Naturalismo: o que foi, principais caracaterísticas e como cai no Enem

Publicado em: 18/10/2023

O Naturalismo foi um movimento artístico e cultural da segunda metade do século XIX na Europa. Similarmente ao Realismo, ele rejeitava as idealizações românticas em favor de uma representação objetiva da realidade. Entretanto, distinguia-se por fazer uma análise cientificista e determinista de grupos sociais em vez de focar na abordagem psicológica profunda de indivíduos. No Naturalismo, os humanos eram equiparados a animais, cujos comportamentos eram determinados por fatores fora do seu controle.

Contexto histórico do Naturalismo

No século XIX, o filósofo francês August Comte introduziu uma corrente filosófica chamada Positivismo. Essa filosofia defendia que apenas o conhecimento científico, empiricamente comprovável, era genuíno. Essa abordagem objetiva e cientificista da realidade acabou se popularizando entre intelectuais e, assim, o pensamento científico experimentou um impulso nesse período.

Em 1859, esse panorama foi solidificado com a publicação de "A Origem das Espécies" por Charles Darwin. A obra apresentava a Teoria da Evolução, afirmando que as espécies evoluem por adaptações ao longo do tempo, e as menos adaptadas enfrentam extinção. Essa teoria teve grande impacto social, pois desafiava a crença religiosa de que todas as criaturas tinham sido criadas por Deus tal como eram.

Dentro desse clima intelectual, surgiram teorias que tentavam aplicar princípios científicos para compreender a sociedade e o comportamento humano.

Uma dessas teorias, o Darwinismo Social, inspirou-se nos trabalhos de Darwin para afirmar que, assim como havia animais mais adaptados na natureza, certos grupos humanos eram superiores a outros. O homem branco europeu estava frequentemente posicionado no topo desta hierarquia. O Darwinismo Social foi utilizado para justificar o imperialismo europeu e promover ideias eugenistas de supremacia racial.

Hippolyte Taine difundiu a ideia de que o comportamento humano era moldado por seu meio, raça e momento histórico, uma teoria conhecida como Determinismo.

Similarmente, o Biologismo, defendido por pensadores como Henri Bergson, argumentava que tanto a sociedade quanto o pensamento humano podiam ser explicados estritamente por fatores biológicos.

Dentro desse contexto, surgiu o Naturalismo, uma expressão artística das ideias científicas populares na época. Esse movimento buscava retratar a realidade social da forma mais autêntica possível, usando o método científico como referência.

No entanto, é importante dizer que assim como as teorias que inspiraram o Naturalismo foram usadas para justificar ideias preconceituosas, esse movimento muitas vezes produziu obras que eram ofensivas e redutivas em relação às minorias que destacava.

Principais características do Naturalismo

  • Cientificismo
  • Determinismo
  • Biologismo
  • Zoomorfização, comparação entre pessoas e animais.
  • Linguagem objetiva e simples
  • Crítica social, especialmente em relação à exploração dos funcionários por seus patrões, e aos vícios e patologias da humanidade.
  • Rejeição de idealizações e busca por uma representação fiel da realidade
  • Sexualidade instintiva e desenfreada em vez de amor puro
  • Temas polêmicos, como violência, sexo e marginalização.
  • Grupos minoritários (pessoas negras, pardas, pobres, LGBT, etc.), sendo o principal objeto de análise das obras.
  • Foco em fenômenos coletivos em vez de individuais, levando as obras a destacarem diversos personagens.

A Literatura de Tese no Naturalismo

Os romances naturalistas são frequentemente denominados “literatura de tese” ou “romance de tese”. Essa nomenclatura reflete a intenção dessas obras de comprovar uma teoria sobre a sociedade por meio da narrativa apresentada.

Nesses romances, os personagens são como cobaias de um experimento, sendo observados por um narrador onisciente que age como um cientista, interpretando suas ações de forma objetiva e impessoal e utilizando teorias científicas para fazer sua análise. Por exemplo, a hereditariedade de um personagem pode ser usada para explicar seu comportamento, por meio do Determinismo.

Principais autores do Naturalismo

Emile Zola

O francês Émile Zola é uma figura central do Naturalismo. Seu ensaio "O Romance Experimental" delineou os princípios do Naturalismo, tornando-se uma forma de manifesto para o movimento. Além disso, suas obras são repletas de características naturalistas, como determinismo, zoomorfismo e crítica social.

Um dos trabalhos mais reconhecidos do autor é o romance "O Germinal". O livro retrata a realidade dos trabalhadores de uma mina de carvão e como ela culmina em uma greve motivada pelas terríveis condições de trabalho. Para garantir a autenticidade da narrativa, Zola trabalhou dois meses em uma mina de carvão.

Eça de Queiroz

Eça de Queiroz escreveu o primeiro romance naturalista português, "O Crime do Padre Amaro". A obra é também apontada como um marco inicial do Realismo, pois Eça é frequentemente associado a ambos os movimentos literários.

"O Crime do Padre Amaro" narra a história de um padre que se envolve sexualmente com uma devota. O livro causou grande controvérsia na época de sua publicação devido às críticas que fazia ao clero e à elite da sociedade portuguesa.

Os principais traços naturalistas da escrita de Eça de Queiroz são a sua abordagem de temas controversos e uso do determinismo como explicação do comportamento dos personagens.

Aluísio Azevedo

Inicialmente, um autor romântico, Aluísio Azevedo foi influenciado pelo estilo literário de Émile Zola e Eça de Queiroz e pelo pensamento positivista, escrevendo a primeira obra Naturalista brasileira, “O Mulato”. Essa obra tratava de temas sociais como racismo e escravidão, fazendo críticas à sociedade provinciana e ao clero.

A partir dessa obra, a produção literária de Azevedo passou a ser marcada pela presença constante de traços naturalistas. Inclusive, em alinhamento com os princípios científicos do movimento, o autor tirava inspiração da realidade. O romance “Casa de Pensão” foi baseado em um crime real, enquanto “O Cortiço” foi baseado nas observações do autor após fazer várias visitas a cortiços.

Raul Pompeia

Pompeia é um escritor brasileiro associado ao Realismo e ao Naturalismo. Sua obra naturalista mais importante é “O Ateneu”, que se passa em um colégio interno para garotos. Esse romance utiliza o ambiente escolar para analisar comportamentos coletivos sob uma perspectiva determinista. Ele é possivelmente baseado nas experiências reais do autor, que estudou em um internato.

Como o Naturalismo cai no ENEM

Para o ENEM, é importante a compreensão do contexto histórico do Naturalismo, de como as teorias científicas da época influenciaram esse movimento, e das suas características distintas em relação ao Romantismo e ao Realismo.

ENEM 2014

O mulato

Ana Rosa cresceu; aprendera de cor a gramática do Sotero dos Reis; lera alguma coisa; sabia rudimentos de francês e tocava modinhas sentimentais ao violão e ao piano. Não era estúpida; tinha a intuição perfeita da virtude, um modo bonito, e por vezes lamentara não ser mais instruída. Conhecia muitos trabalhos de agulha; bordava como poucas, e dispunha de uma gargantazinha de contralto que fazia gosto de ouvir. Uma só palavra boiava à superfície dos seus pensamentos: “Mulato”. E crescia, crescia, transformando-se em tenebrosa nuvem, que escondia todo o seu passado. Ideia parasita, que estrangulava todas as outras ideias. — Mulato! Esta só palavra explicava-lhe agora todos os mesquinhos escrúpulos, que a sociedade do Maranhão usara para com ele. Explicava tudo: a frieza de certas famílias a quem visitara; as reticências dos que lhe falavam de seus antepassados; a reserva e a cautela dos que, em sua presença, discutiam questões de raça e de sangue.

AZEVEDO, A. O Mulato. São Paulo: Ática, 1996 (fragmento)

O texto de Aluísio Azevedo é representativo do Naturalismo, vigente no final do século XIX. Nesse fragmento, o narrador expressa fidelidade ao discurso naturalista, pois:

(A) relaciona a posição social a padrões de comportamento e à condição de raça.

(B) apresenta os homens e as mulheres melhores do que eram no século XIX.

(C) mostra a pouca cultura feminina e a distribuição de saberes entre homens e mulheres.

(D) ilustra os diferentes modos que um indivíduo tinha de ascender socialmente.

(E) crítica a educação oferecida às mulheres e os maus-tratos dispensados aos negros.