Questõesde USP 2019 sobre Português

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Foram encontradas 17 questões
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USP 2019 - Português - Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

O autor expressa preocupação com o fato de que as soluções para o problema apontado passam por um esforço multinacional, em face ao crescente número de governos isolacionistas, porque

TEXTO PARA A QUESTÃO

    Óbitos por cepas de bactérias resistentes a antibióticos vêm crescendo. Um estudo do governo britânico estima que, em escala global, os óbitos por cepas resistentes já cheguem a 700 mil por ano. E as coisas têm piorado. Além das bactérias, já estão surgindo fungos resistentes, como a Candida auris.
    Qualquer solução passa por um esforço multinacional de ações coordenadas. O crescente número de governos isolacionistas e até antidarwinistas não dá razões para otimismo. Há urgência. O estudo britânico calcula que, se nada for feito, em 2050, as mortes por infecções resistentes chegarão a 10 milhões ao ano.
Hélio Schwartsman, “Mortes anunciadas”. Folha de São Paulo, Abril/2019.
Adaptado. 
A
áreas de menor índice de desenvolvimento socioeconômico são as únicas atingidas devido à falta de recursos empregados em saúde e educação.
B
as cepas resistentes surgem exclusivamente nos países que se negam a aderir a acordos sanitários comuns, constituindo ameaças globais.
C
desafios atuais em meio ambiente e saúde são globais e soluções dependem da adesão de cada país aos protocolos internacionais.
D
o comércio internacional é o principal responsável por espalhar doenças nesses países, tornando‐os vulneráveis, apesar de os programas de vacinação terem alcance mundial.
E
a pesquisa nesta área é de âmbito nacional e, portanto, novas drogas não terão alcance mundial, mas apenas regional.
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USP 2019 - Português - Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

A certa personagem desvanecida

Um soneto começo em vosso gabo*:
Contemos esta regra por primeira,
Já lá vão duas, e esta é a terceira,
Já este quartetinho está no cabo.

Na quinta torce agora a porca o rabo;
A sexta vá também desta maneira:
Na sétima entro já com grã** canseira,
E saio dos quartetos muito brabo.

Agora nos tercetos que direi?
Direi que vós, Senhor, a mim me honrais
Gabando‐vos a vós, e eu fico um rei.

Nesta vida um soneto já ditei;
Se desta agora escapo, nunca mais:
Louvado seja Deus, que o acabei.
Gregório de Matos

*louvor **grande

Tipo zero

Você é um tipo que não tem tipo
Com todo tipo você se parece
E sendo um tipo que assimila tanto tipo
Passou a ser um tipo que ninguém esquece

Quando você penetra num salão
E se mistura com a multidão
Você se torna um tipo destacado
Desconfiado todo mundo fica
Que o seu tipo não se classifica
Você passa a ser um tipo desclassificado

Eu até hoje nunca vi nenhum
Tipo vulgar tão fora do comum
Que fosse um tipo tão observado
Você ficou agora convencido
Que o seu tipo já está batido
Mas o seu tipo é o tipo do tipo esgotado
Noel Rosa

O soneto de Gregório de Matos e o samba de Noel Rosa, embora distantes na forma e no tempo, aproximam‐se por ironizarem

A
o processo de composição do texto.
B
a própria inferioridade ante o retratado.
C
a singularidade de um caráter nulo.
D
o sublime que se oculta na vulgaridade.
E
a intolerância para com os gênios.
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USP 2019 - Português - Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

Hoje fizeram o enterro de Bela. Todos na Chácara se convenceram de que ela estava morta, menos eu. Se eu pudesse não deixaria enterrá‐la ainda. Disse isso mesmo a vovó, mas ela disse que não se pode fazer assim. Bela estava igualzinha à que ela era no dia em que chegou da Formação, só um pouquinho mais magra.
Todos dizem que o sofrimento da morte é a luta da alma para se largar do corpo. Eu perguntei a vovó: “Como é que a alma dela saiu sem o menor sofrimento, sem ela fazer uma caretinha que fosse?”. Vovó disse que tudo isso é mistério, que nunca a gente pode saber essas coisas com certeza. Uns sofrem muito quando a alma se despega do corpo, outros morrem de repente sem sofrer.
Helena Morley, Minha Vida de Menina.

Perguntas

Numa incerta hora fria
perguntei ao fantasma
que força nos prendia,
ele a mim, que presumo
estar livre de tudo eu a ele, gasoso,
(...)

No voo que desfere
silente e melancólico,
rumo da eternidade,
ele apenas responde
(se acaso é responder
a mistérios, somar‐lhes
um mistério mais alto):

Amar, depois de perder.
Carlos Drummond de Andrade, Claro Enigma.

As perguntas da menina e do poeta versam sobre a morte. É correto afirmar que

A
ambos guardam uma dimensão transcendente e católica, de origem mineira.
B
ambos ouvem respostas que lhes esclarecem em definitivo as dúvidas existenciais.
C
a menina mostra curiosidade acerca da morte como episódio e o poeta especula o sentido filosófico da morte.
D
a menina está inquieta por conhecer o destino das almas, enquanto o poeta critica o ceticismo.
E
as duas respostas reforçam os mistérios da vida ao acolherem crenças populares.
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USP 2019 - Português - Interpretação de Textos, Uso dos conectivos, Coesão e coerência, Sintaxe, Redação - Reescritura de texto

Considerando o contexto, o trecho “E não se pense que este nome a alegrou, posto que a lisonjeasse” (L.10‐11) pode ser reescrito,sem prejuízo de sentido, da seguinte maneira: E não se pense que este nome a alegrou,

TEXTO PARA A QUESTÃO

Machado de Assis, Quincas Borba.
A
apesar de lisonjeá‐la.
B
antes a lisonjeou.
C
porque a lisonjeava.
D
a fim de lisonjeá‐la.
E
tanto quanto a lisonjeava.
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USP 2019 - Português - Interpretação de Textos, Intertextualidade, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

No excerto, o autor recorre à intertextualidade, dialogando com a comédia de Molière, Tartufo (1664), cuja personagem central é um impostor da fé. Tal é a fama da peça que o nome próprio se incorporou ao vocabulário, inclusive em português, como substantivo comum, para designar o “indivíduo hipócrita” ou o “falso devoto”. No contexto maior do romance, sugere‐se que a tartufice

TEXTO PARA A QUESTÃO

Machado de Assis, Quincas Borba.
A
se cola à imagem da leitora, indiscreta quanto aos amores alheios.
B
é ação isolada de Sofia, arrivista social e benemérita fingida.
C
diz respeito ao filósofo Quincas Borba, o que explica o título do livro.
D
se produz na imprensa, apesar de esta se esquivar da eloquência vazia.
E
se estende à sociedade, na qual o cinismo é o trunfo dos fortes.
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USP 2019 - Português - Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

Djamila Ribeiro, Quem tem medo do feminismo negro?.

O trecho que melhor define a “incompreensão fundamental” (L.6) referida pela autora é:

A
“não que eu buscasse respostas para tudo” (L.6‐7).
B
“não tinha consciência de mim” (L.8).
C
“Por que eu ficava isolada na hora do recreio” (L.10‐11).
D
“me esforçando para não ser notada” (L.15).
E
“sentia vergonha de levantar a mão” (L.8‐9).
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USP 2019 - Português - Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

Agora, o Manuel Fulô, este,sim! Um sujeito pingadinho, quase menino – “pepino que encorujou desde pequeno” – cara de bobo de fazenda, do segundo tipo –; porque toda fazenda tem o seu bobo, que é, ou um velhote baixote, de barba rara no queixo, ou um eterno rapazola, meio surdo, gago, glabro* e alvar**. Mas gostava de fechar a cara e roncar voz, todo enfarruscado, para mostrar brabeza, e só por descuido sorria, um sorriso manhoso de dono de hotel. E, em suas feições de caburé*** insalubre, amigavam‐se as marcas do sangue aimoré e do gálico herdado: cabelo preto, corrido, que boi lambeu; dentes de fio em meia‐lua; malares pontudos; lobo da orelha aderente; testa curta, fugidia; olhinhos de viés e nariz peba, mongol.
Guimarães Rosa, “Corpo fechado”, de Sagarana.

*sem pelos, sem barba **tolo ***mestiço

O retrato de Manuel Fulô, tal como aparece no fragmento, permite afirmar que

A
há clara antipatia do narrador para com a personagem, que por isso é caracterizada como “bobo de fazenda”.
B
estão presentes traços de diferentes etnias, de modo a refletir a mescla de culturas própria ao estilo do livro.
C
a expressão “caburé insalubre” denota o determinismo biológico que norteia o livro.
D
é irônico o trecho “para mostrar brabeza”, pois ao fim da narrativa Manuel Fulô sofre derrota na luta física.
E
se apontam em sua fisionomia os “olhinhos de viés” para caracterizar a personagem como ingênua.
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USP 2019 - Português - Uso dos dois-pontos, Pontuação

O Twitter é uma das redes sociais mais importantes no Brasil e no mundo. (...) Um estudo identificou que as fake news são 70% mais propensas a serem retweetadas do que fatos verdadeiros. (...) Outra conclusão importante do trabalho diz respeito aos famosos bots: ao contrário do que muitos pensam, esses robôs não são os grandes responsáveis por disseminar notícias falsas. Nem mesmo comparando com outros robozinhos: tanto os que espalham informações mentirosas quanto aqueles que divulgam dados verdadeiros alcançaram o mesmo número de pessoas.
Super Interessante, “No Twitter, fake news se espalham 6 vezes mais rápido que notícias verdadeiras”. Maio/2019.

No período “Nem mesmo comparando com outros robozinhos: tanto os que espalham informações mentirosas quanto aqueles que divulgam dados verdadeiros alcançaram o mesmo número de pessoas.”, os dois‐pontos são utilizados para introduzir uma

A
conclusão.
B
concessão.
C
explicação.
D
contradição.
E
condição.
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USP 2019 - Português - Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

O ditado popular que se relaciona melhor com o poema é:

TEXTO PARA A QUESTÃO

Uma planta é perturbada na sua sesta* pelo exército que a pisa.
Mas mais frágil fica a bota.
Gonçalo M. Tavares, 1: poemas.

*sesta: repouso após o almoço.
A
Para bom entendedor, meia palavra basta.
B
Água mole em pedra dura tanto bate até que fura.
C
Quem com ferro fere, com ferro será ferido.
D
Um dia é da caça, o outro é do caçador.
E
Uma andorinha só não faz verão.
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USP 2019 - Português - Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

Considerando que se trata de um texto literário, uma interpretação que seja capaz de captar a sua complexidade abordará o poema como

TEXTO PARA A QUESTÃO

Uma planta é perturbada na sua sesta* pelo exército que a pisa.
Mas mais frágil fica a bota.
Gonçalo M. Tavares, 1: poemas.

*sesta: repouso após o almoço.
A
uma defesa da natureza.
B
um ataque às forças armadas.
C
uma defesa dos direitos humanos.
D
uma defesa da resistência civil.
E
um ataque à passividade.
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USP 2019 - Português - Interpretação de Textos, Denotação e Conotação, Morfologia, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

Tal como se lê no poema,

TEXTO PARA A QUESTÃO

amora

a palavra amora
seria talvez menos doce
e um pouco menos vermelha
se não trouxesse em seu corpo
(como um velado esplendor)
a memória da palavra amor

a palavra amargo
seria talvez mais doce
e um pouco menos acerba
se não trouxesse em seu corpo
(como uma sombra a espreitar)
a memória da palavra amar
Marco Catalão, Sob a face neutra.
A
a palavra “amora” é substantivo, e “amargo”, adjetivo.
B
o verbo “amar” ameniza o amargor da palavra “amargo”.
C
o substantivo “corpo” apresenta sentido denotativo.
D
o substantivo “amor” intensifica o dulçor da palavra “amora”.
E
o verbo “amar” e o substantivo “amor” são intercambiáveis.
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USP 2019 - Português - Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

É correto afirmar que o poema

TEXTO PARA A QUESTÃO

amora

a palavra amora
seria talvez menos doce
e um pouco menos vermelha
se não trouxesse em seu corpo
(como um velado esplendor)
a memória da palavra amor

a palavra amargo
seria talvez mais doce
e um pouco menos acerba
se não trouxesse em seu corpo
(como uma sombra a espreitar)
a memória da palavra amar
Marco Catalão, Sob a face neutra.
A
aborda o tema da memória, considerada uma faculdade que torna o ser humano menos amargo e sombrio.
B
enfoca a hesitação do eu lírico diante das palavras, o que vem expresso pela repetição da palavra “talvez”.
C
apresenta natureza romântica, sendo as palavras “amora” e “amargo” metáforas do sentimento amoroso.
D
possui reiterações sonoras que resultam em uma tensão inusitada entre os termos “amor” e “amar”.
E
ressalta os significados das palavras tal como se verificam no seu uso mais corrente.
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USP 2019 - Português - Morfologia - Verbos, Flexão de voz (ativa, passiva, reflexiva), Termos essenciais da oração: Sujeito e Predicado, Sintaxe

Leia o trecho extraído de uma notícia veiculada na internet:

“O carro furou o pneu e bateu no meio fio, então eles foram obrigados a parar. O refém conseguiu acionar a população, que depois pegou dois dos três indivíduos e tentaram linchar eles. O outro conseguiu fugir, mas foi preso momentos depois por uma viatura do 5º BPM”, afirmou o major.
Disponível em https://www.gp1.com.br/.

No português do Brasil, a função sintática do sujeito não possui, necessariamente, uma natureza de agente, ainda que o verbo esteja na voz ativa, tal como encontrado em:

A
“O carro furou o pneu”.
B
“e bateu no meio fio”.
C
“O refém conseguiu acionar a população”.
D
“tentaram linchar eles”.
E
“afirmou o major”.
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USP 2019 - Português - Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

Para Graciliano Ramos, Angústia não faz concessão ao gosto do público na medida em que compõe uma atmosfera

TEXTOS PARA A QUESTÃO

Os textos literários são obras de discurso, a que falta a imediata referencialidade da linguagem corrente; poéticos, abolem, “destroem” o mundo circundante, cotidiano, graças à função irrealizante da imaginação que os constrói. E prendem‐nos na teia de sua linguagem, a que devemo poder de apelo estético que nos enleia; seduz‐nos o mundo outro, irreal, neles configurado (...). No entanto, da adesão a esse “mundo de papel”, quando retornamos ao real, nossa experiência, ampliada e renovada pela experiência da obra, à luz do que nos revelou, possibilita redescobri‐lo, sentindo‐o e pensando‐o de maneira diferente e nova. A ilusão, a mentira, o fingimento da ficção, aclara o real ao desligar‐se dele, transfigurando‐o; e aclara‐o já pelo insight que em nós provocou.
Benedito Nunes, “Ética e leitura”, de Crivo de Papel.

O que eu precisava era ler um romance fantástico, um romance besta, em que os homens e as mulheres fossem criações absurdas, não andassem magoando‐se, traindo‐se. Histórias fáceis, sem almas complicadas. Infelizmente essas leituras já não me comovem.
Graciliano Ramos, Angústia.

Romance desagradável, abafado, ambiente sujo, povoado de ratos, cheio de podridões, de lixo. Nenhuma concessão ao gosto do público. Solilóquio doido, enervante.
Graciliano Ramos, Memórias do Cárcere, em nota a respeito de seu livro Angústia.
A
dramática, ao representar as tensões de seu tempo.
B
grotesca, ao eliminar a expressão individual.
C
satírica, ao reduzir os eventos ao plano do riso.
D
ingênua, ao simular o equilíbrio entre sujeito e mundo.
E
alegórica, ao exaltar as imagens de sujeira.
0d81a760-99
USP 2019 - Português - Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

Se o discurso literário “aclara o real ao desligar‐se dele, transfigurando‐o”, pode‐se dizer que Luís da Silva, o narrador‐ protagonista de Angústia, já não se comove com a leitura de “histórias fáceis, sem almas complicadas” porque

TEXTOS PARA A QUESTÃO

Os textos literários são obras de discurso, a que falta a imediata referencialidade da linguagem corrente; poéticos, abolem, “destroem” o mundo circundante, cotidiano, graças à função irrealizante da imaginação que os constrói. E prendem‐nos na teia de sua linguagem, a que devemo poder de apelo estético que nos enleia; seduz‐nos o mundo outro, irreal, neles configurado (...). No entanto, da adesão a esse “mundo de papel”, quando retornamos ao real, nossa experiência, ampliada e renovada pela experiência da obra, à luz do que nos revelou, possibilita redescobri‐lo, sentindo‐o e pensando‐o de maneira diferente e nova. A ilusão, a mentira, o fingimento da ficção, aclara o real ao desligar‐se dele, transfigurando‐o; e aclara‐o já pelo insight que em nós provocou.
Benedito Nunes, “Ética e leitura”, de Crivo de Papel.

O que eu precisava era ler um romance fantástico, um romance besta, em que os homens e as mulheres fossem criações absurdas, não andassem magoando‐se, traindo‐se. Histórias fáceis, sem almas complicadas. Infelizmente essas leituras já não me comovem.
Graciliano Ramos, Angústia.

Romance desagradável, abafado, ambiente sujo, povoado de ratos, cheio de podridões, de lixo. Nenhuma concessão ao gosto do público. Solilóquio doido, enervante.
Graciliano Ramos, Memórias do Cárcere, em nota a respeito de seu livro Angústia.
A
rejeita, como jornalista, a escrita de ficção.
B
prefere alienar‐se com narrativas épicas.
C
é indiferente às histórias de fundo sentimental.
D
está engajado na militância política.
E
se afunda na negatividade própria do fracassado.
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USP 2019 - Português - Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

O argumento de Benedito Nunes, em torno da natureza artística da literatura, leva a considerar que a obra só assume função transformadora se

TEXTOS PARA A QUESTÃO

Os textos literários são obras de discurso, a que falta a imediata referencialidade da linguagem corrente; poéticos, abolem, “destroem” o mundo circundante, cotidiano, graças à função irrealizante da imaginação que os constrói. E prendem‐nos na teia de sua linguagem, a que devemo poder de apelo estético que nos enleia; seduz‐nos o mundo outro, irreal, neles configurado (...). No entanto, da adesão a esse “mundo de papel”, quando retornamos ao real, nossa experiência, ampliada e renovada pela experiência da obra, à luz do que nos revelou, possibilita redescobri‐lo, sentindo‐o e pensando‐o de maneira diferente e nova. A ilusão, a mentira, o fingimento da ficção, aclara o real ao desligar‐se dele, transfigurando‐o; e aclara‐o já pelo insight que em nós provocou.
Benedito Nunes, “Ética e leitura”, de Crivo de Papel.

O que eu precisava era ler um romance fantástico, um romance besta, em que os homens e as mulheres fossem criações absurdas, não andassem magoando‐se, traindo‐se. Histórias fáceis, sem almas complicadas. Infelizmente essas leituras já não me comovem.
Graciliano Ramos, Angústia.

Romance desagradável, abafado, ambiente sujo, povoado de ratos, cheio de podridões, de lixo. Nenhuma concessão ao gosto do público. Solilóquio doido, enervante.
Graciliano Ramos, Memórias do Cárcere, em nota a respeito de seu livro Angústia.
A
estabelece um contraponto entre a fantasia e o mundo.
B
utiliza a linguagem para informar sobre o mundo.
C
instiga no leitor uma atitude reflexiva diante do mundo.
D
oferece ao leitor uma compensação anestesiante do mundo.
E
conduz o leitor a ignorar o mundo real.
0d7a2032-99
USP 2019 - Português - Interpretação de Textos, Noções Gerais de Compreensão e Interpretação de Texto

Cantiga de enganar

(...)
O mundo não tem sentido.
O mundo e suas canções
de timbre mais comovido
estão calados, e a fala
que de uma para outra sala
ouvimos em certo instante
é silêncio que faz eco
e que volta a ser silêncio
no negrume circundante.
Silêncio: que quer dizer?
Que diz a boca do mundo?
Meu bem, o mundo é fechado,
se não for antes vazio.
O mundo é talvez: e é só.

Talvez nem seja talvez.
O mundo não vale a pena,
mas a pena não existe.
Meu bem, façamos de conta.
De sofrer e de olvidar,
de lembrar e de fruir,
de escolher nossas lembranças
e revertê‐las, acaso
se lembrem demais em nós.
Façamos, meu bem, de conta
– mas a conta não existe –
que é tudo como se fosse,
ou que, se fora, não era.
(...)

Carlos Drummond de Andrade, Claro Enigma.

Em Claro Enigma, a ideia de engano surge sob a perspectiva do sujeito maduro, já afastado das ilusões, como se lê no verso‐síntese “Tu não me enganas, mundo, e não te engano a ti.” (“Legado”). O excerto de “Cantiga de enganar” apresenta a relação do eu com o mundo mediada

A
pela música, que ressoa em canções líricas.
B
pela cor, brilhante na claridade solar.
C
pela afirmação de valores sólidos.
D
pela memória, que corre fluida no tempo.
E
pelo despropósito de um faz‐de‐conta.