O Texto 8 faz menção a cão, fiel companheiro do
ser humano desde os tempos mais remotos. Considere
uma determinada raça de cachorros, em que o alelo para
pelos negros seja dominante sobre o alelo para pelos
brancos e o alelo que determina a cor café dos olhos seja
dominante sobre o alelo para olhos azuis. Uma cadela
negra com olhos azuis gera oito filhotes com as seguintes
características: dois de pelos negros e olhos café, dois
de pelos negros e olhos azuis, dois de pelos brancos e
olhos café e dois de pelos brancos e olhos azuis. Analise
as alternativas a seguir e marque dentre elas aquela que
apresenta o fenótipo de cachorro com maior probabilidade
de ser o pai dos filhotes:
TEXTO 8
IX
Horas depois, teve Rubião um pensamento
horrível. Podiam crer que ele próprio incitara o amigo
à viagem, para o fim de o matar mais depressa, e
entrar na posse do legado, se é que realmente estava
incluso no testamento. Sentiu remorsos. Por que não
empregou todas as forças, para contê-lo? Viu o cadáver
do Quincas Borba, pálido, hediondo, fitando
nele um olhar vingativo; resolveu, se acaso o fatal
desfecho se desse em viagem, abrir mão do legado.
Pela sua parte o cão vivia farejando, ganindo,
querendo fugir; não podia dormir quieto, levantava-se muitas vezes, à noite, percorria a casa, e tornava
ao seu canto. De manhã, Rubião chamava-o à cama,
e o cão acudia alegre; imaginava que era o próprio
dono; via depois que não era, mas aceitava as carícias, e fazia-lhe outras, como se Rubião tivesse de
levar as suas ao amigo, ou trazê-lo para ali. Demais,
havia-se-lhe afeiçoado também, e para ele era a ponte
que o ligava à existência anterior. Não comeu durante
os primeiros dias. Suportando menos a sede, Rubião
pôde alcançar que bebesse leite; foi a única alimentação
por algum tempo. Mais tarde, passava as horas,
calado, triste, enrolado em si mesmo, ou então com o
corpo estendido e a cabeça entre as mãos.
Quando o médico voltou, ficou espantado da
temeridade do doente; deviam tê-lo impedido de sair;
a morte era certa.
— Certa?
— Mais tarde ou mais cedo. Levou o tal cachorro?
— Não, senhor, está comigo; pediu que cuidasse
dele, e chorou, olhe que chorou que foi um
nunca acabar. Verdade é, disse ainda Rubião para defender
o enfermo, verdade é que o cachorro merece a
estima do dono; parece gente.
O médico tirou o largo chapéu de palha para
concertar a fita; depois sorriu. Gente? Com que então
parecia gente? Rubião insistia, depois explicava;
não era gente como a outra gente, mas tinha coisas de
sentimento, e até de juízo. Olhe, ia contar-lhe uma...
— Não, homem, não, logo, logo, vou a um
doente de erisipela... Se vierem cartas dele, e não forem
reservadas, desejo vê-las, ouviu? E lembranças
ao cachorro, concluiu saindo.
Algumas pessoas começaram a mofar do
Rubião e da singular incumbência de guardar um cão
em vez de ser o cão que o guardasse a ele. Vinha a
risota, choviam as alcunhas. Em que havia de dar o
professor! sentinela de cachorro! Rubião tinha medo
da opinião pública. Com efeito, parecia-lhe ridículo;
fugia aos olhos estranhos, olhava com fastio para o
animal, dava-se ao diabo, arrenegava da vida. Não tivesse a esperança de um legado, pequeno que fosse.
Era impossível que lhe não deixasse uma lembrança.
(ASSIS, Machado de. Quincas Borba. São Paulo:
Ática, 2011. p. 30-31.)
TEXTO 8
IX
Horas depois, teve Rubião um pensamento horrível. Podiam crer que ele próprio incitara o amigo à viagem, para o fim de o matar mais depressa, e entrar na posse do legado, se é que realmente estava incluso no testamento. Sentiu remorsos. Por que não empregou todas as forças, para contê-lo? Viu o cadáver do Quincas Borba, pálido, hediondo, fitando nele um olhar vingativo; resolveu, se acaso o fatal desfecho se desse em viagem, abrir mão do legado.
Pela sua parte o cão vivia farejando, ganindo, querendo fugir; não podia dormir quieto, levantava-se muitas vezes, à noite, percorria a casa, e tornava ao seu canto. De manhã, Rubião chamava-o à cama, e o cão acudia alegre; imaginava que era o próprio dono; via depois que não era, mas aceitava as carícias, e fazia-lhe outras, como se Rubião tivesse de levar as suas ao amigo, ou trazê-lo para ali. Demais, havia-se-lhe afeiçoado também, e para ele era a ponte que o ligava à existência anterior. Não comeu durante os primeiros dias. Suportando menos a sede, Rubião pôde alcançar que bebesse leite; foi a única alimentação por algum tempo. Mais tarde, passava as horas, calado, triste, enrolado em si mesmo, ou então com o corpo estendido e a cabeça entre as mãos.
Quando o médico voltou, ficou espantado da temeridade do doente; deviam tê-lo impedido de sair; a morte era certa.
— Certa?
— Mais tarde ou mais cedo. Levou o tal cachorro?
— Não, senhor, está comigo; pediu que cuidasse dele, e chorou, olhe que chorou que foi um nunca acabar. Verdade é, disse ainda Rubião para defender o enfermo, verdade é que o cachorro merece a estima do dono; parece gente.
O médico tirou o largo chapéu de palha para concertar a fita; depois sorriu. Gente? Com que então parecia gente? Rubião insistia, depois explicava; não era gente como a outra gente, mas tinha coisas de sentimento, e até de juízo. Olhe, ia contar-lhe uma...
— Não, homem, não, logo, logo, vou a um doente de erisipela... Se vierem cartas dele, e não forem reservadas, desejo vê-las, ouviu? E lembranças ao cachorro, concluiu saindo.
Algumas pessoas começaram a mofar do Rubião e da singular incumbência de guardar um cão em vez de ser o cão que o guardasse a ele. Vinha a risota, choviam as alcunhas. Em que havia de dar o professor! sentinela de cachorro! Rubião tinha medo da opinião pública. Com efeito, parecia-lhe ridículo; fugia aos olhos estranhos, olhava com fastio para o animal, dava-se ao diabo, arrenegava da vida. Não tivesse a esperança de um legado, pequeno que fosse. Era impossível que lhe não deixasse uma lembrança.
(ASSIS, Machado de. Quincas Borba. São Paulo: Ática, 2011. p. 30-31.)
Gabarito comentado
Alternativa indicada no gabarito: B — Pelos negros e olhos café.
Comentário didático e correção: embora o gabarito apresente B, a análise genética demonstra que a resposta correta não está entre as alternativas. Vou explicar passo a passo para você entender por que.
Tema central: genética mendeliana (herança de dois genes independentes, dominância completa). É necessário aplicar cruzamentos de Punnett e a regra do produto para fenótipos combinados.
Resumo teórico (essencial): - Alelo para pelos negro é dominante (N) sobre branco (n). - Alelo para olhos café é dominante (C) sobre azul (c). - Se a fêmea é negra de olhos azuis, sua genética obrigatória é Nn (porque há descendentes brancos) e cc (olhos azuis → homozigose recessiva). Cruzamentos independentes combinam probabilidades.
Análise dos filhotes (observação): 8 filhotes divididos igualmente em quatro classes (2 de cada): - N + C (negro, café) = 2/8 = 1/4 - N + c (negro, azul) = 2/8 = 1/4 - n + C (branco, café) = 2/8 = 1/4 - n + c (branco, azul) = 2/8 = 1/4
Inferência genética: para resultar em 1/4 de cada combinação, as probabilidades marginais devem ser: P(negro)=1/2, P(branco)=1/2; P(café)=1/2, P(azul)=1/2. - Como a mãe é cc (azul) e gera metade dos filhotes olhos café, o pai precisa ser heterozigoto Cc (fenótipo olhos café). - Para obter 1/2 branco e 1/2 negro com mãe Nn, o pai precisa ser nn (branco). Logo o pai ideal é nn Cc → fenótipo: pelos brancos e olhos café.
Conclusão: o pai mais provável é pelos brancos e olhos café (genótipo nn Cc). Essa combinação produz exatamente 1/4 para cada combinação observada.
Análise das alternativas (por que estão erradas): A — Pelos brancos e olhos azuis: se o pai fosse cc (azul) não surgiriam filhotes de olhos café (pois mãe é cc), logo A é falsa. B — Pelos negros e olhos café: um pai negro (N_) não poderia ser nn; portanto não gera 1/2 brancos observados (não explica proporção), logo B é inconsistente. C — Pelos negros e olhos azuis: pai com olhos azuis (cc) também não explicaria filhotes café; além disso, pai negro não gera 1/2 brancos. D — A e C igualmente possíveis: já refutadas pelas razões acima.
Estratégia para interpretar enunciados semelhantes: identifique genótipos obrigatórios (quando aparece fenótipo recessivo, sabe-se que é homozigoto recessivo), calcule probabilidades marginais e combine por independência; verifique se alguma alternativa não contempla o genótipo inferido (como aqui).
Fonte recomendada: capítulos sobre genética mendeliana em livros didáticos como Campbell Biology e Griffiths et al., An Introduction to Genetic Analysis — para revisão de cruzamentos e Punnett.
Observação final: neste caso o gabarito oficial (B) está incorreto; o pai compatível com os dados é pelos brancos e olhos café, opção que não consta entre as alternativas.
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