Esboçamos as preocupações fundamentais que a nossa peça procura refletir. A primeira e mais
importante de todas se refere a uma face da sociedade brasileira que ganhou relevo nos últimos
anos: a experiência capitalista que se vem implantando aqui − radical, violentamente predatória,
impiedosamente seletiva − adquiriu um trágico dinamismo. O santo que produziu o milagre é
conhecido por todas as pessoas de boa-fé e bom nível de informação: a brutal concentração da riqueza
elevou a capacidade de consumo de bens duráveis de uma parte da população, enquanto a maioria
ficou no ora veja. [Adaptado da apresentação.]
CREONTE:
(...)
O trem atrasa o quê? Nem meia hora
E o cara quebra tudo... Acha que é certo,
Jasão?...
JASÃO:
     Não discuto quebrar... Agora,
     quem às três da manhã tá de olho aberto,
     se espreme pra chegar no emprego às sete,
     lá passa o dia todo, volta às onze
     da noite pra acordar a canivete
     de novo às três, tinha que ser de bronze
     para fazer isso sempre, todo dia,
     levando na marmita arroz, feijão
     e humilhação...
     (...)
CREONTE:
       Sociologia, Jasão... 
JASÃO:
     Não...
     (...)
     O cara já tá por aqui. Tá perto
     de explodir, um trem que atrasa, ele mata,
     quebra mesmo, é a gota d`água...
BUARQUE, C.; PONTES, P. Gota d’agua: uma tragédia brasileira. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.
Encenada pela primeira vez em 1975, a premiada peça de teatro Gota d`água foi reapresentada
diversas vezes. No momento em que foi escrita, como indicam seus autores, a peça buscou
explicitar questionamentos sobre mudanças que afetaram a sociedade brasileira durante os
governos militares.
Tendo como base o diálogo citado acima, entre os personagens Creonte e Jasão, um dos
efeitos dessas mudanças na experiência capitalista do Brasil da época foi a: