Marque a ÚNICA alternativa correta.
DR. FLORISMAL
Florismal!... Para Eugênio, aquele nome tinha um secreto
encanto. Florismal aparecia quase todas as noites, chegava
muito calmo, fumando o seu charuto de tostão e ia logo
sentando na cadeira de balanço. Era um homem baixo, de
cabelos ralos, quase calvo. No rosto gorducho e redondo,
a barba forte era sempre uma sombra azulada, mesmo
quando ele se escanhoava. Os dentes eram maus e miúdos.
Florismal tinha uma voz macia e uma certa dignidade de
estadista. Era um espírito conciliador e gabava-se de ter
muita lábia. Nasci para advogado dizia. Se eu tivesse
tido mais um pouco de juízo quando moço ... Calava-se,
entortava a cabeça, batia a cinza do charuto e ficava em
atitude sonhadora. Decerto a ver mentalmente o seu
passado, os seus erros e uma carreira perdida. Ou então
pensava apenas no efeito que aquelas palavras e aquela
postura podiam estar produzindo nos interlocutores. A
verdade era que amigos e conhecidos de Florismal sempre
o chamavam para dar sentenças, e resolver questões. Diziase que o homenzinho arranjava causas para advogados
sem clientela e ganhava com isso gordas comissões. Muito
figurão tirava o chapéu ao cumprimentá-lo na rua. Florismal
fazia até discursos políticos. Por isso tudo, os amigos lhe
chamavam Dr. Florismal. A princípio, diziam doutor com
uma pontinha de ironia. Florismal aceitava o título sorrindo,
entre lisonjeado e divertido. Acabou ficando mesmo Dr.
Florismal. Com o tempo, os amigos que gostavam dele
esqueceram que aquilo era uma brincadeira e acabaram
acreditando no título.
VERÍSSIMO, Érico. Olhai os lírios do campo. Rio de Janeiro:
Editora José Aguilar, 1966
DR. FLORISMAL
Florismal!... Para Eugênio, aquele nome tinha um secreto encanto. Florismal aparecia quase todas as noites, chegava muito calmo, fumando o seu charuto de tostão e ia logo sentando na cadeira de balanço. Era um homem baixo, de cabelos ralos, quase calvo. No rosto gorducho e redondo, a barba forte era sempre uma sombra azulada, mesmo quando ele se escanhoava. Os dentes eram maus e miúdos. Florismal tinha uma voz macia e uma certa dignidade de estadista. Era um espírito conciliador e gabava-se de ter muita lábia. Nasci para advogado dizia. Se eu tivesse tido mais um pouco de juízo quando moço ... Calava-se, entortava a cabeça, batia a cinza do charuto e ficava em atitude sonhadora. Decerto a ver mentalmente o seu passado, os seus erros e uma carreira perdida. Ou então pensava apenas no efeito que aquelas palavras e aquela postura podiam estar produzindo nos interlocutores. A verdade era que amigos e conhecidos de Florismal sempre o chamavam para dar sentenças, e resolver questões. Diziase que o homenzinho arranjava causas para advogados sem clientela e ganhava com isso gordas comissões. Muito figurão tirava o chapéu ao cumprimentá-lo na rua. Florismal fazia até discursos políticos. Por isso tudo, os amigos lhe chamavam Dr. Florismal. A princípio, diziam doutor com uma pontinha de ironia. Florismal aceitava o título sorrindo, entre lisonjeado e divertido. Acabou ficando mesmo Dr. Florismal. Com o tempo, os amigos que gostavam dele esqueceram que aquilo era uma brincadeira e acabaram acreditando no título.
VERÍSSIMO, Érico. Olhai os lírios do campo. Rio de Janeiro:
Editora José Aguilar, 1966