Policarpo Quaresma, cidadão brasileiro, funcionário público, certo de que a língua portuguesa é emprestada ao Brasil; certo também de que, por esse fato, o falar e o escrever em geral, sobretudo no campo das letras, se veem na humilhante contingência de sofrer continuamente censuras ásperas dos proprietários da língua; sabendo, além, que, dentro do nosso país, os autores e os escritores, com especialidade os gramáticos, não se entendem no tocante à correção gramatical, vendo-se, diariamente, surgir azedas polêmicas entre os mais profundos estudiosos do nosso idioma — usando do direito que lhe confere a Constituição, vem pedir que o Congresso Nacional decrete o tupi-guarani como língua oficial e nacional do povo brasileiro.

O suplicante, deixando de parte os argumentos históricos que militam em favor de sua ideia, pede vênia para lembrar que a língua é a mais alta manifestação da inteligência de um povo, é a sua criação mais viva e original; e, portanto, a emancipação política do país requer como complemento e consequência a sua emancipação idiomática.

PRIMEIRA PARTE

IV - Desastrosas Consequências de um Requerimento

O teor da solicitação de Policarpo Quaresma expressa uma ironia ao deixar implícita uma crítica histórica. O alvo dessa crítica é:

Gabarito comentado:

Alternativa correta: C) o silenciamento da herança indígena

Tema central da questão: O foco está na crítica social e cultural presente em Triste Fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto, em especial quanto à exclusão das raízes indígenas na identidade nacional brasileira.

Explicação didática: O protagonista, ao requerer que o tupi-guarani seja a língua oficial, evidencia com ironia o apagamento da herança indígena frente à imposição da cultura europeia. Essa proposta funciona como crítica à construção da ideia de nação sobre bases que silenciam as populações originárias.

Por que a alternativa C está correta? Segundo os conceitos do pré-modernismo brasileiro, período ao qual pertence Lima Barreto, obras como esta expõem as fragilidades e contradições do projeto nacional, revelando como as vozes indígenas foram historicamente desprezadas, marginalizadas ou ocultadas. Policarpo Quaresma, ao tentar resgatar o idioma indígena, questiona e ironiza esse silenciamento. Essa leitura encontra respaldo nos principais manuais de Literatura para concursos (como o de Massaud Moisés), que destacam essa crítica como eixo central da obra.

Análise das alternativas incorretas:

• A) a censura da elite econômica: Não é a classe dominante o foco nesse trecho, e sim a questão cultural-identitária.
• B) a burocracia republicana nascente: Apesar do romance criticar instituições, o requerimento examinado busca ressaltar a questão cultural, não a administrativa.
• D) o purismo do pensamento cientificista: O tema da crítica não é a ciência ou o racionalismo, e sim o desprezo à cultura ancestral indígena.

Dica para concursos: Ao analisar textos de obras do pré-modernismo, foque na crítica social e nos apagamentos históricos retratados. Identifique os alvos indiretos da ironia, comuns nas questões dessa área.

Gostou do comentário? Deixe sua avaliação aqui embaixo!