Questão 22eb04d6-84
Prova:IF Sul Rio-Grandense 2016, IF Sul Rio-Grandense 2016
Disciplina:Português
Assunto:Pontuação, Uso da Vírgula

Em “Não, não é preciso tolerar.”, se fosse colocada outra vírgula após a segunda palavra “não”, é correto afirmar que

Leia o texto, para responder à questão.

Contra a mera “tolerância” das diferenças

Renan Quintanilha

    “É preciso tolerar a diversidade”. Sempre que me defronto com esse tipo de colocação, aparentemente progressista e bem intencionada, fico indignado. Não, não é preciso tolerar.

    “Tolerar”, segundo qualquer dicionário, significa algo como “suportar com indulgência”, ou seja, deixar passar com resignação, ainda que sem consentir expressamente com aquela conduta.

    “Tolerar” o que é diferente consiste, antes de qualquer coisa, em atribuir a “quem tolera” um poder sobre “o que tolera”. Como se este dependesse do consentimento daquele para poder existir. “Quem tolera” acaba visto, ainda, como generoso e benevolente, por dar uma “permissão” como se fosse um favor ou um ato de bondade extrema.

    Esse tipo de discurso, no fundo, nega o direito à existência autônoma do que é diferente dos padrões construídos socialmente. Mais: funciona como um expediente do desejo de estigmatizar o diferente e manter este às margens da cultura hegemônica, que traça a tênue linha divisória entre o normal e o anormal.

    Tolerar não deve ser celebrado e buscado nem como ideal político e tampouco como virtude individual. Ainda que o argumento liberal enxergue, na tolerância, uma manifestação legítima e até necessária da igualdade moral básica entre os indivíduos, não é esse o seu sentido recorrente nos discursos da política.

    Com efeito, ainda que a defesa liberal-igualitária da tolerância, diante de discussões controversas, postule que se trate de um respeito mútuo em um cenário de imparcialidade das instituições frente a concepções morais mais gerais, isso não pode funcionar em um mundo marcado por graves desigualdades estruturais.

    Marcuse1 identificava dois tipos de tolerância: a passiva e a ativa. No primeiro caso, a tolerância é vista como uma resignação e uma omissão diante de uma sociedade marcadamente injusta em suas diversas dimensões. Por sua vez, no segundo caso, ele trata da tolerância enquanto uma disposição efetiva de construção de uma sociedade igualitária. Não é este, no entanto, o discurso mais recorrente da tolerância em nossos tempos.

    Assim, quando alguém te disser que é preciso “tolerar” a liberdade das mulheres, os direitos das pessoas LGBT, a busca por melhores condições de vida das pessoas pobres, as reivindicações por igualdade material das pessoas negras, dentre outros segmentos vulneráveis, simplesmente não problematize esse discurso.

    Admitir a existência do outro não significa aceitá-lo em sua particularidade como integrante da comunidade política. É preciso valorizar os laços mais profundos de reciprocidade e respeito pelas diferenças, o que só o reconhecimento, estágio superior da tolerância, pode ajudar a promover, como ensinou Axel Honneth2

    Diversidade é um valor em si mesmo e não depende da concordância dos que ocupam posições de privilégios. Direitos e liberdades não se “toleram”. Devem ser respeitados e promovidos, por serem conquistas jurídicas e políticas antecedidas de muitas lutas.

    O que não se pode tolerar é o discurso aparentemente “benevolente” e “generoso” – mas na verdade bem perverso – da “tolerância das diferenças”. Ninguém precisa da licença de ninguém pra existir.

Disponível em:<http://revistacult.uol.com.br/home/2016/02/contra-a-mera-tolerancia-das-diferencas/>  Acesso em: 03 mai 2016. 

1 Marcuse: filósofo e sociólogo alemão, naturalizado norte-americano.

2 Axel Honneth: filósofo e sociólogo alemão.

A
acarretaria erro gramatical e provocaria alteração de sentido da frase.
B
acarretaria erro gramatical, mas não provocaria alteração no sentido da frase.
C
não acarretaria erro gramatical e nem alteração no sentido da frase.
D
não acarretaria erro gramatical, mas provocaria alteração no sentido da frase.

Gabarito comentado

C
Carlos PereiraMonitor do Qconcursos

Tema central: Pontuação — Uso da vírgula em frases com dupla negação

A questão cobra atenção à pontuação e ao sentido da frase, abordando como o uso da vírgula pode alterar a interpretação e a correção gramatical.

Análise da frase:
Frase original: “Não, não é preciso tolerar.”

O primeiro “não” funciona como uma resposta, separado por vírgula; o segundo “não” introduz a negativa da oração (não é preciso tolerar).

O que aconteceria se inserirmos uma vírgula após o segundo “não”?
Ex: “Não, não, é preciso tolerar.”

1) Não há erro gramatical, pois, diante de construções expletivas ou de destaque, há certa liberdade expressiva — a vírgula gera apenas pausa enfática, conforme observa Bechara (Moderna Gramática Portuguesa).
2) Há alteração de sentido: a estrutura “Não, não, é preciso tolerar” pode ser lida como uma segunda negativa independente (quase como eco), e em seguida uma afirmação (“é preciso tolerar”), sugerindo, inclusive, ambiguidade na postura do emissor.

Portanto, ao colocar a vírgula após o segundo “não”, não há desrespeito direto à norma padrão (já que a pontuação admite variações de intenção), mas há modificação de sentido — perde-se o efeito de uma negativa categórica e pode-se entender que o enunciador nega e depois afirma.

Justificativa da alternativa correta:
D) não acarretaria erro gramatical, mas provocaria alteração no sentido da frase.

A alternativa D é a correta porque reconhece: não há erro de pontuação segundo a flexibilidade permitida, porém a vírgula mudaria o sentido por criar uma pausa diferente e gerar ambiguidade interpretativa.

Análise das alternativas incorretas:

A) Erro: Não há infração gramatical, somente alteração de sentido.
B) Erro: Não há erro de gramática, e sim de sentido.
C) Erro: Não há erro de pontuação, mas existe, sim, alteração de sentido.

Dica de prova: Questões de pontuação costumam explorar mudanças sutis de sentido e, muitas vezes, aceitam variações desde que não gerem incorreção formal evidente. Sempre analise se a troca de pontuação gera ambiguidade ou quebra de sentido.

Resumo da regra: O advérbio “não” não deve ser separado do verbo quando nega proposições essenciais, mas a vírgula pode ser usada em situações de destaque ou eco, alterando o tom e até o sentido.

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