predomina a reflexão filosófica/metafísica.

E) Errada: A inconstância não é atribuída à natureza de modo autônomo, e sim utilizada como metáfora da vida humana.

Estratégia de prova: Atenção às imagens simbólicas e às figuras de linguagem (antítese, metáfora) para captar o tema central.

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